Setor de telecom precisa se unir em uma proposta de fair share, diz Baigorri
O presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Carlos Baigorri, conclamou as empresas de telecomunicações a apresentarem uma proposta coesa sobre a possibilidade de se instituir uma cobrança pelo uso massivo das redes feito pelos grandes geradores de tráfego – taxa apelidada de “fair share”.
O regulador ainda destacou, nesta terça-feira, 3, em painel no evento Futurecom 2023, em São Paulo, que praticamente não teve reuniões com operadoras e provedores de serviços de internet (ISP) sobre o assunto até hoje, embora a implementação de uma eventual cobrança a big techs lidere a pauta de reivindicações do setor de telecom.
“O setor precisa se unir nesse debate para se ter uma estratégia única. Não vejo esse debate acontecendo de forma estruturada no Brasil, não vejo uma proposta na mesa”, afirmou Baigorri. “Quase não tive reunião com o setor sobre fair share, mas tive com a embaixada americana e outras instituições. Não vejo isso sendo levado muito a sério de nenhum dos lados [teles e OTTs]”, acrescentou, no sentido de que nenhum modelo de cobrança foi, de fato, levada à agência.
O regulador apontou que a proposta não tem de girar em torno de quem faz o melhor serviço ou sobre o que é justo, mas se pautar em condições técnicas.
Além disso, Baigorri disse que, atualmente, há restrições regulatórias e legais sobre o repasse dos custos de uso das redes de telecomunicações. No entanto, enfatizou que tais obstáculos foram definidos há mais de uma década, de modo que podem ser repensados. Nessa mesma linha, indicou que há “um problema excessivo de regulamentação” que promoveu “rigidez ao mercado de telecomunicações em um contexto que não faz mais sentido”.
Baigorri ainda afirmou – pontuando que se trata de uma visão particular, e não da Anatel – que não vê “os setores de internet e de telecomunicações separadamente”. Em sua visão, na atualidade, o usuário está interessado no conteúdo que pode consumir e é isso que direciona sua decisão de assinatura, de forma que a banda larga fornecida pelo provedor e o modelo de negócios da plataforma de streaming ficam em segundo plano.
Na discussão, Baigorri ainda afirmou que flexibilidade para negociação de custos operacionais “existe em todas as indústrias, em todos os mercados”, sinalizando que situação parecida também pode ser vista no setor de conectividade.
“Hoje, o consumidor é o único que está pagando [para usar os serviços]. Vamos pedir mesmo para o cidadão brasileiro pagar mais pela internet”, questionou.
Próximos passos
No momento, segundo Baigorri, a Anatel está avaliando as respostas à tomada de subsídios sobre os deveres dos usuários das redes de telecom. As contribuições devem subsidiar uma análise de impacto regulatório.
O regulador informou que uma segunda tomada de subsídios a respeito do assunto deve ser lançada ainda neste ano. “Depois de concluída, a área técnica deve enviar uma proposta ao conselho diretor. Em seguida, vai para consulta pública. Mas também temos que trabalhar com o cenário que é não fazer nada, manter o status quo”, pontuou.
Debate
Na discussão, Tomás Paiva, membro da Câmara Brasileira de Economia Digital (câmara-e.net), defendeu que as plataformas OTTs investem muito mais em pesquisa e inovação do que as grandes operadoras e disse que o “fair share” (divisão justa, em tradução livre) funcionaria, na verdade, como uma “net fee” (taxa de rede).
“No final do dia, estaríamos criando um ‘Bolsa Família’ para subsidiar as empresas de telecomunicações. Será que vai subsidiar a infraestrutura de internet no Brasil ou vai sair para outros mercados?”, indagou Paiva.
Tomas Fuchs, presidente do conselho da Telcomp, por sua vez, sugeriu que operadoras e provedores parem com ofertas que incluem aplicações que não consomem os dados do plano. “Assim, é o WhatsApp que vai ter que pagar para incentivar o seu uso pelo consumidor”, frisou.
Marcos Ferrari, presidente executivo da Conexis, entidade que representa as operadoras móveis, rebateu alegações de que o setor inova pouco, dizendo que se trata da terceira cadeia que mais investe no País, em um volume próximo a R$ 40 bilhões por ano. “Nossa taxa de retorno é de 7%, enquanto o das big techs é de 30% – e isso controlando 80% do tráfego móvel. Vai chegar a um ponto que vai parar [com a rede]”, sinalizou.