O imbróglio da intervenção do MCom na Anatel com mudanças em edital

A intervenção na Anatel, com alterações do edital de licitação do 5G, é avaliada como uma medida ainda mais grave do que o próprio decreto publicado ontem

intervenção edital Crédito: Freepik

A portaria publicada hoje, 03, pelo Ministério das Comunicações e que faz intervenção explícita na Anatel, com alterações do edital de licitação do 5G, é avaliada por diferentes fontes do mercado como uma medida ainda mais grave do que o próprio decreto publicado ontem. Isso porque o ministro Juscelino Filho, para colocar em escanteio o conselheiro Vicente Aquino, que de fato estava envolvido em ações bastante controvertidas com diferentes denúncias, mexeu em cláusulas editalícias que até hoje pareciam ser intocáveis. Regras de edital eram quase que cláusulas pétreas defendidas pelo governo, pelo sistema de controle (TCU, AGU, CGU) e pelo mercado.

Desmantelou-se a tese de que edital não pode ser alterado. Mesmo que na situação atual as alterações tenham sido feitas inicialmente para reordenar o Gape (Grupo de Acompanhamento do Custeio a Projetos de Conectividade de Escolas (Gape), responsável por mais de R$ 3,5 bilhões a serem aplicados na conexão das escolas, essa medida pode  chegar ao limite de provocar o questionamento a todas as regras do leilão do 5G. ” Uma empresa pode até mesmo alegar que não participou do último leilão devido as regras que foram agora alteradas e, no limite, pode questionar todo o processo”, pondera o ex-presidente da Anatel, Juarez Quadros.

Para ele, se havia questionamentos sobre a condução do programa, o mais sensato seria abrir até mesmo um processo de sindicância, para dar ampla defesa ao acusado das denúncias. “Mas o governo preferiu tirar  o sofá da sala, tornando a situação agora ainda mais instável”, lamentou.

Para outro interlocutor, a portaria de hoje acabou colocando a Anatel em uma posição institucional bastante difícil. Isso porque, assinala, embora tenham sido retiradas todas as competências da agência na elaboração e promoção do programa de conexão nas escolas, é a Anatel que assinou o contrato com as operadoras de celular que devem cumprir essas obrigações. “Como a Anatel vai fiscalizar o cumprimento das obrigações, se não tem mais decisão sobre elas?”, indaga.

TCU

Há quem argumente ainda que a norma afronta diretamente o Tribunal de Contas da União (TCU). Vale lembrar que o TCU agiu muito ativamente na elaboração desse edital, inclusive foi o próprio tribunal que construiu a proposta de canalização de recursos para a conexão das escolas com a venda da faixa de 26 GHz, que não estava na proposta original da Anatel.

Pois uma fonte lembra que o TCU, ao aprovar o Edital 5G, enfatizou a necessidade de garantir a autonomia técnica da Anatel e da Eace como elementos centrais para a execução dos compromissos de conectividade. Será que o tribunal vai agora se manifestar sobre essas alterações?

Hoje o presidente da agência, Carlos Baigorri, encontrou-se com o ministro Juscelino Filho. Por enquanto, continua “avaliando” a portaria, mas a agência já convocou uma “coletiva técnica” aos jornalistas para quinta-feira, dia 5, após a última reunião do Conselho Diretor do ano. Mas não se acredita em ruptura institucional ou em judicialização do processo.

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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