Dividido, STF suspende análise sobre dados móveis sigilosos pela segunda vez

Ação da Acel aberta em 2017 pede que Supremo revise prerrogativa de delegados, promotores e procuradores para solicitarem informações às operadoras sem decisão judicial.
Dividido, STF suspende análise sobre dados móveis sigilosos pela segunda vez
Questão sobre dados sigilosos chegou ao STF a pedido da Acel |Crédito: STF/Divulgação

O julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre quais dados telefônicos podem ser requisitados por delegados e membros do Ministério Público sem determinação judicial foi suspenso pela segunda vez nesta semana, com pedido de vista da presidente da Corte, ministra Rosa Weber. A primeira vez ocorreu em junho de 2021, quando houve divergência em plenário.

O caso chegou ao STF por meio de processo aberto pela Associação Nacional das Operadoras Celulares (Acel) – Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5642 – questionando a Lei 13.344/2016, que dá autorização a delegados, procuradores e promotores para requisitar informações às operadoras sobre dados necessários a certas investigações criminais, independentemente de autorização judicial.

A lei em questão indica que as solicitações das autoridades valem “para qualquer empresa da iniciativa privada” ou órgão público, com prazo de atendimento de até 24 horas, quando se tratar de crimes como sequestro e cárcere privado, condição análoga à escravidão, tráfico de pessoas e exploração sexual. A associação alega que trata-se de “informações cujo sigilo as associadas da Acel têm contratualmente e legalmente o dever de guardar”.

A ação foi protocolada em janeiro de 2017, aproximadamente um mês após a norma entrar em vigor, sob sanção do então presidente Michel Temer. A Acel pedia medida cautelar para limitar o objeto das requisições às informações cadastrais e dados que não representem violação ao sigilo e à privacidade constitucionalmente garantidos. Mas o julgamento só começou quase quatro anos depois.

Manifestações

Em parecer, a Procuradoria-Geral da República (PGR) divergiu da associação, alegando que “não há razão que justifique a exigência de prévia autorização do juiz para requisição de meios necessários à obtenção da localização de vítima e/ou suspeito em tempo real no caso da prática de crimes relacionados ao tráfico de pessoas”.

No mesmo sentido, também se manifestaram ao Supremo, contrários à inconstitucionalidade da norma, a Presidência da República, o Senado Federal e a Advocacia-Geral da União. Tal unanimidade, no entanto, não ocorreu entre os ministros.

Em junho de 2021,o plenário do Supremo iniciou o julgamento da ação. À época, o relator, ministro Edson Fachin, rejeitou o pedido da Acel, entendendo não haver inconstitucionalidade na lei. “Não deve haver expectativa de privacidade para quem está em situação de flagrante delito de crime grave com vítimas submetidas à restrição de liberdade”, disse ele.

“[…] a norma foi produzida pelo Congresso Nacional após longas investigações no âmbito da Comissão Parlamentar de Inquérito que investigava graves denúncias de tráfico de pessoas. A proposta, objeto de um longo processo de negociação, buscou dar ampla efetividade aos mecanismos de combate a essa modalidade de crime, cuja gravidade não apenas é reconhecida pela legislação brasileira, como também por diversos tratados internacionais de que o país é parte”, afirmou Fachin.

O ministro também reforçou no voto aquelas informações que podem ser requisitadas sem determinação judicial pelas autoridades e aquelas que ainda dependerão passar por um tribunal.

  • Há necessidade de autorização judicial para:
  • interceptação de voz;
  • interceptação telemática;
  • dados cadastrais de usuários de IP, os quais abarcam dados de usuário que em determinado dia, data, hora e fuso fizeram uso de um IP para acessar à internet;
  • serviços de agenda virtual ofertados por empresas de telefonia;
  • dado cadastral de e-mail e
  • extratos de conexão a partir de linha ou IP.

Podem ser requisitados sem controle judicial prévio, “mas sempre sujeito ao controle judicial posterior”:

  • localização de terminal ou IMEI de cidadão em tempo real por meio de ERB por um período determinado e desde que necessário para os fins de reprimir os crimes contra a liberdade pessoal;
    extrato de ERB;
  • dados cadastrais dos terminais fixos não figurantes em lista telefônica divulgável e de terminais móveis;
  • extrato de chamadas telefônicas;
  • extrato de mensagens de texto (SMS ou MMS) e
  • sinais para localização de vítimas ou suspeitos, após o decurso do prazo de 12 horas.

Suspensões

Ainda em 2021, o ministro Marco Aurélio divergiu de Fachin e votou favorável à associação, destacando que o texto constitucional exige autorização judicial para o afastamento da privacidade.

À época, em meio ao debate, a análise foi suspensa por pedido de vista do ministro Nunes Marques. Ele apresentou o voto em julgamento retomado nesta semana em plenário virtual, rejeitando o pedido da Acel, no mesmo entendimento do relator, assim como o ministro Alexandre de Moraes.

Com placar de 3 a 1 contra a Acel, Rosa Weber pediu vistas e o julgamento está suspenso por período indeterminado, até que ela conclua seu voto.

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura de telecom nos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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