Órgãos convergem sobre falta de diagnóstico para fair share

Aliança pela Internet Aberta reúne opiniões convergentes do setor público e privado que questionam se implementar uma taxa de rede seria o melhor caminho.
Dilema sobre taxar big techs protagoniza debate promovido pela AIA | Foto: Reprodução
Dilema sobre taxar big techs protagoniza debate promovido pela AIA, em Brasília | Foto: Reprodução

A Aliança pela Internet Aberta (AIA) – associação de empresas de comunicação, tecnologia e conectividade contrárias à taxa de rede, ou fair share – reuniu nesta quarta-feira, 13, representantes do setor público e privado para discutir impactos de eventual cobrança das big techs que vá diretamente para as teles no intuito de custear a infraestrutura demandada pelos serviços digitais. O dia de debates mostrou pontos comuns entre diferentes órgãos contra o interesse das operadoras. 

A Coordenadora-Geral de Comunicações da Secretaria de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Mariana Piccoli, reforçou o posicionamento da pasta sobre o tema, principalmente contra a visão de que as teles não teriam condições de arcar com as mudanças no mercado digital, em que plataformas absorveram serviços antes prestados por elas – a exemplo de aplicativos para mensagem e serviços de streaming. 

“O entendimento da secretaria foi justamente no sentido de que a mera mudança entre o desempenho financeiro econômico entre diferentes setores não gera, por si só, um nexo de causalidade que justifique esse tipo de medida compensatória de um setor para o outro”, disse Piccoli.

Para a coordenadora,  “economicamente, vender internet ainda está valendo a pena no país” no sentido de que “ainda está sendo rentável”. “Não existe nenhuma indicação, nenhum sinal, de que os atores desse mercado não sejam capazes de manter a sustentabilidade do setor”, afirmou.

Piccoli ressalta que a visão é de que o setor funciona como um “ciclo” em que plataformas competem por conteúdo, que gera mais demanda de rede, e tal demanda retornaria em receitas suficientes para as operadoras. 

“No momento, uma intervenção estatal desse calibre que se discute [fair share] –  que não seria só a imposição de novos deveres e obrigações, mas também uma contribuição de cunho pecuniário de um setor para o outro –  poderia gerar subsídios cruzados artificiais, que não evidenciam qual seria o benefício sistêmico que derivaria dessa medida”, argumentou.

A coordenadora resume que o posicionamento se traduz em: “agora, não”. “Por isso que nos manifestamos não no sentido de que a intervenção estatal não possa ocorrer neste mercado, mas que, até agora, não temos evidências significativas de que precisa de uma intervenção desse tipo no mercado”.

Anatel

No mesmo sentido, o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações, Carlos Baigorri, reforçou o entendimento de que “a relação é muito mais simbiótica do que competitiva”.

“Ninguém vai comprar acesso à internet, se não tiver aplicações que justifiquem essa demanda. E ninguém vai comprar aplicações se não tiver internet para ter acesso a elas. Então, é uma relação simbiótica”, detalhou o chefe da autarquia.

Baigorri ressalta que o momento é de diagnóstico. “A taxa de rede é muito importada da discussão que teve na Europa. Mas isso já é a ‘suposta’ solução de um problema que ainda precisa ser definido e desenhado”, disse. 

Por outro lado, reforça que há, sim, “algo” a ser analisado. “O que a gente não pode fazer é dizer que não existe um problema, que não existe nada, e bloquear o debate”, disse.

Um dos pontos apontados por Baigorri como oportunidade de “qualificar” o debate é mais transparência sobre as políticas dos CDNs (redes de servidores), que as empresas de tecnologia alegam que são a parte delas de colaboração para a infraestrutura. 

“Quando você fala de cooperação de melhores práticas, [significa] garantir que todos os agentes tenham políticas de CDN adequadas, porque não temos visibilidade sobre quais são”, cobrou o conselheiro. 

MDIC

A secretária de Competitividade e Política Regulatória do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Andrea Macera, que preside o comitê de acompanhamento de boas práticas regulatórias, também repetiu a premissa de entender o problema regulatório primeiro. 

“Para tratar dessa questão da cobrança das redes, se for uma medida regulatória, você tem que pensar qual é a falha de mercado que essa regulação visa endereçar. E se for uma política pública [considerando a ideia aventada sobre fundo setorial], qual é o problema público que essa política visa endereçar?”, defendeu. 

AIA

O presidente executivo da AIA, Alessandro Molon, argumentou que as plataformas estão dispostas a dialogar sobre alternativas. 

“São muitos os caminhos para melhorar a nossa internet. O que a gente tem certeza é que a taxa de rede não é uma boa ideia. […] Estamos dizendo [que] esse caminho é um mau caminho, porque onde ele foi testado,  não funcionou. Queremos copiar boas ideias, não más ideias, mas estamos abertos para o diálogo, para pensar outras coisas que podem ser feitas para melhorar a convivência e o diálogo”, concluiu.

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura de telecom nos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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