Projeto pretende regular e taxar site de busca e redes sociais

Projeto de lei apresentado nesta semana classifica os serviços das plataformas digitais como SVA e prevê que Anatel decida sobre ‘conflitos de interesse’ na legislação aplicável a elas, com fiscalização daquelas com receita operacional a partir de R$ 70 milhões por ano.
Deputado João Maia (PL/RN) é autor do PL que propõe regulação de redes sociais. Foto: (Pablo Valadares/Câmara dos Deputados)

A Anatel pode passar a regular casos omissos na legislação brasileira sobre a prestação de serviço dos operadores de redes sociais, aplicativos de mensagem e mecanismos de busca. É o que prevê um projeto de lei apresentado nesta quarta-feira, 10, na Câmara dos Deputados, o PL 2768/2022, de autoria do deputado João Maia (PL/RN), agora aguardando encaminhamento da Mesa.

O texto classifica as aplicações de internet definidas como “conjunto de funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal conectado à internet” como SVA (Serviço de Valor Adicionado) e prevê arrecadação para um Fundo de Fiscalização das Plataformas Digitais (saiba mais abaixo).

A proposta é de definir como competência da União, “por intermédio da Anatel, e nos termos das políticas estabelecidas pelos Poderes Executivo e Legislativo, regular o funcionamento e a operação das plataformas digitais que oferecem serviços ao público brasileiro”. 

A função descrita na proposta inclui, entre outros aspectos, “o disciplinamento e a fiscalização das plataformas digitais que detenham poder de controle de acesso essencial”, ou seja, aquelas com “receita operacional anual igual ou superior a R$ 70 milhões com a oferta de serviços ao público brasileiro”.

A lei considera como plataformas digitais, o “provedor de aplicações de internet que explora profissionalmente e com fins econômicos”:

  • serviços de intermediação online; 
  • ferramentas de busca online;
  • redes sociais online; 
  • plataformas de compartilhamento de vídeo;
  • serviços de comunicações interpessoais;
  • sistemas operacionais; 
  • serviços de computação em nuvem e
  • serviços de publicidade online ofertados por operador das plataformas digitais de intermediação online e computação em nuvem.

Obrigações

(Foto: Freepik)

As plataformas digitais com receita operacional a partir de R$ 70 milhões por ano (poder de controle de acesso essencial) estariam obrigadas ao “tratamento isonômico e não discriminatório na oferta de serviços a usuários profissionais e usuários finais” e “utilização adequada dos dados coletados no exercício de suas atividades”.

Um trecho também obriga as plataformas a “não recusa de provisão de acesso a usuários profissionais”. Os usuários profissionais, por sua vez, são considerados aqueles que usam as redes “no âmbito das suas atividades profissionais ou comerciais” para “fornecer serviços ou bens” a outros usuários, de forma remunerada ou não.

Taxação e multas

O Fundo de Fiscalização das Plataformas Digitais prevê a cobrança de uma taxa anual às plataformas com poder de controle de acesso essencial, no valor de 2% da receita operacional bruta. Quem descumprir, fica sujeito ao pagamento de juros de 1% por mês de atraso.

Como forma de alterações na Lei Geral de Telecomunicações (LGT), o projeto incluir as seguintes atribuições à Anatel:

  • expedir normas quanto à operação das plataformas digitais que oferecem serviços ao público brasileiro, fiscalizando e aplicando sanções; 
  • deliberar na esfera administrativa quanto à interpretação da legislação aplicável às plataformas digitais que oferecem serviços ao público, bem como sobre os casos omissos; 
  • compor administrativamente conflitos de interesse envolvendo operadores das plataformas digitais ou usuários profissionais; 
  • reprimir infrações dos direitos dos usuários e 
  • exercer, relativamente às plataformas digitais, as competências legais em matéria de controle, prevenção e repressão das infrações da ordem econômica, ressalvadas as pertencentes ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

 

As sanções previstas contra as plataformas digitais são:

 

  • advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; 
  • multa de até 2%  do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, considerados a condição econômica do infrator e o princípio da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção; 
  • obrigação de fazer ou não fazer;
  • suspensão temporária das atividades e
  • proibição de exercício das atividades.

Competição e Justiça

O texto também determina que a regulação das plataformas digitais siga os princípios da liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, repressão ao abuso do poder econômico; ampliação da participação social na discussão e na condução de assuntos de interesse público, além da redução das desigualdades regionais e sociais.

O PL também cita o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados como ordenamentos que precisam ser considerados na interferência da Anatel, além de atribuir ao Cade análise sobre “atos envolvendo plataformas digitais que oferecem serviços ao público brasileiro que visem a qualquer forma de concentração econômica”.

Debate sobre regulação

Foto: Carlos Moura/SCO/STF

Neste última semestre do ano, o debate sobre a legislação aplicável às big techs avançou no Brasil no sentido de reforçar que as empresas devem ser submetidas às regras do país.

Entre setembro e outubro, o Supremo Tribunal Federal (STF) discutiu  a adoção do Acordo de Assistência Judiciária-Penal entre os governos brasileiro e norte-americano (o Mutual Legal Assistance, MLAT, na sigla em inglês) como procedimento padrão para a solicitação de dados feitas por autoridades brasileiras a empresas com sede nos EUA. O caso consta em ação de autoria  da  Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação (Assespro), com apoio de empresas do setor, como a Meta.

Ao analisar o caso, o relator do processo, ministro Gilmar Mendes, declarou a constitucionalidade do acordo internacional,  desde que “sem prejuízo da possibilidade de solicitação direta de dados e comunicações eletrônicas” feita pelas autoridades nacionais a empresas de tecnologia nas hipóteses já previstas no Marco Civil da Internet, ou seja, com a soberania da legislação brasileira. O julgamento foi suspenso após pedido de vistas.

Em discussão semelhante, recente decisão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que empresas que prestam serviços de internet no País devem necessariamente se submeter à legislação brasileira, mesmo que as operações sejam feitas por meio de filiais ou envolvam armazenamento de dados em nuvem.

Houve debate também no âmbito da administração pública. Na última semana, a solenidade pelos 25 anos da Anatel foi marcada pelo discurso de necessidade de avançar nos temas que englobam questões como competitividade no mercado digital e a atual insuficiência da agência para abarcar em todos os conflitos.

 

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura de telecom nos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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