Nova, do Paraná, compra um ISP por mês e se prepara para abrir o capital

Agnaldo Bastos Lopes, CEO da Nova, antecipa os planos do grupo paranaense, fala do leilão 5G, da competição local, avisa que prepara emissão de debêntures para seguir comprando e ressalta que está no negócio de tecnologia: "não somos empresa de conexão".

Nos últimos 12 meses a operadora regional Nova Fibra Telecom comprou outros 12 ISPs. Nem todos os negócios são ainda públicos, mas o o CEO da empresa, Agnaldo Bastos Lopes, revelou ao Tele.Síntese o nome de nove provedores que passaram a fazer parte do grupo: Portal Medianeira, da cidade de Medianeira; Pallu Telecom, de Campo Largo; Air Live, de São José dos Pinhais; Senior PC, de Jacarezinho; Caiobá Telecom, de Paranaguá e Matinhos; Live Telecom, de Foz do Iguaçu; Egtech, de São José dos Pinhais; One Fibra, de Ponta Grossa; e Oba, de Fazenda Rio Grande.

Criada em 2014, a Nova é um braço de internet do grupo ABL, empresa de tecnologia paranaense. O grupo adquiriu no final de 2020 a antiga sede da GVT, talvez o caso mais bem sucedido de consolidação de um provedor de internet no país, vendido por mais de 7 bilhões de euros à Telefônica no mesmo ano em que a Nova era fundada.

Lopes, o CEO da Nova, afirma que a empresa tem um plano de 10 anos que é seguido à risca e inclui expansão tanto orgânica quanto inorgânica. Concluídas as 12 aquisições recentes, deve terminar 2021 com o dobro de clientes e rede óptica instalada. Atualmente, a empresa tem presença em uma área com 560 mil assinantes de banda larga e é a segunda em market share nessa região, atrás apenas da Oi, e à frente da Vivo (antiga GVT).

A empresa prepara a emissão de debêntures incentivados neste ano para seguir expandindo e quer abrir o capital na bolsa em 2023, a depender do apetite do mercado. Confira, abaixo, entrevista que fizemos por videoconferência com o CEO do grupo ABL e da Nova, Agnaldo Lopes.

Tele.Síntese – Qual a história da Nova?
Agnaldo Bastos Lopes, CEO da Nova – A Nova nasceu no final de 2014 dentro do grupo ABL, empresa com 21 anos no mercado com foco em tecnologia. O grupo ABL tem fábrica de software, desenvolve ferramentas voltadas para a área financeira, atendemos bancos no modelo white label. Temos um braço de contact center onde atendemos operações de urgência e emergência.

Outro braço nosso é a área de meios de pagamento e correspondente bancário. Temos tecnologia voltada para esse modelo. Somos correspondentes do Banco do Brasil há mais de 13 anos. Esse nosso braço financeiro atua com todas as bandeiras e adquirências. Fundei em 2000 a empresa. Chegamos aqui sem capital de fora nesses 20 anos.

A Nova entrou no projeto em 2014 para 2015. Começamos desenvolvendo equipamentos de TV digital terrestre. Criamos um set top box, mas no meio do caminho mudamos a estratégia para desenvolvimento de um produto de TV IP para TV paga. Fizemos testes com um pequeno provedor, a G1 Telecom, da cidade de Jacarezinho (PR), e então passamos a investir no negócio desse provedor. Nossa entrada foi por aí. E foi onde construímos nosso projeto, já pautado para 2025. Um projeto de 10 anos. Nesse projeto está previsto ser uma companhia com atuação nacional.

Então vocês começaram com a ideia de explorar a TV paga, diferente de outros provedores que começam pela banda larga?
Lopes – Isso. Depois buscamos desenvolver nossa própria plataforma ERP para atender as demandas e especificações de negócio para o futuro. Queríamos um ERP voltado para atender milhares ou centenas de milhares de usuários voltados a esse modelo.

Mas nascemos voltados não para quantidade, mas para a qualidade do domicílio. Nosso tíquete médio era R$ 169 até 2020 – de julho de 2020 para cá, fizemos mais de 12 aquisições, então caiu um pouco, para R$ 129 reais. Dessas aquisições, nove já concluímos. Temos que concluir a migração de todos até dezembro de 2021. Temos clientes que ainda nem consideramos dentro da carteira.

Até julho de 2020 estávamos com 50 mil usuários. Em dezembro teremos 130 mil usuários. Mas repito que não significa que estamos atrás de quantidade de contratos. O modelo que temos definido para o negócio é outro, não somos uma empresa de conexão.

Não são?
Lopes – Estamos na corrida de definir o melhor produto para o domicílio. A gente enxerga o domicílio com inúmeras oportunidades. O grupo tem a oferecer meios de pagamento, atendimento, o que eleva a quantidade de contratos dentro de um domicílio. E assim a gente consegue elevar o tíquete médio. Por exemplo, vamos trabalhar em breve com auto-monitoramento residencial. O monitoramento, o nosso alarme, demanda conectividade.

E qual o tamanho da rede da Nova atualmente?
Lopes – Até julho tínhamos 6 mil km de rede. Ao finalizarmos as aquisições, teremos 12,8 mil km. Temos algo em torno de 3% da operação em rádio, mas esses rádios estão vinculados a operações rurais – atuamos no Mato Grosso além do Paraná, onde ainda utilizam muito o rádio. Quando vem uma aquisição, sempre vem com algo de rádio, e aí começamos o processo migração para fibra.

Vocês falam no objetivo de ter alto tíquete com cliente residencial, oferecendo uma gama de serviços que exigem conexão rápida com a internet. E no B2B, não faz sentido também?
Lopes – Sim, o B2B é um dos braços da Nova. Quando falamos de B2C, falamos de pulverização. Já no B2B, temos mais de 3,4 mil clientes. O principal produto do nosso braço corporativo é nossa cloud, fazemos hiperconvergência, vendemos firewall de ultima geração da Palo Alto – coisa comum só em empresas de maior porte. E dentro da cloud temos grandes players multinacionais e bancos. Fazemos assim uma operação conjunta, da fibra com processamento e armazenamento de dados.

Vocês têm um data center próprio?
Lopes – Temos em Curitiba. Um data center principal e um data center redundante. Compramos em dezembro o antigo prédio da GVT e agora a gente inicia a migração do redundante para lá. Somos o único data center com rede de energia própria na cidade. Temos redundância quando se fala de meios de pagamento e PCI em outros data centers nacionais. É um modelo mais amplo e que integra o B2B e o B2C. Para PMEs também temos produtos, vendemos PABX virtual, telefonia, nuvem, backup.

Vocês começaram com IPTV, mas desistiram no meio do caminho?
Lopes – O IPTV hoje é muito secundário.

E todos os 12 ISPs que vocês compraram vão acessar essa infraestrutura? Quando?
Lopes – Vão, quando for concluída a migração do ERP. O nosso ERP permite a operação desses novos serviços.

Vocês trabalham com white label em mercado de pagamento. Não podem fazer o mesmo com o ERP? Não pensam em vender isso para uso por outros provedores brasileiros, já que temos milhares deles?
Lopes – Em 2021, agora no 2º semestre, o grupo ABL vai passar a fornecer o ERP para terceiros, além dos serviços de meios de pagamento, plataforma omnichannel e rede de atendimento que não estejam na área de atuação da Nova. Nosso ERP, por ter sido construído numa base de empresa de lucro real, com governança, gestão apurada, vai permitir que outros ISPs passem a profissionalizar a operação.

Hoje nossas lojas são agências bancárias, no sentido de ter autoatendimento com totens. Quando o cliente entra na loja, é para fazer negócio. E nosso contact center, com o omnichannel, passa a oferecer a operação de forma diferenciada. Hoje o cliente paga a fatura no nosso 0800 eletronicamente. Nos meios de pagamento, 100% da rede de atendimento é executada através da nossa plataforma. Temos maquininha de POS também.

Acho impressionante que vocês tenham desenvolvido tantas frentes sem nenhum aporte de terceiros…
Lopes – Até julho de 2020, não tínhamos ido para o mercado financeiro para fazer nenhuma captação e recursos. Tudo foi feito com recursos próprios. A partir de julho, fizemos uma captação pequena para entender como isso funcionaria para ver o payback da operação para a empresa ou para investidores, se teria interesse. Entendemos o modelo de negócio, e desde o início do ano, começamos o primeiro estudo para fazer uma emissão de debêntures incentivadas. Somos assessorados pelo Itaú BBA. A gente iniciou o trabalho nesse ano. Até novembro, esperamos ter o processo de emissão dessas debêntures concluído.

Quanto dinheiro pretendem levantar?
Lopes – Queremos emitir R$ 200 milhões em debêntures incentivadas. A gente vai investir o dinheiro a partir de 2022 nas aquisições e na nossa rede. De 2022 a 2023 vamos expandir a operação no Paraná e no Mato Grosso. Já operamos no Mato Grosso há quatro anos, em três cidades.

Então vocês querem continuar comprando ISPs? Quais os critérios dessa expansão por aquisição?
Lopes – O primeiro critério é avaliar a quantidade de players no mercado. O segundo é qualidade desses players. Se você já tem players operando com qualidade satisfatória, é natural que um cliente da base dele não tenha predisposição de mudança. E o 3º critério é estar próximo da nossa rede.

O mercado de telecom, em especial dos ISPs, está passando por uma onda de consolidação e aberturas de capital na Bolsa. Vocês estão comprando, mas não receberam proposta de serem comprados por ninguém maior ou um fundo?
Lopes – Nós já recebemos algumas propostas de aquisição, mas temos um planejamento sólido e que está sendo executado fielmente. Enquanto esse plano está em andamento, a gente sempre senta para conversar. Mas ainda não entendemos que estamos preparados para esse novo passo.

Ainda cabe captação, endividamento, porque na operação hoje estamos falando de dívida de 0,4% do EBITDA, ou seja, é quase nulo. Cabe esse passo para depois sentarmos com os players e se discuta uma fusão. Não necessariamente tem que ter fusão, pode ter parceria estratégica também.

Vocês são do Paraná, terra da Sercomtel e da Copel que tem ampla presença e que está agora capitalizada pelo Fundo Bordeaux. Esperam algum ataque desse concorrente, ou mesmo de outros, que atrapalhe seus planos?
Lopes – Entendemos que o Bordeaux vai ser muito agressivo. Vai ser o que no passado, bem no início, era a Copel. A agressividade, até por ter capital externo, muda o cenário. Por isso nós temos bem mapeadas a nossa operação e a deles. Ainda temos um tempo para consolidar a operação local e fazer uma blindagem. Além disso, a nossa operação não se sobrepõe a nenhum outro player, não somos um concorrente direto. Temos um ano de trabalho aí para enfrentar essa concorrência dentro de um fair play. Trato como fair play estratégias que não destroem o valor do produto.

Quem mais vocês observam para se precaver?
Lopes – Temos a EB Capital, a Unifique, a Vero que entrou pelo Sudoeste do Paraná, a própria Oi com o investimento bilionário também vai trazer competição. Mas penso que se fosse um ou dois concorrentes apenas, seria ruim. Quando é briga de quatro ou cinco, nunca se escolhe o oponente principal. Escolhe-se o mercado de atuação. Vai ser uma concorrência saudável. Entendemos que a Unifique é um player grande e agressivo, EB, Bordeaux, mas temos um grande diferencial, a gente não quer conectar o cliente por conectar, queremos entregar valor de serviços que os outros não terão. E essa vai ser nossa diferença. Nosso cliente sairá da base se não estiver satisfeito com nossa internet, mas se mantivermos o padrão, vamos ser um player forte.

Qual a receita anual de vocês?
Lopes – Vamos faturar R$ 168 milhões em 2021 e prevemos um EBITDA de R$ 63 milhões. Teremos mais que o dobro dos clientes ao fim do ano: serão de 125 mil a 130 mil clientes.

Você mencionou a Oi, acho que vale lembrar da Infraco e outras redes neutras. A Nova quer contratar essas redes para crescer?
Lopes – Sim. Temos dois grandes projetos com rede neutra, para iniciar no começo de 2022. Não só quanto à contratação, mas também como utilização da nossa. Estamos há 8 meses desenhando esse modelo.

E o leilão 5G? Saíram estimativas de preços e compromissos. Interessou para vocês?
Lopes – Estamos bem cautelosos quanto ao leilão do 5G. Não estamos em nenhum grupo ou consórcio. Optamos por não entrar em nenhum grupo. Estamos cautelosos quanto ao formato do leilão. As obrigações são muito grandes, o pós leilão é pesado. Não descartamos entrar, mas entendemos que os compromissos de uma outorga dessa são muito grandes. Vide a telefonia fixa da década de 1990, o endividamento da Sercomtel. A gente teve experiência com rede LTE, e essa experiência… temos ainda algumas outorgas, mas as temos porque ficou caro devolver. Devolvemos uma parte, no entanto.

As grandes operadoras que comprarem espectro podem usar o 5G para entrar com facilidade nos mercados onde vocês estão?
Lopes – No médio prazo, não vemos o risco de as grandes operadoras entrarem em mercados usando o 5G porque é um investimento caro. A nossa operação está consolidada na borda, no interior. E as grandes procuram manter a base nos grandes centros, nas capitais nesse médio prazo. Até chegar lá na borda, a gente já tem um modelo consolidado, o custo médio de uma operação de internet vai ser menor, e o do 5G será maior, e poderemos disputar esse mercado. Continua sendo um risco, mas não vai chegar com a agressividade que terá nos grandes centros.

E os outros ISPs que cresceram com aquisições e investimentos próprios, como vocês, e hoje estão entrando na Bolsa. São um modelo a ser seguido?
Lopes – IPO está no nosso projeto para 2023. Nosso plano empresarial tem cinco fases, e a última fase é o IPO. Só que entendemos que o IPO é a fotografia do momento. 2023 será período pós eleição, será preciso entender como estará a cabeça do investidor nesse cenário.

Nosso plano é pautado por faturamento. Pretendemos ter 200 a 300 mil usuários em 2023 com faturamento de R$ 600 milhões. Nossa estratégia para IPO é entregar rentabilidade. Ficamos felizes vendo os IPOs da Desktop e da Unifique. Eles tendo sucesso, demonstra que estamos no mercado correto.

Estamos preparados, temos um antídoto para eventual competição com eles e tentar um contraponto de equilíbrio. Além disso, somos assessorados por um grande banco, somos S.A., somos auditados pela PWC há 2 anos. Temos a história contada para chegar em 2022 e dizer que estamos aptos a entrar no mercado aberto. Toda essa história está sendo estruturada e contada como o de um grande player. Temos ERP preparado para o futuro, sendo S.A., auditado por uma big four. Em 2023 não seremos empresa de telecom, e sim uma empresa de tecnologia e serviços.

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Rafael Bucco

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