Postes: o que acontece agora que Aneel avalia texto diferente da Anatel?
A votação sobre a resolução conjunta elaborada por Anatel e Aneel aconteceu hoje, 24, em ambas as autarquias. Na Anatel, foi aprovada por unanimidade. Na Aneel, no entanto, o processo travou com pedido de vistas (leia aqui). Se ambas tivessem aprovado a minuta, a resolução já poderia valer neste ano após publicação no Diário Oficial. Mas como não foi, o que acontece agora?
O presidente da Anatel, Carlos Baigorri, diz ao Tele.Síntese que vai esperar, mas pretende buscar unidade com a Aneel. “Vamos aguardar a decisão da Aneel e avaliar como convergir”. Moisés Moreira, conselheiro que acompanhou mais de perto o assunto nos últimos anos, não cogita mudança no dever de cessão. Diz que eventual retirada disso da resolução a tornará inócua. Defende, portanto, que a negociação travada até aqui entre as agências seja respeitada.
Preocupação
Especialistas fazem suas apostas. Cristiane Sanches, advogada e líder do conselho de administração da Abrint, associação que reúne provedores de internet, diz que eventual texto alternativo vindo da Aneel terá de ser submetido a nova deliberação em cada agência, e aponta para o desafio de nova articulação. “O trabalho de alinhamento com a Anatel, nos últimos dias, ficou prejudicado. Será preciso buscar todo o consenso com ambas novamente, o que demanda muito esforço”, prevê.
Em manifestação oficial, a Abrint afirma: “Com relação à divergência na Aneel, embora essa divergência tenha sido apresentada como pontual, ela não deve ser vista assim. Essa divergência prejudica a padronização da intervenção regulatória, prejudica a lógica atual da regularização dos postes, minimiza os incentivos regulatórios necessários para mudar o padrão caótico. Esperamos que o equilíbrio dê o tom para os próximos passos”.
Eduardo Ramires, sócio fundador da Manesco Advogados, vê na divergência levantada na Aneel um passo atrás com a finalidade de garantir a precedência do serviço de distribuição de eletricidade sobre os demais usuários da infraestrutura. “Entendo que não é a melhor abordagem para uma infraestrutura tão fundamental e disputada por serviços tão relevantes para a sociedade. Os limites acomodação do mercado através da livre negociação já foram explorados e os resultados ainda estão longe de atender aos interesses em jogo”, avalia.
O advogado Tomás Filipe Schoeller Paiva, sócio do Demarest, tem percepção diferente. “As alterações propostas pela diretora Agnes não parecem ser substanciais. Haveria espaço para que a Anatel aceitasse essas alterações. A Anatel precisaria chamar outra reunião do Conselho Diretor, extraordinária ou Circuito Deliberativo para aprovar essas alterações propostas pela Aneel, imaginando-se um cenário de aprovação de minuta diferente da Anatel”, opina.
Avanços positivos
Paiva enxerga avanços importantes para o setor de telecomunicações com o que foi aprovado. “Um ponto extremamente importante foi o reconhecimento de que o preço a ser definido será por ponto de fixação. Quando tiver um grupo econômico, vai ter restrição de que o grupo só pode ocupar um ponto de fixação. Telefônica e Fibrasil, V.tal e Oi, ISPs com diversos provedores no mesmo grupo, só podem usar um ponto e, se esclareceu, o preço é de um ponto, independente do acesso por vários dos prestadores”, observa.
Thays Gentil, sócia da área de TMT do escritório Cescon Barrieu, concorda. E acrescenta que outro ponto muito positivo foi a retirada do artigo que permitia ao posteiro criar rede de fibra óptica. “A decisão teve o atendimento de alguns pleitos setoriais, de fazer com que o posteiro não fosse também operador de fibra. Isso geraria desequilíbrio muito grande, tanto pelo poder de decidir o direito de passagem dos pontos de fixação, quanto pelo direito de exploração da fibra. Acho que isso resolve esses desequilíbrios”.
Penduricalhos preocupam
Gentil traz, porém, preocupação com a questão dos “penduricalhos”, cujo preço para fixação nos postes será definido pela posteira. “Esse é um ponto ruim, pode gerar uma cobrança extra que não o preço da Aneel orientado a custo e levar a um desequilíbrio na hora da remuneração. Já vi casos em que a elétrica coloca essa novidade na hora da renegociação de contratos, em prorrogações, e não estava previsto nos cálculos da operadora”, comenta.
Paiva, do Demarest, concorda. Mas observa que um caminho foi apontado. “O risco é que o ônus da ocupação seja aumentado em razão dessas cobranças extras, já que não terão preços fixados pelas agências. A Anatel colocou que as agências vão controlar através de ofertas de referência, que deverão prever todos os preços. E as agências poderão corrigir e intervir em caso de eventuais desvios”.
Saldo final: positivo
Os especialistas vêm avanço nas votações de hoje e elogiam as agências por terem chegado aos termos que chegaram até aqui, ressaltando o desafio de equilibrar interesses tão diferentes quanto os dos setores de telecom e energia – algo nada “trivial”, como diz Ramires, da Manesco Advogados.
Ele conclui: “O texto aprovado pela Anatel (e pendente da aprovação da Anaeel) representa, sem dúvida, um avanço em relação ao entendimento comum já obtido com a Aneel nos regulamentos vigentes, em que a infraestrutura já é reconhecida como essencial para o acesso de prestadores de serviços de telecomunicações aos seus usuários. O novo esforço promete estabelecer um preço regulado e equitativo com a implantação e operação da infraestrutura”.