Via Amazon e Mercado Livre: venda de celulares contrabandeados dispara

Associação da Indústria eletroeletrônica alerta para a entrada de aparelhos via Paraguai para venda imediata nos marketplaces da Amazon e do Mercado Livre. Com o impulso, smartphones irregulares já representam 21% do mercado. Mercado Livre e Amazon dizem que vêm agindo contra vendas irregulares.

(crédito: Freepik)

A venda de celulares que entram irregularmente no Brasil tem tido um empurrão dos dois principais marketplaces de eletrônicos brasileiros, a Amazon e o Mercado Livre, disseram hoje, 7, executivos da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee).

As vendas legais de celulares encolheram 14% no país este ano, enquanto o crescimento do comércio de produtos fruto de contrabando passou de 8% das vendas totais de 2019 para 21% no quarto trimestre agora.

Segundo a entidade, os marketplaces por não verificam a regularidade dos produtos comercializados na plataforma, e chegam a dar destaque a aparelhos cujos indício apontam para entrada irregular no país, por não serem adaptados às redes locais, não terem selo da Anatel ou apresentarem número de certificação que não corresponde aos registros no regulador.

“Os marketplaces são Amazon e Mercado Livre, que não têm assinado o acordo com a Anatel. Nós tratamos tudo isso claramente em cartório, registramos todos os anúncios que tentam convencer o consumidor a comprar produto contrabandeado”, falou o presidente executivo da Abinee, Humberto Barbato nesta quinta-feira, 7.

Fácil de achar

Não é difícil encontrar exemplos de vendas desses produtos no site da Amazon. Uma busca pelo produto Xiaomi Redmi Note 12 4G 256 GB ali, por exemplo, feita nesta quinta-feira, 7, pelo Tele.Síntese, trouxe 24 páginas de resultados contendo anúncios de celulares de versões “indiana” ou “global”. Um modelo, inclusive, tinha selo de indicação da Amazon:

Exemplo de anúncio de aparelho "versão global" na Amazon com o selo "Escolha da Amazon". O número de certificação não condiz com o aparelho anunciado.
Exemplo de anúncio de aparelho “versão global” na Amazon com o selo “Escolha da Amazon”. O número de certificação não condiz com o aparelho anunciado. No Magazine Luiza, onde o número de certificação é coerente, o aparelho custa R$ 2,7 mil.

 

Um dos modelos vendidos como versão global apontado como "Escolha da Amazon" indica número de certificação diferente do real, registrado na agência. O resultado no regulador é de uma celular Xiaomi 13 Lite. 
Um dos anúncios de Xiaomi Redmi 12 Pro vendido como versão global e apontado como “Escolha da Amazon” indica número de certificação diferente do que é registrado na Anatel. O resultado na agência do número no anuncio é de uma celular Xiaomi 13 Lite.

Segundo o diretor para dispositivos móveis da Abinee, Luiz Claudio Carneiro, o Paraguai importou 8 milhões de smartphones este ano, tendo uma população de 6,7 milhões de pessoas. “Os produtos são atravessados pela fronteira, que é grande e de difícil controle no Brasil, chegam aos centros de distribuição dos marketplaces e saem de lá rapidamente, em 1h já são comercializados, o que dificulta trabalhos de apreensão ou lacre da Anatel”, afirmou.

Ação governamental

Carneiro diz que a associação está conversando com a Anatel em busca de uma solução, e tem também apresentado o pleito para elaboração de alguma política pública ao governo federal. Na última semana, Barbato reuniu-se com Geraldo Alckmin e manifestou a preocupação com a publicidade dada a produtos contrabandeados pelos marketplaces.

“Quando o comprador faz o pagamento, o dinheiro  vai para o marketplace, que então pega uma parte e repassa o restante ao lojista. Ou seja, o marketplace faz parte do negócio, não tem como dizer que não tem responsabilidade. Ele é parte interessada nisso”, observa Carneiro.

A seu ver, o resultado pode parecer positivo para o consumidor, que sente estar fazendo um bom negócio ao comprar um celular por preço abaixo do praticado no mercado regular. Mas há impactos diretos sobre a cadeia de produção e até sobre os serviços oferecidos.

“As vendas desses produtos estão atrasando o 5G no país, pois muitos sequer têm a tecnologia. Além disso, restringe o mercado de componentes eletrônicos no Brasil é um dos fatores que explicam a queda de 25% das receitas do segmento de componentes no país”, avalia.

Contágio

Carneiro alerta para o fato de que outros produtos podem embarcar no modelo tríplice de (1) importação para o Paraguai, (2) contrabando para o Brasil, e (3) venda rápida em marketplaces. “Nos últimos meses verificamos que outras duas marcas, chinesas, de celulares, também estão ampliando rápido as vendas, e há indícios que podem estar sendo alvo de tais práticas”, falou.

Maurício Helfer, diretor de Informática da Abinee, comentou que há preocupação de que a estratégia contamine outros segmentos de produtos eletrônicos, como a venda de notebooks, desktops e monitores. “A gente enxerga a possibilidade de isso no futuro tomar corpo e migrar para o canal de informática”, disse.

O que diz o Mercado Livre

Procurado, o Mercado Livre informou ao Tele.Síntese que mantém contato com a Anatel, à qual apresentou “todas as medidas voluntárias e proativas desenvolvidas para identificação de produtos homologados, bem como a remoção de produtos não homologados e proibidos anunciados por vendedores que utilizam sua plataforma”.

A plataforma diz que tem também um “Brand Protection Program, que permite aos titulares de direitos de propriedade intelectual proteger esses direitos, mediante a remoção de produtos falsificados, a partir de denúncias, que também podem ser feitas por qualquer usuário”.

Reforça ainda que ofereceu à Anatel acesso ao “Cooperation Agreement Program”, ferramenta por meio da qual as autoridades podem identificar anúncios para que sejam analisados e eliminados “ajudando no trabalho automático e manual já realizado pela plataforma”.

A empresa diz que “atua incansavelmente no combate à venda de produtos irregulares, adota diversas medidas para evitar que este tipo de produto seja ofertado, como já preveem os Termos e Condições da plataforma que proíbem, de forma expressa, a oferta de produtos não homologados, sendo esses vendedores penalizados após a exclusão do anúncio irregular”.

No caso de aparelhos celulares e smartphones especificamente, afirma que os anúncios devem conter o código de homologação na Anatel. “Somente em 2023, foram removidos mais de 100 mil anúncios que violavam as normas de telecomunicações, com mais 388 mil vendedores notificados sobre a necessidade de seguir as normas da Anatel. Além disso, com mais de 94,2% da sua rede logística gerenciada pela própria plataforma, esse mesmo volume correspondente de pacotes são enviados obrigatoriamente com a emissão automática de nota fiscal pelo vendedor”, contabiliza.

A plataforma diz que está processando criminalmente alguns vendedores que ofertaram produtos não homologados e falsificados. “Atualmente, considerando todo o ecossistema, apenas 0,74% dos mais de 614 milhões de anúncios criados ou modificados no último semestre precisaram ser excluídos devido à violação de regras na América Latina”, diz. E afirma que colabora com as autoridades, como a Receita Federal, na investigação de crimes.

O que diz a Amazon

A Amazon enviou posicionamento no qual diz que “atua com os mais elevados padrões de qualidade a fim de atender aos seus consumidores e à legislação aplicável”. Diz que não comercializa produtos contrabandeados e que submete os vendedores da plataforma a regras quanto ao assunto.

“No que se refere às vendas por vendedores parceiros (marketplace), a Amazon exige por contrato, que todos os produtos ofertados no site possuam as licenças, autorizações, certificações e homologações necessárias, bem como que cumprirão todas as leis aplicáveis”, afirma.

A empresa diz que chega a destruir produtos irregulares, se necessário. “A eventual infração dessas obrigações previstas em contrato pode acarretar a suspensão e interrupção das vendas dos seus produtos, a consequente destruição de qualquer inventário existente nos centros de distribuição da Amazon sem direito a reembolso, bem como o bloqueio da sua conta de vendedor”, completa.

[Atualizado às 15h52 de 7/12/23 com o posicionamento do Mercado Livre]
[Atualizado às 18h29 de 7/12/23 com o posicionamento da Amazon]

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Rafael Bucco

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