Qual é o futuro dos demitidos das big techs?
Apontado como uma das áreas mais promissoras para trabalhar, o setor de tecnologia enfrenta uma crise sem precedentes. Após ver a demanda por seus serviços crescer sobremaneira em 2020 e 2021, anos nos quais a gravidade da pandemia de covid-19 empurrou as pessoas para dentro de suas casas, o cenário já não é mais o mesmo. E quem está pagando a conta são os trabalhadores.
Até aqui, as big techs (Microsoft, Google, Amazon e Meta) demitiram, juntas, mais de 50 mil pessoas nos últimos dois meses em todo o mundo – por enquanto, entre as gigantes, só a Apple não entrou na onda dos cortes em massa. Empresas de capilaridade mais enxuta, mas igualmente relevantes, como Twitter, Salesforce (dona do Slack) e Spotify, também reduziram o quadro funcional.
Diante das numerosas dispensas de funcionários, resta a dúvida sobre como os demitidos retornarão ao mercado. Especificamente no Brasil, a conjuntura ainda é positiva. A empresa de recrutamento Talenses aponta que o país convive com uma carência de 50 mil profissionais de Tecnologia da Informação (TI) todos os anos.
“Os desenvolvedores e outras funções dentro de tecnologia especificamente, posições técnicas, ainda têm muitas oportunidades. A demanda continua alta”, afirma Paulo Moraes, diretor geral da LANDtech, braço da Talenses. “Então, por mais que muitas empresas demitam seus times de tecnologia, provavelmente continuaremos tendo vagas suficientes para absorver esses profissionais”, complementa.
No entanto, em demissões em massa, trabalhadores de diversas especialidades são atingidos, cujos níveis de empregabilidade são distintos. “Profissionais de marketing e de outras áreas, por exemplo, talvez sofram um pouco mais, porque as economias não estão em momento de crescimento”, aponta Moraes.
Ainda que os especialistas em TI tenham vagas à disposição, nem todos os aspectos associados à recolocação são positivos. Na avaliação de Irina Bezzan, fundadora da Gluker, comunidade digital que conecta empreendedores, startups, investidores e mentores em um ambiente digital, as companhias de tecnologia demitiram para ajustar as contas.
Nos comunicados sobre as demissões, as big techs sinalizaram que contrataram de forma acelerada nos últimos anos, mas a alta demanda por seus serviços não se sustentou. Dessa forma, o setor deve começar a oferecer salários mais baixos.
“Para se recolocarem no mercado, os profissionais vão precisar rever suas faixas salariais de uma maneira muito mais condizente e equilibrada com o mercado”, diz Irina.
Moraes, por sua vez, afirma que o setor de tecnologia pagou “muito caro” por trabalhadores formados na área para entregar resultados e cumprir metas. “Já temos relatos de profissionais de tecnologia que foram desligados dessas empresas tech e que agora estão encarando a realidade de salários um pouco menores”, destaca.
DISPERSÃO DE TRABALHADORES
A recolocação dos especialistas em processamento de dados e TI não deve se limitar necessariamente ao setor de tecnologia. Em razão da escassez de mão de obra qualificada, as grandes empresas acabavam contratando a maioria dos profissionais. Todavia, empresas de outros setores também demandam esses trabalhadores.
“A partir do momento que há um enxugamento de profissionais nas grandes companhias, surge um espaço para esses profissionais conseguirem uma recolocação em campos pouco explorados”, aponta Irina. “Quando há layoffs em tecnologia, abre-se um campo muito interessante para o empreendedorismo ou para as startups, que têm uma carência muito grande de profissionais”, complementa.
Na análise da LANDtech, o mercado de trabalho em empresas de tecnologia deve permanecer em baixa por um tempo. “Profissionais de TI devem migrar para outros mercados, como consumo, varejo, indústria, serviços e assim por diante, até que o volume de investimentos se recupere”, conjectura Moraes.
MOTIVOS DAS DEMISSÕES
Segundo a Layoffs.fyi, plataforma que compila as demissões que afetam o setor de tecnologia, 159,1 mil trabalhadores foram demitidos por mais de 1 mil empresas no ano passado. Neste ano, em menos de um mês, 185 companhias mandaram embora 57,6 mil empregados – o número inclui as dispensas anunciadas por Amazon, Microsoft e Google.
Em geral, as big techs disseram que os desligamentos se devem ao fato de terem contratado mais do que deveriam no passado.
“Contratamos para uma realidade econômica diferente da qual enfrentamos hoje”, disse Sundar Pichai, CEO do Google, quando a companhia informou que demitiria 12 mil funcionários.
“A revisão deste ano tem sido mais difícil devido à incerteza econômica e pelo fato de termos contratado rapidamente nos últimos anos”, afirmou Andy Jassy, CEO da Amazon, empresa responsável pelo maior corte até aqui (18 mil pessoas).
O presidente e CEO da Microsoft, Satya Nadella, por sua vez, indicou que, além de os consumidores terem reduzidos os gastos digitais, a empresa teme que diversas economias entrem em recessão. Ainda assim, apesar de ter demitido 10 mil empregados, a corporação deve contratar para segmentos específicos, como Inteligência Artificial (IA).
Primeira entre as gigantes a demitir em massa, a Meta (dona de Facebook, Instagram e WhatsApp) reduziu a força de trabalho em 11 mil pessoas e disse que congelaria contratações até o primeiro trimestre deste ano.
“Tomei a decisão de aumentar significativamente os nossos investimentos. Infelizmente, isso não aconteceu do jeito que eu esperava”, disse Mark Zuckerberg, CEO e fundador da Meta, quando do anúncio do corte.
O Tele.Síntese entrou em contato com o Sindpd (Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do Estado de São Paulo) e o Sindiesp (Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Internet, Manutenção e Cursos de Informática do Estado de São Paulo) para saber sobre o impacto das demissões das big techs no mercado de trabalho nacional, mas ambos não responderam às solicitações.