Primo de Rivera: O Cavalo de Troia e a Oi
* Por Fernando Primo de Rivera
Desde que a Oi entrou em recuperação judicial no início de 2017, cinco anos completos se passaram e, no entanto, a operadora está em uma situação pior do que quando entrou em falência. Diz ter uma dívida financeira de R$ 18 bilhões, mas o passivo é muito maior!
Não estão considerados no passivo reconhecido pela Oi novas multas da Anatel que somam mais de R$ 7 bilhões, conforme o parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), de junho de 2022, e a dívida com a Globenet.
No total, são passivos de mais de R$ 30 bilhões e um EBITDA abaixo de R$ 2 bilhões estimados para este ano. Como a Justiça permitiu a saída oficial da Oi da Recuperação Judicial (RJ) é uma grande dúvida que fica no ar.
O ingresso
Taxas de juros mais altas, alta do dólar e cortes fracos de custos têm sido apontados como os principais culpados pelo fracasso do RJ. Mas o verdadeiro problema está na venda de ativos, em particular, o FTH e a forma como foi feita.
A Globenet ingressou na operação de compra da rede de fibra, a InfraCo, agora transformada na empresa V.tal, sem que houvesse qualquer justificativa plausível para essa participação.
Uma das obrigações estabelecidas na Recuperação Judicial (RJ), e que deveria ser acatada pela Oi, era que a empresa deteria 49% da InfraCo e venderia 51% do capital total. Mas, com o fechamento da operação, os acionistas da Oi descobrem que a Globonet, empresa do banco BTG, entra no negócio; que a Oi é multada com perda de participação societária por não ter cumprido as metas com as quais havia se comprometido junto ao novo sócio; e que ainda teria uma diluição maior devido ao aumento de capital na V.tal para o ingresso do Fundo de Pensão Canadense. No final, a Oi fica com pouco mais de 30% da V.tal.
Antes, os acionistas da Oi, durante cerca de quatro a cinco anos que durou a reestruturação, investiram R$ 20 bilhões, a uma taxa da R$ 5 bilhões de Capex por ano, no período 2017-2020, e não para reduzir a dívida!, mas para colocar o ativo mais importante, a InfraCo, com Ebitda positivo, para depois repassá-lo ao “comprador”, BTG/Partners. Mas esse comprador não forneceu entradas líquidas de caixa que permitisse alívio da dívida da Oi.
Como é possível ?
A chave é que o dinheiro que saiu para a aquisição da Oi volta para a própria V.tal, na forma de pagamentos para a Globonet. A inclusão da Globonet nas condições de venda da Infraco ao BTG/Partners funciona como um verdadeiro “cavalo de Tróia” em detrimento dos acionistas da Oi e da própria viabilidade da empresa. Não houve “venda”, houve troca de ativos por passivos ocultos a uma empresa provavelmente falida.
A Globonet é a empresa que tem como principal ativo um cabo submarino para transferência de dados, que, por sinal, o BTG comprou da própria Oi, na forma de uma taxa de consultoria quando ela, Oi, se fundiu com a Portugal Telecom. É um investimento cuja viabilidade independente é altamente questionável.
Não há, contudo, em qualquer documento ou decisão da RJ a inclusão da Globenet como obrigação para viabilizar o negócio. Mas a direção da Oi e de seu conselho de administração decidiram que esse seria um “bom negócio” e concordaram que a Oi deveria “pagar” (ao invés de receber) R$ 1,2 bilhão pelo ingresso dessa empresa de cabo. E o pagamento se deu sob a forma da diluição da Oi no capital da nova empresa, a V.tal.
Ou, em outras palavras, a Oi assumiu um investimento duvidoso do BTG/Pactual, e pagou por isso reduzindo sua participação na Vtal. Ora, a quem poderia interessar esse grande negócio? Obviamente, só ao próprio dono da Globenet.
Como se não bastasse, nessa “brilhante” operação, foi mantida a inexplicável cláusula contratual de a Oi ter que pagar R$ 1,2 bilhão por ano – no período de 2025 a 2028 – pelo “uso” da rede da Globenet. Ora, todos sabem no mercado que a Oi consome muito pouca banda de dados internacionais e não haveria qualquer razão operacional para tamanho valor contratado. A não ser, por óbvio, a expansão da rede do BTG com recursos da Oi.
O argumento de que essas condições suicidas tiveram que ser aceitas porque não havia outro comprador, precisa ser comprovado, pois não parece crível a qualquer administrador se submeter a condições que abortam a chance de redução da dívida e que matam as opções da empresa e que supõem sua morte. Talvez também a necessidade de abençoar judicialmente esta “venda” explique a saída incompreensível do RJ, para depois pedir outra entrada, passado um mês e meio.
Por essas e outras, – como as que já se comentam nos bastidores, de que, agora, a direção estaria pensando em separar novamente os ativos e vender os clientes da “cliente Co”, resolvendo a falência implícita de Vtal – é que não causa surpresa que investidores ativistas queiram entrar no comando da operadora e indicar novos dirigentes.
*Fernando Primo de Rivera é diretor da Armada Capital, ex-acionista de longa data da Oi desde 2015. Tem 28 anos de experiência em mercados globais de ações listadas e é especializado em eventos e situações especiais. Ele é economista e advogado.