PF investiga sistema ilegal de invasão na rede de telefonia usado pela Abin

Operação Última Milha investiga servidores da agência de inteligência que operaram software First Mile. Órgão afirma que interrompeu uso da ferramenta em maio de 2021.
PF investiga sistema ilegal de invasão na rede de telefonia usado pela Abin | Foto: Divulgação/PF
Operação Última Milha investiga uso do First Mile pela Abin. | Foto: Divulgação/PF

A Polícia Federal deflagrou nesta sexta-feira, 20, a Operação Última Milha, que investiga irregularidades no sistema de monitoramento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).  De acordo com a apuração, o software de geolocalização utilizado pelo órgão é uma ferramenta intrusiva na infraestrutura crítica de telecom, e a rede de telefonia brasileira “teria sido invadida reiteradas vezes, com a utilização do serviço adquirido com recursos públicos”.

O caso se tornou público a partir de reportagem do jornal O Globo,  que trouxe de um servidor público sobre o monitoramento ilegal de jornalistas, políticos e adversários do ex-presidente Jair Bolsonaro a partir da ferramenta “First Mile”, que inclusive inspirou o nome da operação da PF.

A Abin, por sua vez, confirmou que a aquisição se deu em dezembro de 2018, mas que o uso foi interrompido em maio de 2021. A agência afirma ainda que vem colaborando com as autoridades (veja nota na íntegra mais abaixo).

Sob despacho do Supremo Tribunal Federal (STF), a Operação Última Milha envolve 25 mandados de busca e apreensão e dois mandados de prisão preventiva, além de diversas medidas cautelares, que estão sendo cumpridas nos estados de São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Goiás e no Distrito Federal.

Ainda de acordo com a PF, os responsáveis podem responder pelos crimes de invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

First Mile

A Data Privacy, entidade que reúne especialistas em defesa da proteção de dados, já havia emitido um ofício ao Ministério Público Federal (MPF) pedindo providências sobre o uso do software em questão.  A associação explica que “o First Mile funciona como serviço de geolocalização de dispositivos móveis em tempo real, capaz de decodificar as identidades lógicas dos dispositivos e de gerar alertas sobre a rotina de movimentação dos alvos de interesse”.

“O uso de tecnologias GLMC/SMLC para real time GPS positioning tracking for target user é uma ofensa dupla ao direito fundamental de privacidade e ao direito fundamental à proteção de dados pessoais”, diz a Data Privacy em comunicado divulgado nesta manhã, em decorrência da operação deflagrada.

A entidade ressalta que o STF já reconheceu em precedentes que as atividades de inteligência da Abin não operam em campo de exceção dos direitos fundamentais, portanto, se submetem às regras do Estado Democrático de Direito. Além disso, lembra que a fornecedora da tecnologia, Cognyte (antiga Verint Systems), tem histórico em disponibilizar ferramentas para atividades de espionagem ilegal. Ela foi citada em apuração jornalística também em Myanmar, país do sul da Ásia continental, por oferecer serviços à empresa pública Myanman Posts and Telecommunications, em 2021, antes do golpe que resultou em mais de 12 mil prisões e 1, 6 mil pessoas assassinadas.

Por fim, a Data Privacy Brasil destacou que a operação mostra uma “situação gravíssima”, e que o caso não pode ser visto como uma exceção, para que Poder Público tome medidas no sentido de conter o uso de softwares tecnoautoritários.

Outro lado

A Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) informa que, em 23 de fevereiro de 2023, a Corregedoria-Geral da ABIN concluiu Correição Extraordinária para verificar a regularidade do uso de sistema de geolocalização adquirido pelo órgão em dezembro de 2018.

A partir das conclusões dessa correição, foi instaurada sindicância investigativa em 21 de março de 2023. Desde então, as informações apuradas nessa sindicância interna vêm sendo repassadas pela ABIN para os órgãos competentes, como Polícia Federal e Supremo Tribunal Federal.

Todas as requisições da Policia Federal e do Supremo Tribunal Federal foram integralmente atendidas pela ABIN. A Agência colaborou com as autoridades competentes desde o início das apurações.

A ABIN vem cumprindo as decisões judiciais, incluindo as expedidas na manhã desta sexta-feira (20). Foram afastados cautelarmente os servidores investigados.

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Da Redação

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