Surpreendidas, teles pedem para Anatel abrir diálogo sobre PGMU

As concessionárias de telefonia fixa acreditam que ainda há chance de se rediscutir as metas de universalização e os contratos de concessão, para evitar que os recursos continuem a ser gastos na telefonia fixa, um serviço que está prestes a acabar.

shutterstock_Lightspring_competicao_concorrencia_geral* Com Lia Ribeiro Dias

As concessionárias de telefonia foram surpreendidas com a decisão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, anunciada na última quinta-feira, dia 29, de que o governo havia decidido não mudar o Plano Geral de Metas de Universalização, mantendo as obrigações de investimento na telefonia fixa – e não alterando os atuais contratos de concessão. A Oi ingressou hoje, 4, com um pedido formal à Anatel para que o processo seja retomado. A Telefônica, por sua vez,  confiava em um acordo em torno da revisão do PGMU, quando foi surpreendida com o seu cancelamento.

Dirigentes das duas concessionárias afirmam que reconhecem que há um saldo monetário a favor do governo – e da sociedade – caso seja publicado o PGMU IV, pois serão reduzidas obrigações na telefonia fixa,  mas entendem que esse saldo é passível de questionamento, e que elas têm o direito de apresentar suas ponderações junto ao órgão regulador.

O nó górdio da disputa entre as empresas o regulador e o governo diz respeito à conta apresentada pela agência, no valor total de R$ 3,8 bilhões (imputada às cinco concessionárias) que as operadoras estariam devendo, porque esse PGMU iria retirar da planta de telefonia pelo menos 400 mil orelhões. Além de outras desonerações que ocorreram nos planos de universalização das revisões contratuais passadas ainda não cobradas.

“Concordamos que existe sim desoneração, com a proposta de redução de metas, e que esta desoneração é um crédito a favor do governo. Mas não podemos aceitar esse valor como um saldo, pois não foram apurados eventuais créditos a favor das concessionárias que já existam ou que venham a existir na vigência deste PGMU”, afirmou o CEO da Telefônica, Eduardo Navarro. A conta a ser paga pela Telefônica, conforme cálculos da Anatel, é de mais de R$ 600 milhões.

” A Oi não se negou a assinar os contratos. Mas não poderíamos assinar um documento com uma cláusula de aceitação e quitação irrevogável de um montante de R$ 2,8 bilhões. Em qualquer processo público, há o direito ao contraditório”, assinalou executivo da operadora.

Ele disse que a Oi também sabe que haverá um saldo, assim como ocorreu nas mudanças anteriores das revisões contratuais quinquenais, mas que o ideal seria primeiro a agência apresentar esse valor para depois as empresas, com conhecimento de causa, assinarem os contratos de concessão. ” Tomamos conhecimento do saldo no dia 12 de junho, e no dia 30 do mesmo mês teríamos que assinar os contratos.  Mesmo que concordássemos com o valor, não haveria tempo suficiente sequer para o tema ser levado à deliberação do conselho de administração da empresa”, pondera a fonte.

Para a Oi, o ideal seria o governo publicar o novo PGMU, já que os contratos de concessão não foram modificados, o que significa que também não contêm a nova cláusula que seria inserida pelo atual conselho diretor da Anatel, que determinava a aceitação do saldo calculado. Assim,  a Anatel reabriria o diálogo, para que as operadoras apresentem seus cálculos sobre o que haveria de saldo.

Investimento no velho

Para analistas do mercado, o certo é que essa decisão implica manter investimentos em uma rede velha, em um serviço ultrapassado. “Não há dois dinheiros. Se as empresas ficam obrigadas a continuar a investir em telefone fixo e orelhão, o dinheiro que vai sobrar para a banda larga é menor”, afirma a fonte.

Advogados avaliam também que, por exemplo, a recente decisão da Anatel, em favor da TIM sobre a remuneração da EILD irá gerar um vultoso crédito a favor da Oi no financiamento da concessão.

Para a Telefônica, há ainda uma questão conceitual, da qual não abre mão, que é o fato de os contratos preverem a possibilidade de reversão quando há o desequilíbrio econômico-financeiro, o que, no caso das concessões de telefonia, conforme os próprios números da Anatel,  já estaria  comprometido.

Mas há também questões mais singelas que poderiam ter sido resolvidas de outra forma, como, por exemplo, a data de aplicação do plano. “Estamos já no meio de 2017, e a Anatel queria calcular o valor da desoneração a partir de janeiro de 2015. Isso não é razoável”, comenta Navarro.

Fontes assinalam ainda que, se há mesmo insustentabilidade ou desequilíbrio econômico-financeiro, o regulador poderia, por exemplo, enquanto não é aprovado o PLC 79, que autoriza os investimentos das concessionárias para a banda larga, direcionar parte desse saldo para a própria sustentabilidade da concessão.

A Anatel

A Anatel, por sua vez, está convencida de que a sua conta está correta. “Os números já foram auditados”, afirma o conselheiro Igor de Freitas. E assinala que não dá para jogar a culpa na agência  se o PGMU não foi renovado. A decisão de pedir para adiar a publicação das novas metas de universalização foi aprovada por unanimidade pelo conselho da Anatel, e referendada pelo ministro Gilberto Kassab.

“Não podem jogar a culpa na Anatel por isso. Estamos alertando há meses sobre a necessidade de se inverter a lógica dos investimentos, para que sejam aplicados em banda larga”, afirmou Freitas. Ele assinala, no entanto, que não pode ser confundido o conceito do equilíbrio econômico-financeiro com o da  sustentabilidade da concessão ou das concessionárias.

“O equilíbrio econômico-financeiro não está vinculado à margem, ao lucro, ao nível de receita ou ao caixa das concessionárias. Já há jurisprudência formada na Anatel e no TCU de que o equilíbrio econômico-financeiro se mantém com a preservação dos direitos e deveres originalmente pactuados”, afirmou Freitas.

Ele ressaltou que um único fator é admitido pela Anatel para afetar a sustentabilidade da concessão – e não da concessionária -, quando um fenômeno exógeno pode influenciar a sua continuidade. Nesse caso, ele observa que esse fenômeno já chegou.É o desinteresse da população pelo telefone fixo. “Nesse caso, é possível sugerir medidas para acabar com essa insustentabilidade, mas isso não tem nenhuma ligação com metas de universalização, saldos ou equilíbrio econômico-financeiro contratual”, afirmou.

 

 

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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