Big Techs agora têm um projeto de lei para proteger seus interesses

O deputado Lafayette Andrade, que preside a Frente Parlamentar Digital, que é apoiada pelo Instituto Cidadania, que é sustentado pelas big techs, axpresentou hoje substitutivo que defende a autorregulação ... pelas big techs.
Lei das big techs é apresentada. Crédito-Freepik
Crédito: Freepik

As big Techs contam agora com um projeto de lei que protege seus interesses (e, claro, os bilhões dólares que monetizam diariamente). Foi apresentado hoje, 15, um projeto substitutivo ao PL 2630/20, o PL das Fake News. Para se contrapor a esse projeto, relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), o deputado Lafayette de Andrade (Republicanos), cria o “Sistema Brasileiro de Defesa da Liberdade de Expressão e Combate Integrado à Prática de Atos Ilegais na Internet” . Mas o que faz é manter com Big Techs, todas estrangeiras, o poder de decidir o que o internauta brasileiro pode ler em suas plataformas.

Isso porque, o PL, ao contrário do projeto original de Orlando Silva, deixa para essas empresas decidirem elas próprias  o que  deve ser transmitido, lido e, principalmente, monetizado na internet. Tudo como é hoje. O substitutivo, para não manter o status quo atual dessas megacorporações, propõe a criação de uma entidade privada, que fará a “autorregulação” dos procedimentos dessas grandes empresas (caracterizadas no substitutivo como aquelas que têm mais de 10 milhões de contas ativas).

E o deputado assim justifica essa proposição: ” Os poderes públicos ainda não estão preparados para exercer suas competências nas redes. Isso é notório. É um problema complexo e a solução é necessária, mas não virá do dia para a noite e nem pode ser alcançada simplesmente pela existência de uma lei. A pressa em combater a prática de atos ilegais na internet não justifica a imposição das funções públicas, indelegáveis, à iniciativa privada”. E alega ainda que o atual projeto das fakes news seria “inconstitucional”.

O que estamos falando

O PL das fake news busca responsabilizar as empresas que estimulam e disseminam a informação que gera pânico, que faz apologia à violência, que não se preocupa com as crianças. E estabelece um órgão de Estado para supervisionar essa questão.

A falta de responsabilização dessas plataformas na distribuição deste tipo de conteúdo deveu-se ao Marco Civil da Internet, que estabeleceu que esses provedores só podem retirar conteúdos do ar mediante decisão  judicial. Ora, esse mecanismo é obviamente tão lento, e limitado, que as próprias big Techs criaram, durante os momentos mais dramáticos (e são muitos exemplos), seus próprios códigos de conduta. Mas, quem fiscalizará o algorítimo? Elas próprias, como o fazem hoje? Por isso, a lei das big techs, ou das fake news, em debate.

Se no passado era possível  dar mais liberdade para essas empresas criarem um novo modelo de negócios – quem não se lembra que, no início, ficávamos encantados em poder nos comunicar com pessoas de todo o mundo? – , hoje não é  mais, e a criação de legislações que controlem as big techs está em debate em todo o globo.

E não são as ditaturas que defendem regulação pelo Poder Público, e sim as consolidadas democracias ocidentais, como Inglaterra, que acaba de passar essa atribuição para a Ofcom (que também é a agência que regula telecom). Os diferentes países europeus  já criaram diferentes leis para controlar essas empresas e ainda prometem mais.

Europa

A partir de 25 de agosto, deste ano, por exemplo,  as maiores plataformas online terão que dar aos usuários europeus mais
controle, fornecendo, inclusive, a informação sobre a razão de seus sistemas recomendarem determinado conteúdo. Foram criadas ainda barreiras para conteúdo gerado por inteligência artificial, como vídeos, deepfake e imagens sintéticas, que terão de ser claramente rotuladas quando aparecerem nos resultados de pesquisa, além de terem que evitar a “amplificação algorítimica da desinformação”.

Essas empresas não são mais aquelas que entram no mercado como disruptivas, para o “bem geral”. Não custa lembrar que o Google é monopolista  planetário, com mais de 90% do mercado global de buscas. Não custa lembrar que, no mês passado, o Twitter removeu integralmente de sua plataforma vários jornalistas que faziam críticas à nova gestão da empresa. Não custa lembrar que essas empresas, de tão poderosas, posicionaram-se abertamente contra o debate travado no Congresso Nacional, ou mesmo algumas ameaçaram deixar o Brasil, caso o 2030 fosse aprovado tal como proposto por Orlando Silva.

Agora, mudaram de tática, e vão trabalhar na defesa desse substitutivo. No texto apresentado pelo deputado Lafayette, que por sinal, é presidente da Frente Parlamentar Digital, frente essa financiada pelo “Instituto Cidadania Digital”, que é bancado pelas big techs, há até mesmo um reconhecimento de responsabilidade. Diz o caput do artigo 35 do substitutivo:

“Os provedores, considerando a ampliação do risco de danos ocasionada pela velocidade de disseminação de conteúdos e pelo
grande alcance da aplicação de internet, serão obrigados…” E segue uma lista de obrigações, que na verdade são apenas a produção de relatórios para serem notificados à entidade de “autorregulação”, que, por sinal surgiria a partir do Conselho Consultivo de Comunicação Social. Só consultivo.

Hoje, o relator do PL das fakes News, Orlando Silva, disse à nossa repórter, Carolina Cruz, que até já pensa em uma “autorregulação”. Mas, obviamente, ele não desiste de uma entidade Supervisora. E essa entidade supervisora não pode ser privada. Pois somente o Estado defende o interesse público.

Leia aqui a íntegra da proposta de Lei das big Techs:

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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