CCJ da Câmara debate perfil da autoridade de dados
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) pode ter perfis diferentes, mas sempre deve buscar sua autonomia administrativa e financeira e muito preparo para enfrentar desafios enormes, em um campo ainda desconhecido. Esse é o senso comum das exposições de especialistas – a maioria da área de direito – que participaram de audiência pública sobre a composição do órgão, que ainda aguarda aprovação no Congresso Nacional, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, nesta quinta-feira, 23.
A única voz dissonante veio do presidente da Digital Law Academy, Coriolano Camargo, que defende a autorregulação da internet no Brasil. Com essa visão, ele entende que a ANPD deve ter um caráter eminentemente privado, com uma estrutura multidisciplinar, formada por representantes dos vários setores contemplados, nos moldes do Conar (o órgão de autorregulação da publicidade), mas com apoio governamental.
Ele recomenda que essa tal agência tenha ainda a participação da magistratura e da academia, com poder de opinar. “Essa agência deve ser um órgão propulsor do desenvolvimento nacional”, sustentou.
A juíza federal do TRF 2, Isabela Ferrari, entende que o perfil da ANPD deve ter a capacidade de compreender o enorme desafio que é a de proteção de dados. Além disso, deve ter habilidade jurídica, ter conhecimento de programação para entender os algoritmos e entender de políticas públicas. Segundo ela, em um ambiente de inteligência artificial, onde o algoritmo “aprende” e pode gerar atitude discriminatória, o trabalho da autoridade se torna gigante, uma vez que ainda não há receitas em nenhum lugar do mundo.
A desembargadora Leila Chevtchuk, do TRT 2, cita outro ponto que merece atenção, que é o da automação da decisão, onde, de novo, os algoritmos podem levar a atos discriminatórios. Ela entende que a revisão das decisões por pessoa natural, como previa a LGPD seria mais adequado.
Dados é o novo petróleo
Para o representante da OAB, Arthur Rollo (foto), disse que a ANPD será imprescindível para a implantação da lei, que começa a valer em fevereiro de 2020 e, apesar da complexidade do mercado, o uso de dados está no dia a dia das pessoas, sobretudo para estabelecer padrões de consentimentos. “Apesar da proximidade de a lei entrar em vigor não se ver muitos movimentos das empresas de se adequarem a ela, muito menos para criação de um órgão de autorregulação”, lamentou.
Rollo defendeu a possibilidade da Secretaria Nacional do Consumidor e do Ministério Público em punir as empresas que violarem a lei, competências que não estão previstas na legislação. “Nós não podemos excluir a fiscalização que esses promovem”, disse.
O advogado, que já chefiou a Senacon, defendeu também a autonomia da ANPD para ter adequação com a entidade europeia, para garantir o fluxo de dados e o fluxo de investimentos. “Se dados é o novo petróleo é preciso muita atenção”, disse.
O presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, João Augusto Versiani, sem regulamentação, as empresas que detêm dados dos cidadãos têm poderes incalculáveis. “Os Estados Unidos que são o país mais liberal do mundo, estão sempre punindo as gigantes da internet, com multas pesadas”, disse.
Para Versiani, além de uma equipe multidisciplinar, a autoridade de dados deve ter um representante da persecução penal. Também quer o órgão independente, para que possa regular o uso de dados dos cidadãos pelo governo, mesma defesa do representante da Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), Cláudio Paixão.
Já o Chefe do Serviço de Perícias e Crimes Cibernéticos Polícia Federal, Paulo Quintiliano, a ANDP vai depender de peritos para buscar as provas digitais deixadas pelos violadores da lei, nas questões de conflitos. Ele acredita que os principais casos vão mesmo parar na justiça. Na plateia, houve quem defendesse a inclusão de hackers oficiais na composição da ANPD.