TCU quer manter propriedade dos bens reversíveis da concessão à União, contra decisão da Anatel

Surgiu agora mais um entrave que terá impacto direto sobre a modelagem do novo edital que está em gestação: a posição da área técnica do TCU - o Tribunal de Contas da União - sobre os bens reversíveis
TCU quer manter propriedade dos bens da concessão. Crédito- Freepik
Para os técnicos, a posse dos bens reversíveis não pode ser aceita. Crédito-Freepick.

Na longa e tortuosa trajetória sobre o que fazer com a concessão de telefonia fixa, cujas atuais outorgas se encerram em 2025, surgiu agora mais um entrave que terá impacto direto sobre a modelagem do novo edital que está em gestação: a posição do TCU – o Tribunal de Contas da União – sobre os bens reversíveis. Este processo, que está sob a relatoria do ministro Benjamin Ziller, já tem o parecer final da área técnica do tribunal, que se insurge sobre a decisão tomada pelo colegiado da Anatel em março de 2021.

A questão de fundo é se, ao término da concessão da telefonia, deve ser revertida à União a propriedade do bens reversíveis, ou somente a sua posse. Um debate bastante controverso até mesmo dentro da próprio órgão regulador setorial, que decidiu pela reversão da “posse” dos bens no ano passado, em uma votação dividida, por três a dois votos, e mesmo contrária ao parecer da Procuradoria Geral, vinculada à AGU.

À época, tiveram voto vencido pelo entendimento de que deveria ser devolvida à União a propriedade dos bens os então presidente da agência, Leonardo Euler de Morais e o vice-presidente Emmanoel Campelo. Os dois estão com mandato encerrado. Votaram a favor da reversão apenas da posse dos bens o atual presidente Carlos Baigorri, e os conselheiros Moisés Moreira e Vicente Aquino.

Pela transferência da propriedade, chegou a se manifestar  também o então procurador da agência, Carlos Firmeza, (que também já deixou o posto) que, entre outros argumentos, afirmava:  o Decreto de 1997 que trata da concessão de telefonia refere-se explicitamente à transferência da propriedade para a União e não a transferência da posse. “O Decreto confere legitimidade para a transferência de propriedade e não da posse. Até porque se for apenas da posse, o Poder Público ficará preso a empresas que não têm qualquer vínculo com o Poder Público”.

Também em defesa da propriedade, o então conselheiro Campelo afirmava: “A exposição de motivos da Lei Geral de Telecomunicações é clara ao estabelecer a transferência da titularidade e não sua posse”.

A defesa da Posse

Baigorri, que construiu os argumentos para a decisão majoritária da Anatel, defendeu no voto vencedor que o artigo 102 da LGT estabelece que  “a extinção da concessão transmitirá automaticamente à União a posse dos bens reversíveis” e que a agência teria que seguir a literalidade do que está escrito na lei, já que a “exposição de motivos” não é a lei.  E argumentou ainda que o receio de que a União poderia perder a indenização dos bens, devido a essa decisão também não procederia.

Mas a área técnica do TCU não concordou com a decisão. Entre os argumentos, está a própria tese apresentada pelo então conselheiro Campelo, de que o artigo 102 estabelece que a ” posse é automática”, justamente para assegurar a continuidade dos serviços, até que a reversão da propriedade ocorra.

O processo no TCU está agora na fase da defesa pela Anatel de sua tese, em cotejamento aos argumentos dos técnicos do TCU de transferência da posse, o que deverá ocorrer até o início do próximo ano, quando então poderá ser analisado pelo ministro relator.

Artur Coimbra,  conselheiro responsável por conduzir todas as questões vinculadas às concessões dentro da Anatel, admitiu ao Tele.Síntese que a formatação final do edital depende dessa decisão, tendo em vista que o uso compartilhado dos bens, no caso da posse, terá impactos diferentes no valor da licença em relação à propriedade desses bens.

Migração

Embora esse processo seja  diferente ao que também tramita no TCU, sobre outro ao do valor dos bens reversíveis para o caso de as concessionárias decidirem migrar os seus contratos para o regime privado, valor esse que a Anatel estipulou em  R$ 22,6 bilhões – conforme for a decisão final do tribunal, poderá até voltar a estimular que as atuais concessionárias façam migração para o regime privado, visto que, ao migrarem, o debate sobre esses bens se encerra em definitivo.

O processo da migração no TCU no entanto, vai demorar, pois o ministro Vital do Rego pediu vistas, que já conta com a manifestação do relator, ministro Bruno Dantas. Regimentalmente, Rego pode ter no mínimo 60 dias para se manifestar, mas o TCU entrará em recesso, e o prazo só começará a contar quando os trabalhos forem retomados.

Mas nesse processo de migração, há pelo menos um tento positivo para a Anatel. Ao contrário dos argumentos das concessionárias (que alegam que têm a receber da União, ao invés de pagar) e ao contrário da área técnica do TCU, que disse que o preço estava subavaliado, Dantas, em seu voto, referendou a metodologia adotada pela agência e acompanhou os valores por ela encontrados.

 

 

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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