União tem que pagar pelos bens reversíveis, diz ex-presidente da Anatel
A não migração ao regime das autorizações com a devolução dos chamados bens reversíveis é uma alternativa para as operadoras recuperarem seus investimentos em telefonia fixa, se prevalecer a polêmica e a insegurança jurídica em torno desse tema, mesmo após a vigência da nova Lei Geral das Telecomunicações (LGT), a Lei 13.789/19.
Isso pode levar a União a indenizar as empresas pelos investimentos já feitos e que estão sendo realizados para a prestação dos serviços, na avaliação do consultor Juarez Quadros, ex-ministro das Comunicações e ex-presidente da Anatel. Ele apontou que as empresas podem optar por pleitear indenização da União, devolvendo os bens antes ou no final dos contratos em 2025, com base nos artigos 102 e 112 da LGT, que tratam dessa questão.
No Artigo 102, o especialista destacou que o parágrafo único estabelece: “A reversão dos bens, antes de expirado o prazo contratual, importará pagamento de indenização pelas parcelas de investimentos a eles vinculados, ainda não amortizados ou depreciados, que tenham sido realizados com o objetivo de garantir a continuidade e atualidade do serviço concedido”.
“E aí vem um baita problema”, previu Quadros, alertando que o Poder Executivo precisa estar atento para definir logo essa questão com os órgãos reguladores e com as operadoras. “De repente, a União vai ter ainda que ressarcir os bens não amortizados dos investimentos que as empresas fizeram. Esse valor [da indenização] requer cálculos em cima dos ativos das empresas, dos balanços, uma avaliação dos bens, se estão depreciados ou em processo de amortização. Mas, mesmo os totalmente depreciados, podem ter um valor econômico, porque poderiam ser ainda úteis à exploração dos serviços”, explicou.
Segundo o ex-ministro, a indenização pode levar em conta o que as empresas continuam investindo para garantir a prestação de serviço de telefonia fixa. “Aqueles bens que foram transferidos lá em 1998, na privatização, muitos já estão amortizados ou depreciados. Mas o que as empresas vêm fazendo, ao longo do tempo, até o final da concessão, que será em 2025, é investir”, observou.
Comentou ainda que o Artigo 112 prevê que a concessão será extinta por advento do termo contratual, encampação, caducidade, rescisão e anulação. E no parágrafo único estabelece que a extinção devolve à União os direitos e deveres relativos à prestação do serviço.
Por que migrar?
Quadros também questionou por que as operadoras irão migrar, com insegurança jurídica, do regime de concessão para o de autorização, com insegurança jurídica e por conta do pouco tempo que resta para o fim dos contratos.
Acrescentou que o interesse público da adaptação do instrumento de concessão para autorização requer segurança jurídica. “Mediante solicitação da concessionária a adaptação, condicionada à observância de compromissos, obrigações e garantias; implicará em um valor econômico associado à adaptação da outorga, a ser determinado pela Anatel, com indicação da metodologia e dos critérios de valoração”, completou.
Na avaliação de Quadros, o valor econômico será a diferença entre o valor esperado a partir da exploração do serviço adaptado em autorização e o valor esperado em regime de concessão, calculados a partir da adaptação. Esse valor será revertido em compromissos de investimentos, priorizados conforme diretrizes do Poder Executivo.
“Então, cabem ao Poder Executivo regulamentar a Lei reformada, priorizando diretrizes, e à Anatel implementar, em sua esfera de atribuições, a reforma da política nacional de Telecomunicações”, recomendou.
Quadros lembrou que quanto mais se aproxima o prazo final dos contratos, menor é o saldo de investimento, ou seja, quanto as empresas terão de investir para expansão da banda larga, como fixou a nova LGT. “Essa montanha de gelo [dos bens reversíveis] vai virar em 2025 uma pedrinha de gelo que não vai valer mais nada”, comparou.
Uma parte da insegurança jurídica é atribuída à disposição de ir à Justiça pelo valor dos bens reversíveis feita pela advogada Flávia Lafèvre, do Coletivo Intervozes, uma das 37 entidades integrantes da Coalizão Direitos na Rede, que prega o acesso à internet para todos. Ela defende que a Anatel siga as determinações do Tribunal de Contas da União (TCU), que obrigou a agência a fazer o levantamento e cálculo do valor de todos os bens reversíveis para evitar prejuízos aos consumidores e à União.
O cálculo dos bens reversíveis está sob análise do Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que pode apreciar proposta do conselheiro Emmanoel Campelo na reunião agendada para o próximo dia 6 sobre a regulamentação do novo marco legal das telecomunicações sancionado em outubro de 2019.