Governo apresenta estratégia para Alada, empresa pública aeroespacial
As Comissões de Ciência, Tecnologia e Inovação (CCT) e de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CRE) da Câmara dos Deputados realizaram nesta quarta-feira, 27, uma audiência pública sobre o projeto de lei que cria a empresa pública de serviços aeroespaciais, Alada (PL 3819/2024), protocolado pelo Poder Executivo no último mês. Representantes do governo detalharam aos parlamentares a estratégia que envolve a proposta.
Antes de chegar ao Congresso, a ideia de criar uma estatal no setor aeroespacial ronda o governo desde 2004. Em 2018, um decreto instituiu o Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro (CDPEB), no âmbito da Presidência da República. Com isso, foram criados diversos Grupos Técnicos (GTs) temáticos, que reforçaram demandas, entre elas, um projeto de lei para a criação da “Empresa de Projetos Aeroespaciais do Brasil S.A – Alada”.
Até 2022, a situação ainda era incerta. Enquanto isso, o Congresso Nacional avançou com demandas paralelas, como a Lei Geral do Setor Espacial (PL 1006/2022), aprovada em julho deste ano e transformada na Lei 14.946/2024. Por fim, o texto introduziu definições legislativas para a exploração das atividades espaciais de forma geral.
Em outubro deste ano, o projeto de lei que trata da estatal brasileira enfim chegou ao Congresso Nacional, prevendo a possibilidade do Estado, por meio da NAV Brasil, criar subsidiária [no caso, a Alada] para “explorar economicamente a infraestrutura e a navegação aeroespaciais e as atividades relacionadas ao desenvolvimento de projetos e equipamentos aeroespaciais e realizar projetos e atividades de apoio ao controle aeroespacial e áreas correlatas”.
Objetivos
O major-brigadeiro Rodrigo Alvim de Oliveira, chefe da Terceira Subchefia do Estado-Maior da Aeronáutica, destacou que há três “critérios críticos” para a criação da Alada. Um deles é que “a empresa tem que ser capaz de fazer a exploração econômica, ou seja, atrair o capital privado para completar o orçamento público”.
Um segundo ponto é a “geração de novas fontes de receitas de tributos”. A título de exemplo, Oliveira cita o lançamento de foguete da empresa Innospace na base de Alcântara (CLA), no Maranhão. No caso em questão, o contrato que o governo firmou ficou limitado do ponto de vista de atrair recursos.
“Nesse contrato que ela [Innospace] possui com a Força Aérea, cobra-se preço de custo, porque a União não pode auferir lucro. Esse preço poderia ser 20 vezes maior se fosse aplicado o preço de mercado, que a Alada vai poder aplicar”, exemplificou o representante do Comando da Aeronáutica.
O terceiro ponto, de acordo com Oliveira, é a “soberania do país no controle estratégico de ambos os programas: o militar e o civil”.
“O Brasil possui um imenso potencial para ser explorado por essas empresas comerciais. […] Só o Centro de Lançamento de Alcântara possui mais amplitude do que os quatro centros americanos somados. É a posição mais privilegiada do mundo para o lançamento de satélites para órbitas equatoriais”, destacou o major-brigadeiro.
Em síntese, o papel da subsidiária, segundo Oliveira, será “investir no Programa Espacial Brasileiro, aumentar receitas e tributos com consequente aumento de empregos diretos e indiretos”, além de “promover o fomento à indústria nacional”. Entre os impactos práticos, citou benefícios para a conectividade em áreas remotas, como consequência do desenvolvimento do setor aeroespacial no país.
Estrutura e produtos
Ainda conforme o detalhamento apresentado por Oliveira a partir do projeto, a Alada terá uma estrutura de governança distinta da NAV Brasil, definida pelo seu próprio estatuto social. O capital social será integrado ao Comando da Aeronáutica.
“Ela terá uma condição de subsidiária por um tempo determinado, a depender dos Conselhos Administrativos de ambas as empresas [NAV Brasil e Alada]”, afirma.
A ideia é que funcione como um “escritório de projetos”, em Brasília. “Uma empresa pequena, coordenadora de projetos estratégicos. Ela não vai produzir artefatos, mas [sim] fomentar a indústria nacional, aplicando os recursos adquiridos da iniciativa privada. E não vai se sobrepor aos demais órgãos existentes, como a Agência Espacial Brasileira”, disse o militar.
Entre os principais produtos que a empresa pode explorar, o representante do Comando da Aeronáutica cita o lançamento de veículos espaciais, serviços de telemetria, venda de veículo orbital, projeto de produção de veículo lançador de microssatélites, promoção de incentivo à indústria nacional para equipar veículos não tripulados e assessorias a offset e patentes.
Demandas ao PL
Também presente na audiência pública, o presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Marco Chamon, destacou que “é absolutamente necessário dar flexibilidade ao uso das infraestruturas que nós já possuímos”. “O Programa Espacial Brasileiro é, sob muitos aspectos, bem sucedido. Temos satélites, foguetes e bases de lançamento. Ele ainda não é bem sucedido do ponto de vista comercial, porque não era o objetivo inicial, mas passa a ser agora, com a presença da empresa Alada”, afirmou.
Chamon aproveitou a exposição para chamar atenção para três pontos que podem ser aprimorados no projeto de lei. O primeiro deles é evitar o risco de invasão às atribuições que a AEB já possui, prevendo expressamente a preservação das competências da agência no texto da proposição.
Em nome da AEB, Chamon também defendeu a inclusão dos assuntos de segurança nacional e interesse da defesa entre as áreas de projetos da empresa pública que podem ser realizados sob demanda, com autorização do Ministério da Defesa.
Por último, o presidente da agência manifestou preocupação com a requisição de pessoal especializado, o que poderia afetar o quadro de profissionais da AEB. Isto porque o projeto de lei prevê a possibilidade de cessão de servidores e de empregados públicos, independentemente da ocupação de cargo em comissão ou de função de confiança, sem dispor sobre limitações.
“Permitir que se requisite funcionários [civis] a qualquer tempo, em qualquer quantidade, de qualquer organização, talvez não seja a melhor solução, […] porque a própria empresa vai precisar de acordos com essas outras instituições para utilizar seus laboratórios e sua competência técnica”, detalhou Chamon.
Gestão
Para a secretária de Coordenação e Governança das Empresas Estatais do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), Elisa Vieira Leonel, o texto atual do projeto de lei assegura o controle da cessão de funcionários ao condicionar o remanejamento à autorização dos gestores.
Durante sua exposição, Elisa defendeu a visão estratégica do governo em investir em novas estatais. Ela citou relatório do Banco Mundial, que aponta justificativas para o aumento dos “negócios de Estado”, que são as atividades empresariais em que o governo tem mais de 10% de participação acionária, entre elas, a soberania do país em atividades estratégicas. “A atividade aeroespacial ganha uma relevância cada vez maior”, disse.
A secretária acrescentou ainda que em casos de crises geopolíticas e naturais, há o entendimento de que “só o Estado consegue fazer investimentos de longo prazo e assumir riscos [envolvidos]”.
Por fim, Elisa ressaltou que a subsidiária estaria ainda submetida à supervisão da política pública finalística, visando o desenvolvimento do país e medidas de impactos à sociedade.