Sem recurso não reembolsável, produção científica com dinheiro do Funttel despenca
Um levantamento feito pelo Ministério das Comunicações ao qual o Tele.Síntese teve acesso mostra o forte impacto negativo da decisão do governo em cortar o financiamento não reembolsável de pesquisas técnico-científicas em telecomunicações baseadas em recursos do Funttel, em 2019.
Conforme o material, a produção de pesquisas passou de 251 em 2018, para apenas 52 em 2019. O número reflete, é verdade, um momento atípico, pois em 2018 e 2017 houve o fomento do Centro de Referência em Radiocomunicações (CRR) do Inatel (Instituto Nacional de Telecomunicações), que recebeu R$ 20 milhões à época, o que fez com que naquele ano fossem registradas 251 pesquisas.
Mas, comparando com 2016 ou anos anteriores, vê-se igualmente um tombo de grandes proporções. Em 2016, por exemplo, o setor produziu 131 estudos. Ou seja, em 2019, a produção técnico-científica em benefício das telecomunicações, caiu a menos da metade da média dos anos anteriores.
Essa produção acumulada vinha em curva ascendente desde 2011, pelo menos, e apresenta inflexão justamente em 2019, como mostra o gráfico do levantamento interno feito pelo MCom.
“O maior ofensor à diminuição de desempenho do Fundo foi a redução na aplicação de recursos não reembolsáveis”, traz outro relatório sobre 2019, contendo uma análise do desempenho da política pública.
Reflexo em patentes
Outra indicação do problema ao desenvolvimento da inovação no setor pela retenção dos recursos do Funttel está na quantidade de patentes resultantes dos projetos financiados. 2019 foi o ano com menor número de propriedade intelectual gerada a partir das pesquisas financiadas pelo fundo desde, pelo menos, 2011.
Conforme o relatório do MCom, foram 27 pedidos depositados em 2019, contra 141 em 2014, pico da produção local. Os dados indicam forte retrocesso, com volta dos índices aos patamares da década em que o fundo foi criado.
O relatório indica que houve redução dos investimentos embora o resultado positivo dos aportes para o país seja evidente. “O faturamento de ‘produtos Funttel’ até 2019 foi de R$ 6,28 bilhões, o que reflete o acerto da política de apoio a soluções com foco na indústria”, resume o material. Naquele ano, cada real alocado em projetos do Funttel gerou um faturamento médio de R$ 7,77.
O levantamento interno da Pasta conclui que a diminuição dos recursos não reembolsáveis afeta, principalmente, a pesquisa aplicada.
O documento alerta para o processo de modernização normativa e da estrutura de governança do Funttel, planejado pelo governo. “A atual cesta de Indicadores representa bem as fases do desenvolvimento tecnológico, ao abordar desde a geração do conhecimento até o impacto dos investimentos no Setor”.
Questão bilionária e sensível
Em 2019, o fundo arrecadou junto às operadoras de telecomunicações R$ 491 milhões. Havia dotação para aportes a fundo perdido de R$ 204 milhões. Mas apenas R$ 16,8 milhões foram efetivamente gastos. Em 2020, a dotação inicial para investimento não reembolsável foi cortada para R$ 18 milhões, montante que foi quase todo aplicado.
Para este ano de 2021, a dotação a fundo perdido é de R$ 26,6 milhões. Até maio, arrecadou-se R$ 195 milhões. Nenhum aporte aparece nas tabelas do ministério, ainda.
Desde sua criação, o Funttel coletou R$ 8,5 bilhões das teles, e devolveu R$ 5,2 bilhões em financiamento a pesquisa e desenvolvimento.
Para o setor, a volta de aplicação de recursos não reembolsáveis é fundamental para o Brasil ampliar sua produção científica e depósitos de patentes no futuro próximo. Como deixaram evidente representantes das empresas na última reunião do GT OpenRAN da Anatel, na quarta, 16, a modalidade de aplicação a fundo perdido é utilizada em larga escala nos países com política de desenvolvimento tecnológico e industrial.
Na reunião, representantes da Anatel que integram o conselho gestor do Funttel sinalizaram dificuldades em obter recursos não reembolsáveis para pesquisa de redes abertas, e afirmaram que o mais provável é que o atual conselho gestor do fundo viabilize financiamentos reembolsáveis. O que – ressaltaram empresas e centros de desenvolvimento -, é insuficiente.