Ericsson defende troca de bens reversíveis por investimento

Carla Belitardo, nova vice-presidente de estratégia da fabricante sueca, enxerga benefícios para todo o setor com mudanças no regime público. Expectativa para resultados da empresa é de estagnação em 2016 no Brasil.

Carla Belitardo_ericssonCarla Belitardo assumiu este ano o cargo de vice-presidente de estratégia para a América Latina da Ericsson com uma missão nada simples: contribuir para que a empresa atravesse o momento adverso da economia na região. No cargo, tocará, entre outros assuntos, a relação governamental da companhia.

Em 2015, o resultado da empresa na América Latina encolheu 5%. No Brasil, o resultado apresentou também queda “em linha” com o resto da área. Os esforços agora são para evitar novo encolhimento e encerrar 2016 com resultado estável. A conjuntura não é favorável. Operadoras admitem que vão investir menos e que o valor destinado a melhoria e expansão das redes foi reservado em reais.

Diante deste cenário adverso, o que de melhor poderia acontecer no ano para a Ericsson seria o fim do modelo de concessões de telefonia fixa, em especial, dos bens reversíveis. Se os ativos reversíveis pudessem ser definitivamente incorporados ao patrimônio das concessionárias, em troca de investimentos equivalentes, seria um alento – opinião compartilhada com as operadoras. Confira, abaixo, a conversa que o Tele.Sínteve teve com a executiva na última semana.

Tele.Síntese – Como vocês avaliam o desempenho da Ericsson no Brasil e América Latina em 2015? O encolhimento de 5% nas vendas no ano passado foi igual no Brasil?
Carla Belitardo, VP de estratégia e marketing da Ericsson na América Latina – Não posso dar números para o país, mas foi muito parecido com a América Latina. O grande fator para o nosso encolhimento foi a moeda, que impactou os negócios no Brasil. Isso também aconteceu na Colômbia, Argentina, Venezuela, em todos os grandes mercados da área. Também impactaram os investimentos, já que as empresas aumentaram a aversão ao risco, que direciona os investimentos, e afeta diretamente os resultados da Ericsson. O setor de telecomunicações é muito relacionado com a macroeconomia, e quando há a percepção de risco, o setor realmente segura o investimento.

Que resultados vocês esperam no Brasil este ano?
Carla –
O tema crise é gritante no Brasil e América Latina, mas a gente vem de discussões em que o tema é global. Estamos trabalhando duramente para melhorar o resultado local, mesmo com os problemas quanto à moeda, principalmente na Venezuela. A projeção é de estabilidade na região e no Brasil. Estamos céticos quanto ao crescimento. Mas estamos com toda a energia e foco para manter os resultados iguais ao do ano passado, controlando gastos, acelerando nossa transformação [digital, por eficiência dos processos internos]. São em tempos de crise que há oportunidade de se diferenciar. Temos que aproveitar o momento para nos reinventarmos e inovar. O momento de crise não é motivo para não inovar, para não entregar resultados. Pelo contrário. Estamos fazendo um acompanhamento minucioso de investimentos, de custos, de necessidades, de parcerias, sempre em diálogo contínuo com a matriz.

Com qual cenário macroeconômico vocês trabalham?
Carla – Com recessão para este ano no Brasil. A moeda vai continuar desvalorizada, mas não vai desvalorizar mais. Estamos fazendo nossas apostas na moeda como está. Na América Latina, crescimento na beira do zero. Brasil puxa para baixo, mas o México puxará pra cima, é o país onde apostamos no crescimento. Acreditamos que em 2017 o Brasil tenha uma retomada. No momento, acho que a gente está no mesmo ritmo do ano passado. Nesta época do ano, em 2015, estávamos revendo muita coisa, e a gente continua fazendo isso, não parou. Em 2017 a gente espera começar a colher os frutos da transformação começada ano passado. A gente já colheu frutos do ano passado em nosso core, que são redes, onde os resultados levantaram em função da transformação digital das empresas.

Quanto menos vocês vão investir no Brasil?
Carla – Nossa parte de P&D é do grupo global. Ali os investimentos permanecem inalterados. Os ajustes são em eficiência. Estamos cortando viagens, algo importante para uma multinacional, revendo contratos com fornecedores. Tem muita avaliação de sinergias em operações e suporte. Teve corte ano passado de pessoal. Em busca de recursos de pesquisa, o Brasil ficou super atrativo, com custo muito competitivo. Estamos 40% mais baratos…

As operadoras admitem que vão reduzir os investimentos, e fazê-los em reais, o que não colabora para o bom desempenho de vocês aqui…
Carla – Isso tudo já está em nosso planejamento. Fizemos essas precauções no Q3 do ano passado. A gente tem falado muito com as operadoras para mostrar que nos momentos de crise, vai se destacar a empresa que entregar mais qualidade de rede. Outra coisa que a gente tem feito é mostrar que a operadora tem que estar mais ágil, buscar mais eficiência. A gente está conversando em virtualização de redes, processos da transformação digital, para diferenciar os negócios. Estamos falando em melhorar rede 4G e já na 5G, mas estamos falando muito da NFV, cloud, IP. Estamos trabalhando muito com a Cisco fora do Brasil, na região. A gente já tem nossa carteira de clientes além de operadoras, com foco em internet das coisas, nos setores de utilities, transporte, segurança pública. Isso já fazia parte da estratégia e vai continuar. As operadoras investirem em reais afeta sim e não, o desempenho. A gente tem nossa fábrica aqui, benefícios do PPB, então temos vantagens e serviços. Estamos nos transformando, passando de uma empresa de hardware para software, tudo isso reduz estes impactos.

Com a fusão Nokia/Alcatel-Lucent, tem-se um novo concorrente de peso para enfrentar a posição de liderança da Ericsson, além da Huawei. Como evitar que eles ganhem parte do mercado de vocês?
Carla – O que a gente olha como nossos concorrentes é a Nokia/Alcatel-Lucent e Huawei em redes. Mas a gente acredita que todos passam pelo mesmo problema. Alcatel-Lucent e Nokia estão executando suas sinergias.  Não vou comentar os concorrente, mas em tempos de crise, quem tiver mais agilidade estará em vantagem.

Mas a Nokia assume o discurso de que a grande vantagem deles agora é oferecer soluções fim-a-fim…
Carla – A nossa também. Por isso fizemos a parceria com a Cisco. Já é uma realidade na América Latina. No Brasil ainda precisamos resolver as questões com o Cade. Nossa prioridade zero são os argumentos com o Cade, mas não há prazos para quando o órgão se manifestará.

Com a Cisco, estamos tateando em nível global [durante o MWC, a empresa anunciou contato com 200 clientes para ofertas conjuntas]. Estamos mais preocupados em afinar como trabalhar com a Cisco, alinhar os equipes, focar times de suporte, de pré-venda. Estamos apostamos que nossa região será uma grande contribuidora nos números dessa parceria. Esta parceria pode mudar em quais regiões do mundo mais faturamos. A América Latina está fazendo investimentos em transformação, digitalização, IP, cloud. Temos projetos recentes interessantes acontecendo, como o de pagamentos móveis do Peru, em parceria com a Asbanc, por exemplo. 

No cenário regulatório, o que a Ericsson enxerga no horizonte? Vocês apostam no fim das concessões?
Carla – 
A gente acredita que neutralidade de rede tem que permitir competição por qualidade, por investimentos. Nas concessões, a gente discute como agilizar a tomada da decisão. Este é assunto urgente. A gente defende que haja irreversibilidade dos ativos das concessionárias para que os valores sejam revertidos em investimentos. Assim, a gente gira a economia para o setor.

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Rafael Bucco

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