Diretora da ANPD aponta limites do segredo comercial

Quais tipos de dados devem ser compartilhados com usuários de serviços digitais e o órgão regulador? Miriam Wimmer falou sobre o tema em seminário do CGI.br.
Transparência de dados que envolvem segredo comercial foi debatida em evento promovido pelo CGI.br, que reuniu ANPD, Google, Meta entre outros. (Crédito: Freepik)

A diretora da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), Miriam Wimmer, defende o compartilhamento de dados que podem estar ligados ao segredo comercial para fins de fiscalização das plataformas digitais, no âmbito do atacado. Ela falou sobre o tema durante seminário realizado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), nesta quinta-feira, 1º.

“Estamos falando de um conteúdo mais qualificado, mais sofisticado, que permita a um órgão especializado avaliar a conformidade com a legislação. Estamos falando, inclusive, de transparência quanto às informações que, potencialmente, sejam protegidas por segredos comerciais e industriais. Segredos estes que devem ser honrados pelo órgão público que tenha acesso a tais informações”, afirmou Wimmer.

Como exemplo prático deste compartilhamento de dados, a diretora citou a emissão de relatórios, que funcionariam como “obrigações proativas e ex ante [de prevenção] de transparência” e que poderiam “andar de braços dados com as competências de fiscalização e de auditoria por parte de um regulador”.

“Em muitos casos, quando se tratar de transparência perante a órgãos reguladores, haverá interesse não apenas em compreender porque que se deu [alguma decisão] em determinada situação concreta, mas de entender como um sistema como um todo funciona, a tal da transparência no atacado. Porque é desse jeito e não de outro jeito? Quais são os critérios?”, exemplificou Wimmer.

Diretora da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), Miriam Wimmer, em evento do CGI.br em 1º de setembro. (Foto: NIC.br: Reprodução)

Ainda de acordo com a diretora da ANPD, é preciso entender que as obrigações das empresas com o poder público são diferentes daquelas devidas ao consumidor dos serviços digitais.

“Para quê serve essa transparência [a rigor de um órgão de fiscalização] para o cidadão comum, que não sabe o que fazer com ela e talvez nem tenha condições materiais e cognitivas para lidar com aquela sobrecarga de informações ou até mesmo interesse em, individualmente, contestar abordagens que lhe pareçam inapropriadas?”, questionou Wimmer.

Segundo a diretora, para os usuários, considera-se o conceito de transparência no varejo, o que demanda uma informação mais “compreensível”.

“[Para o usuário] não estamos falando de abrir código fonte, de entregar segredos comerciais e industriais, talvez não seja necessário nem ter uma explicação global sobre como funciona uma rede social, ou uma plataforma determinada, mas sim uma explicação que permita ao indivíduo compreender as razões que levaram àquela decisão [que o afeta diretamente], para que ele possa solicitar correções, questionar, contestar o que ele considere inapropriado”, complementou a diretora.

Do outro lado, as big techs

Monica Steffen Guise, head de políticas públicas para integridade na Meta, em seminário do CGI.br. (Foto: NIB.br/Reprodução)

Monica Steffen Guise, head de políticas públicas para integridade na Meta, destacou que a empresa é a favor de uma regulação das plataformas digitais.

“Há uma falsa ideia de que as big techs não querem regulação. Esse é um argumento falacioso. Não posso falar pelas demais, falo pelo grupo Meta. Queremos, sim, regulação. A regulação oferece para o modelo de negócio um espaço muito seguro. É muito ruim você trabalhar no espaço onde há falta de regulação, porque gera uma incerteza jurídica muito grande em relação a até onde se pode ir”, afirmou Mônica.

De acordo com a gerente, espera-se uma “regulação responsável”, que “não seja colocada de forma açodada, de forma a travar a inovação”.

“Se a gente for olhar para as big techs, para empresas que não estão entendendo produtos mas que estão vendendo um serviço, há sim de se falar em segredo de negócio e propriedade intelectual”, defendeu Guise.

Entre os dados sensíveis de compartilhamento, a head de políticas públicas para integridade da Meta citou a “transparência de algoritmo”. “Existe uma linha muito tênue entre o que se pode abrir e o que não se pode abrir, porque se pede de forma muito agressiva a competitividade no mercado”, disse Guise.

Marcelo Lacerda, diretor de relações governamentais do Google Brasil, foi questionado sobre o poder que a plataforma detém sob os usuários, por conta do ininterrupto compartilhamento de dados. Durante debate, ele ressaltou que os dados são a base dos serviços do Google.

“O dado é um dos elementos do negócio de publicidade do Google. São esses dados que possibilitam que a gente conectar o consumidor com publicidade relevante. É essa publicidade que permite que a gente possa oferecer serviços gratuitos para esses consumidores, como Gmail, Maps, entre outros”, afirmou Lacerda.

Marcelo Lacerda, diretor de relações governamentais do Google Brasil, em seminário do CGI.br. (Foto: NIB.br/Reprodução)

Levando em consideração o peso dos dados no serviço do Google, o diretor de relações governamentais ressaltou o impacto dos resultados na economia do país. “Essa publicidade [baseada em dados] também possibilita que negócios online sobrevivam e floresçam. O último relatório de impacto econômico do Google no Brasil estimou que, em 2021, as plataformas ajudaram a movimentar mais de R$100 bilhões na economia brasileira”, afirmou.

Lacerda defendeu a política do Google destacando que parte da base de dados é compartilhada com o público nas diversas ferramentas de monitoramento do comportamento na rede disponibilizadas gratuitamente pela big tech.

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura de telecom nos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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