TCU reforça demanda por regulamentação da TVRO e do streaming

Levantamento do órgão também aponta a necessidade de mitigação de riscos na implementação TV 3.0 e o enfrentamento do “tratamento não igualitário” na emissão de outorgas.
TCU reforça demanda por regulamentação da TVRO e do streaming | Foto: Freepik
Migração da TVRO faz parte da implementação do 5G | Foto: Freepik

O Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu levantamento a respeito da política pública de radiodifusão, que resultou no apontamento de uma série de fragilidades. O acórdão foi aprovado na reunião plenária de quarta-feira, 1º, e divulgado nesta semana. 

Em síntese, a Corte, sob relatoria do ministro Augusto Nardes, identificou “riscos associados à legislação obsoleta, dispersa e fragmentada, não regulamentação de dispositivos constitucionais e serviços não regulamentados; a não regulamentação da TVRO; às políticas ligadas ao rádio; ligadas ao processo de digitalização e ao desligamento do sinal analógico da televisão terrestre; à venda de 100% da programação de radiodifusoras; e ligados ao processo de convergência tecnológica e concorrência da radiodifusão com outras tecnologias”.

Parte das questões já vem sendo tratada pelo Ministério das Comunicações (MCom), que lançou dois pacotes de normas para radiodifusão neste ano, que inclui a consolidação e modernização das normas, além da simplificação dos processos. 

O levantamento do TCU buscou conhecer os obstáculos para o alcance dos objetivos da política pública de radiodifusão brasileira, para subsidiar a fiscalização e o acompanhamento das ações.

TVRO

O TCU reforçou a observação já realizada em 2021 da falta de regulamentação do serviço de transmissão da TV aberta por satélite, a TVRO, para o qual há migração em trâmite em decorrência das medidas de limpeza de faixa para implementação do 5G. À época, a pasta afirmou que não haveria necessidade de tal normatização, no entanto, a Corte e as emissoras seguem com a demanda

Questionado pelo TCU, o MCom afirmou que há uma “proposta em estudo” para a regulamentação da TVRO, conforme o ministro Juscelino Filho já havia anunciado em agendas com o setor de radiodifusão neste ano.  

Streaming

O levantamento observa que o streaming, embora não seja serviço de radiodifusão, precisa de uma regulamentação para enfrentar questões concorrenciais e assimetrias. “Primeiramente, a radiodifusão é definida como a transmissão de informação por meios sonoros e audiovisuais. No entanto, há diversos outros serviços que têm a mesma função, mas que, por utilizarem tecnologias diferentes, são classificadas como serviços de telecomunicações ou serviços de aplicação de internet”, contextualiza o relatório. 

“Ou seja, há uma concorrência entre a radiodifusão e outros serviços que, juridicamente, ficam fora de seu escopo. Sem a visão do setor como um todo, cada parte é regulada separadamente e, com isso, essa concorrência não é tratada adequadamente. A situação também afeta a formulação de políticas públicas. Sem uma visão ampla, existe o risco de que haja ineficiência e inefetividade”, acrescenta o acórdão. 

TV 3.0

O estudo cita a TV 3.0 como “oportunidade para revitalizar a radiodifusão”. No entanto, chama atenção para o “risco quanto à escassez de espectro” e a necessidade das diretrizes de implementação garantirem “a distribuição e monetização de conteúdo”. 

“Caso o cenário não seja avaliado como um todo, existe o risco de ineficiência da mudança de tecnologia, resultando em poucas alterações significativas para os radiodifusores e telespectadores. Se não forem tomadas medidas adequadas, a transição para a TV 3.0 pode ser problemática. Os radiodifusores podem enfrentar dificuldades na adaptação aos novos modelos de negócios e na concorrência com serviços digitais já estabelecidos”, alerta o TCU

Em recente portaria, o MCom estabelece que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) garanta a destinação primária e exclusiva, ao serviço de radiodifusão de sons e imagens e ao serviço de retransmissão de televisão, das faixas de VHF alto (174-216 MHz) e UHF (470-608 MHz e 614-698 MHz), para o desenvolvimento da TV 3.0, além de “observar a eventual necessidade de disponibilização de faixas adicionais”. 

A TV 3.0 também teve algumas diretrizes fixadas em decreto publicado em abril deste ano, com a exigência de aspectos como qualidade audiovisual superior à da primeira geração da TV Digital; recepção fixa, com antena externa e interna, e móvel; integração entre conteúdo transmitido pelo serviço de radiodifusão e pela internet, entre outros.

Governança

Sobre os riscos associados aos elementos da governança pública, o levantamento concluiu que “tem-se a falta de uma política pública institucionalizada de médio e longo prazo”. 

“Embora seja competência do MCom formular a política nacional de radiodifusão, a pasta informou que não existe um planejamento sistematizado. Com isso, há dificuldades na definição de objetivos, metas, indicadores, prazos e as respectivas fontes de recursos para implementação das ações que visam a atender as demandas do setor”, diz trecho. 

Isonomia nas outorgas

Quanto aos processos de outorgas em geral, o TCU conclui que “há riscos de tratamento não isonômico e ausência de impessoalidade na tramitação dos processos de outorgas; de falta de coordenação e coerência dos atores envolvidos no processo de outorga e renovação de outorgas de radiodifusão; e de insuficiência de transparência ativa, accountability e de prestação de contas sobre as outorgas firmadas”. 

Associado aos processos de renovações das outorgas, há risco de radiodifusoras com funcionamento irregular; de descumprimento de obrigações contratuais e normativas das outorgas; e de renovações sucessivas e sem critérios claros. Em relação ao acompanhamento dos serviços após a concessão da outorga, há riscos de descumprimento da finalidade das outorgas e das obrigações das outorgadas em decorrência de ineficiência e inefetividade de instrumentos de monitoramento; e de ineficiência das ações de fiscalização ativa”, aponta o TCU.

A Corte também observou que houve um aumento acima de 100% das retransmissoras nos últimos 10 anos e alertou que “a adoção dessa política, desassociada de um plano de médio e longo prazo bem estabelecido, não parece ser a melhor alternativa para atendimento ao interesse público e à finalidade dos serviços de radiodifusão [..] Isso porque as retransmissoras normalmente apenas repassam conteúdos de outras geradoras, com limitações à produção de novos conteúdos, que poderiam promover a diversidade”, além da falta de transparência.

Rádios comunitárias

O relatório faz uma analogia entre como o Estado lida com as rádios comunitárias e com os pequenos provedores de internet. A conclusão é de que “as rádios comunitárias poderiam ocupar papel central como fonte de informações, para que população possa se informar sobre o que acontece na sua região, cidade, bairro ou vila”. Entretanto, “o critério de escolha de localidades para novos editais e PNO é a manifestação de interesse”. 

“Porém, a ausência de tratamento diferenciado para pequenos radiodifusores, tal como ocorre em telecomunicações para pequenos provedores de acesso à internet, pode resultar em poucas manifestações de interesse, especialmente onde não existe nenhum radiodifusor local, uma vez que uma rádio local pode estimular a manifestação de interesse em outros bairros da região”, consta na análise. 

Conforme o relator, em conclusão ao estudo, “espera-se que as informações resultantes do presente Levantamento subsidiem o desenvolvimento de futuros trabalhos do TCU na área de políticas públicas do setor, conforme as prioridades expostas, bem como que a explicitação dos riscos contribua com as unidades jurisdicionadas, para a realização de medidas tendentes a mitigá-los, com vistas ao aumento da eficácia e da efetividade das ações do Poder Executivo em políticas públicas de radiodifusão”.

Acesse a íntegra do acórdão neste link

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura de telecom nos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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