Ação da PGR contra direito de passagem ameaça elevar custo da 5G, diz Abrintel
A ação da PGR (Procuradoria-Geral da República) pedindo liminar para suspender o direito de passagem previsto no Artigo 12 da Lei Geral das Antenas vai na contramão das políticas públicas traçadas para o leilão da 5G. E se for acolhida pelo STF (Supremo Tribunal Federal), irá elevar o custo para a prestação do serviço.
É a avaliação traçada pelo engenheiro Luciano Stutz, especializado em regulação do setor, que é presidente desde março passado da Abrintel (Associação Brasileira de Infraestrutura para as Telecomunicações). Apresentado no início, o pedido da PGR ficou para ser apreciado, no início de agosto, após o fim do recesso do Judiciário.
“Esta medida vai contra as políticas públicas desenhadas para o 5G por conta dos compromissos de abrangência previstos no edital e vai atrapalhar a cobertura de estradas e distritos distantes”, afirmou em entrevista ao Tele.Síntese.
O executivo lamentou que a ação já tenha sustado a disposição do governo de editar finalmente o decreto de regulamentação da Lei Geral das Antenas (Lei 13.116/2015). Uma medida esperada há cinco anos principalmente para consolidar a gratuidade do direito de passagem em áreas públicas na instalação de infraestrutura de telecomunicações e o princípio do Silêncio Positivo.
Por conta disso, Stutz classificou como “estranho” o ajuizamento da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) pela PGR junto ao STF . Daí entende que é de “bom tom” ver como vai ficar o clima diante da possibilidade de nova oneração às empresas a favor de administrações públicas e das concessionárias de rodovias. Destacou que o decreto é revelante em razão da revogação de concessões de importantes rodovias no país, a exemplo da Presidente Dutra, entre São Paulo e Rio de Janeiro.
Seguem os principais trechos da entrevista:
Tele.Síntese: Qual é a sua avaliação, se a ação da PGR alcançar resultado favorável no STF?
Luciano Stutz: Nós vimos com muita preocupação. Já passamos por uma fase desse processo, que foi a negativa de concessão de liminar pelo plantão do STF.
Tudo foi discutido desde 2012 para termos uma Lei Geral de Antenas em 2015. E com tudo que estava previsto nela e, agora cinco anos depois a publicação da lei, a gente ter a PGR indo contra, falando que a lei é inconstitucional. Isso nos pareceu um tanto quanto estranho. Mas, se os argumentos da PGR forem aceitos pelo STF, a gente vai ter uma quebra da segurança jurídica muito forte no setor de telecomunicações.
[quote cite=’Luciano Stutz, presidente da Abrintel’ align=’right’]Como é que a gente faz cobertura incentivada na beira de estrada sem gratuidade do direito de passagem? É uma conversa a se ter novamente com o regulador.[/quote]Vamos lembrar que o edital do 5G, a consulta pública que saiu da Anatel, os compromissos de abrangências eram localidades afastadas dos distritos-sedes e cobertura na beira de estradas. Como é que a gente faz cobertura incentivada na beira de estrada sem gratuidade do direito de passagem? É uma conversa a se ter novamente com o regulador.
Se a gente entender que esse serviço é essencial e as empresas têm compromisso de abrangência, voltar agora cinco anos para tirar a gratuidade do direito de passagem é exatamente ir na contramão do que se espera do setor e dos investimentos previstos com o 5G. Esta medida vai contra as políticas públicas desenhadas para o 5G por conta dos compromissos de abrangência previstos no edital, e vai atrapalhar a cobertura de estradas e distritos distantes.
Tele.Síntese: Então, vai precisar ser refeito o edital do 5G?
Stutz: Ele não está pronto, é preciso bater o martelo. Mas pelo menos as premissas econômicas que foram feitas para aqueles compromissos de abrangência quanto ao preço da frequência, certamente vai ter que ser refeita a conta. É um risco maior. Quem faz essa conta é a Anatel e provavelmente considerou em suas contas essa lei, que garantia a gratuidade do direito de passagem dentro dos compromissos.
[quote cite=’Luciano Stutz, presidente da Abrintel’ align=’left’]Se precisar pagar por esse direito de passagem ao longo das rodovias, sejam elas concedidas ou não pelo poder público a entes autorizados, a conta do leilão terá que ser refeita porque a cobrança pelo direito de passagem vai recair sobre o custo do serviço.[/quote]Por exemplo, para cobrir uma cidade que fica a 60 km do distrito sede, cobrir o trecho de 10 km de uma rodovia, é preciso fazer 60 km de rede de transmissão. E isso se faz cavando o leito da rodovia e colocando fibra óptica, da maneira correta. Se precisar pagar por esse direito de passagem ao longo das rodovias, sejam elas concedidas ou não pelo poder público a entes autorizados, a conta do leilão terá que ser refeita porque a cobrança pelo direito de passagem vai recair sobre o custo do serviço.
Tele.Sintese: Essa pressão para mudar a lei é vinda de qual parte?
Stutz: A gente acha que pode ter sido incentivado por alguém, mas o que tem de pano de fundo para o surgimento dessa discussão é que o decreto regulamentador da Lei das Antenas estava sendo discutido, prestes a sair. Tanto no antigo MCTIC quanto no novo Ministério das Comunicações. Já estava tramitando na esfera da Casa Civil e do Executivo. às vésperas de sair, alguém lembrou-se de questionar a constitucionalidade da lei. O decreto pode sair mesmo com essa ADI no Supremo, mas acho que é de bom tom que se espere para ver como vai ficar o clima.
Tele.Síntese: Mas as decisões do Supremo costumam ser demoradas. Essa ADI cria uma paralisia nos investimentos do setor?
Stutz: Por isso que não estamos falando de decisão e sim da primeira análise. Acho que não paralisa o setor. A ação acende uma luz para a gente entender o que realmente se pensa. A lei está vigente, é válida. A lei federal e a gratuidade estão aí. Mas cria a dificuldade de edição do decreto.
Tele.Síntese: Com a Lei Geral das Antenas em vigor, como é hoje a ocupação das áreas públicas?
Stutz: Via de regra, se pede a autorização do ente público que administra aquela área e ele precisa dar a licença. Mas a maioria da rede de telecom está instalada em área não publica. O modelo de negócio é o aluguel do terreno ou sua compra para a construção da torre. As poucas áreas públicas que estão ocupadas com torres são feitas sem contrapartida. Sem ônus. Leito de rodovia e outras áreas públicas dadas em concessão, a gente está lutando para que o uso seja sem ônus para a prestadora de serviços e a detentora de infraestrutura.
[quote cite=’Luciano Stutz, presidente da Abrintel’ align=’right’]Agora muitas concessões de rodovia estão para vencer, inclusive da Presidente Dutra, que liga São Paulo ao Rio de Janeiro. É o momento oportuno para que este contrato seja desenhado com as previsões mais precisas que tratam do direito de passagem.[/quote]Este decreto está em elaboração há bastante tempo ainda no antigo MCTIC. O decreto vai trazer com mais clareza alguns dispositivos da lei. Como por exemplo, lá está dito que é sem ônus o uso das áreas públicas, mas não explicita o que é área pública. O direito de passagem e o leito de rodovia são questões muito discutidas. O decreto viria para pacificar essa discussão.
Hoje o DNIT [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes] mantém a política de cobrança do direito de passagem e sempre foi um ponto de muita discussão. Agora muitas concessões de rodovia estão para vencer, inclusive da Presidente Dutra, que liga São Paulo ao Rio de Janeiro. É o momento oportuno para que este contrato seja desenhado com as previsões mais precisas que tratam do direito de passagem. Para que a discussão não se estenda entre outorgados do Ministério das Comunicações com concessionárias de rodovia.