Acordo de roaming com Mercosul entra em ‘kit obstrução’ na Câmara
A oposição ao governo impediu a votação do acordo do Mercosul para o roaming internacional em sessão plenária da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira, 20. Mesmo se tratando de texto assinado durante o governo Bolsonaro, em 2019, a proposta entrou para um “kit obstrução” e não foi analisada.
A resolução determina que as prestadoras do Serviço Móvel Celular negociem entre si acordos de roaming internacional por meio dos quais os usuários de quaisquer dos Estados do Mercosul utilizem seus serviços móveis no território de outro Estado Parte, com qualidade não inferior ao prestado pela empresa na sua área de atuação. Já aprovado pelo bloco, ele precisa do aval do parlamento dos países-membros. A entrada em vigor é medida defendida pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
O deputado federal Kim Kataguiri (União-SP), autor do requerimento de obstrução, explicou em plenário que só votariam o acordo caso os parlamentares analisassem também um dos projetos de sua iniciativa, que aumenta a pena para os crimes de roubo e furto em geral. A proposta foi pautada, inclusive com emendas para incluir como agravante a subtração de cabos de telecomunicações, mas não tem consenso (saiba mais abaixo).
Presidindo a sessão na ausência do deputado Arthur Lira (PP-AL) que viajou para cumprir agenda na Assembleia Geral da ONU, o 1º vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira (Republicanos-SP), decidiu que colocaria em pauta apenas os temas sem divergências, e confirmou a intenção da base governista de barrar o projeto sobre furto e roubo.
“Esta Presidência informa aos deputados e deputadas que tomou a decisão de só votar nesta sessão projetos em que haja consenso. Em represália por não votarmos esse projeto em que há obstrução, estão também apresentando obstrução para os PDLs que tratam de acordos do Mercosul, o que é uma pena, porque o interesse é do país”, informou Pereira na sessão.
Acordo de roaming internacional
O Acordo para a Eliminação da Cobrança de Encargos de Roaming Internacional aos Usuários Finais do Mercosul é objeto do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 159/2022. O texto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados em abril deste ano e, desde então, aguarda deliberação no plenário. De lá pra cá, os deputados já aprovaram outros acordos do bloco que chegaram no Congresso em 2022 – de facilitação do comércio e de Proteção Mútua das Indicações Geográficas Originárias.
Quando a proposta de roaming foi aprovada na CCJ, a Anatel divulgou nota reforçando a importância do tema. A agência participou da construção no âmbito da Comissão Temática de Serviços Públicos de Telecomunicações do Subgrupo de Trabalho nº 1 “Comunicações” (SGT-1).
“A aprovação representa mais uma iniciativa que beneficiará diretamente a circulação de pessoas no âmbito dos países do bloco, uma vez que se prevê a cessação de cobranças adicionais de valores de usuários que estejam fora de seus países de origem, em viagem ao exterior em destinos do Mercosul”, afirmou a Anatel no comunicado.
A autarquia ressaltou ainda que “com a expectativa de uma futura implementação do Acordo, a Agência igualmente vem conduzindo processos de verificação de impacto e de necessidades de ajustes internos e de alinhamento entre os reguladores dos diferentes países”.
Furto e roubo
A proposta sobre roubo e furto citada por Kataguiri é o PL 3780/2023, que leva sua autoria em parceria com outros dois deputados, Marcos Pollon (PL/MS) e Delegado da Cunha (PP/SP). O texto teve a urgência aprovada antes mesmo de passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que terá relatório apreciado em plenário.
O parecer pronto para análise fixa a pena de reclusão de dois a seis anos para a furto (atualmente de um a quatro anos), bem como a pena de reclusão de seis a dez anos para roubo (ante os quatro a dez anos em vigor).
O texto original do projeto tratava apenas do furto e roubo em geral, mas os autores acataram emendas do setor de telecomunicações para combater os crimes que geram prejuízos na infraestrutura dos serviços.
Com isso, o substitutivo apresentado em plenário, do relator Alfredo Gaspar (União-AL), torna furto qualificado (com pena de três a oito anos) e também receptação qualificada (de dois a seis anos), os casos de “subtração de equipamento ou instalação que possa prejudicar o funcionamento de serviço de utilidade pública, como telecomunicações, energia elétrica, abastecimento de água, saúde e transporte público”.
A pena do furto aumenta para quatro a dez anos se ocorrer “mediante fraude” e “por meio de dispositivo eletrônico ou informático, conectado ou não à rede de computadores, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a utilização de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo”.
Para roubo, a reclusão pode aumentar um terço até metade em caso de equipamentos dos serviços de telecomunicações ou dispositivo eletrônico ou informático.
Impactos regulatórios
Ao contrário de outros projetos em tramitação no Congresso, o PL 3780/2023 não blinda as teles de eventuais sanções da Anatel por prejuízos na qualidade do serviço que sejam causados pelos crimes de roubo ou furto.
Em recente debate realizado no Congresso Nacional, especialistas defenderam que as medidas de combate ao roubo e furto de cabos de telecomunicações não devem se limitar ao aumento das penas. Além de incorporar os impactos regulatórios, deve levar em conta o modus operandi e o perfil do criminoso, incluindo medidas interministeriais, de iluminação pública e fiscalização do repasse de aparelhos roubados.