Juarez Quadros: Os desafios amazônicos para a conectividade digital
Por Juarez Quadros do Nascimento*
Nos últimos dias 14 e 15 de setembro, Belém abrigou o Inovatic Pará. O Evento foi realizado pelo Tele.Síntese, uma oportuna e louvável iniciativa da jornalista Miriam Aquino, diretora do Momento Editorial, no qual tive a satisfação de atuar como Curador. Estrategicamente, o Evento teve como objetivo alavancar o desenvolvimento regional, com base nas tecnologias digitais, conectividade e sustentabilidade na Região Amazônica.
Com 12 palestrantes, 40 painelistas (em oito painéis) e alguns stands, importantes entidades apresentaram as suas soluções de modo a aprofundar os temas que contribuem para a ampliação da inclusão digital da região, promover negócios para a transformação da gestão pública e o desenvolvimento de novas linhas do conhecimento. Líderes empresariais, novas operadoras na região Norte, agência de fomento, associações de classe, universidades, centros de pesquisa e desenvolvimento, representantes do Ministério das Comunicações, Anatel e destacadas personalidades nacionais e locais participaram do Inovatic Pará.
A pinçar partes da minha locução na abertura do Evento, destaquei que Belém – onde nasci, tornei-me Engenheiro Eletricista e iniciei minhas atividades profissionais – é a capital do riquíssimo Estado do Pará, na latitude 1⁰27’21’’ Sul e longitude 48⁰30’14” Oeste. É a cidade do Círio de Nazaré, do cheiro-cheiroso, dança do carimbó, da chuva diária que alivia o calor tropical, do tacacá, pato no tucupi, maniçoba e de gente alegre e hospitaleira. Onde, pela manhã, no Mercado do Ver-o-Peso, podemos assistir ao espetáculo da natureza que chega transportado por embarcações carregadas de cupuaçu, bacuri, murici, peixes deliciosos e o famoso açaí.
No Pará, os rios são as estradas da vida, com os barcos a transportar nossos irmãos paraoaras pelas baías do Guajará, Marajó e outras, onde toda aquela água pertence à imensa bacia hidrográfica dos rios da Amazônia a confundir com o verde escuro arborescente oceano Atlântico, que por via rodoviária fica em torno de 200 km de Belém. Lá, usamos as concordâncias da segunda pessoa do singular na nossa fala, tais como: “No Pará, se tu quiseres floresta, tu tens! Se tu quiseres montanha, tu tens! Se tu quiseres praia de água doce, tu tens! Se tu quiseres mar, tu tens! Se tu quiseres inovar em pesquisa, ciência e tecnologia, tu podes inovar!”.
No impulso do século XXI, nenhum país tropical dispõe de infraestrutura científica e tecnológica – universidades, institutos, fundação de amparo à pesquisa e parque de ciência e tecnologia – tão robusta quanto a amazônica. Lá, investe-se em cérebros, em gente treinada, em instituições de pesquisa, ciência e tecnologia. Ressalto que quando a política se alinha com o conhecimento, a Amazônia e o Pará são competentes para contribuir com a preservação do meio ambiente e o desenvolvimento econômico-social do Brasil.
Nos dois dias mencionados abordamos temas voltados para a Amazônia e, em particular, ao Pará. Ouvi de colegas presentes que o Inovatic Pará foi de elevado nível, com apresentações densas e debates construtivos. Somaram-se aos participantes oriundos de outros rincões do Brasil, personalidades locais que manifestaram suas firmes e procedentes posições em relação aos interesses paraenses e, portanto, amazônicos.
No Evento foi destacado o Programa Amazônia Conectada e Sustentável – Infovias, que trata da instalação de mais de 12 mil Km de cabos com fibras óticas pelos rios nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima, com recursos da ordem de R$ 1,5 Bilhão, a permitir conectar 59 municípios e vários anéis de cabos ópticos, em estratégicas redundâncias para a conectividade da Região Amazônica com as demais regiões do país e com o mundo.
Como foi mostrado, já estão prontos os trechos Manaus-AM/Santarém-PA/Macapá-AP e prestes a concluir o trecho Belém-PA/Macapá-AP. Merece destaque que as primeiras infovias Manaus/Tefé e Manaus/ Barcelos/São Gabriel da Cachoeira – no Estado do Amazonas – foram iniciadas em 2015 pelo Exército Brasileiro, em parceria com a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa. Referidos trechos irão se integrar à totalidade da rede de fibra óptica que está sendo construída com os recursos dos leilões de 4G e 5G. Até o final do ano também serão entregues as rotas subfluviais de Tefé-AM até Atalaia do Norte-AM e Novo Airão-AM até Boa Vista-RR.
No Inovatic, com o objetivo de conectar mais ribeirinhos paraenses, foi anunciada a proposta de construir mais mil quilômetros de cabos ópticos nos rios Tocantins, Xingu e Tapajós; que desembocam no trecho paraense, onde o Rio Mar tem o nome de Amazonas. Que somados com os cabos nos rios Madeira, Purus, Juruá e Negro; que desembocam no trecho amazonense do Rio Mar denominado Solimões; a Amazônia – com área geográfica equivalente a 14 países europeus – far-se-á mais conectada.
Outro destaque foi o Programa Social a que se refere à Política Pública na área da Educação, no qual há a obrigação de conectar 138 mil Escolas Públicas de Educação Básica no País, a usar R$ 3,1 Bilhões oriundos do leilão de 5G. No Pará essas escolas serão conectadas. Quanto às Rodovias Federais há a obrigação de cobrir com telefonia móvel celular 35 mil Km de rodovias federais, das quais, no Pará, destaco a Belém/Brasília (BR 010), a Santarém/Cuiabá (BR 163) e a que liga o Pará com o Nordeste (BR 316).
Foi mostrado o Programa Digitaliza Brasil que trata do sinal de TV digital pelo interior do Brasil, a incluir milhões de pessoas na audiência da TV Digital aberta e gratuita. O programa, iniciado em 2014, com a liberação da faixa de 700 MHz para o ingresso da tecnologia 4G e a migração dos canais analógicos para a TV digital, concluirá o seu processo até o final de 2023. Assim, são aplicados cerca de R$ 700 milhões para a digitalização das retransmissoras de TV em todo o país. Os recursos permitiram digitalizar as retransmissoras de TV em 1.563 municípios com menos de 50 mil habitantes. Para essa migração foram criados cinco mil novos canais digitais de TV.
Quanto ao 5G no Brasil foi mostrado que a adoção da tecnologia já conta com 13 milhões de clientes em apenas 14 meses, desde que o serviço foi lançado. A dificuldade de instalação de antenas e infraestrutura nas cidades para a oferta da cobertura com a nova tecnologia foi objeto de preocupação no Inovatic Pará. Como exemplo, foi citada a cidade de Belém onde as operadoras de celular enfrentam dificuldades para ampliar a infraestrutura, pois, ainda que a Câmara Municipal já tenha aprovado legislação para isso, falta a Prefeitura regulamentar a lei.
Professores das universidades e da entidade de amparo à pesquisa comentaram a escassez de vagas e cursos na área de tecnologia, a nível nacional e regional. A propósito, estudo recente da OCDE nos mostra que, na base, somente 11% dos brasileiros do ensino médio estão em cursos técnicos, enquanto a média nos países ricos é de 44%. Cabe a reflexão sobre a falta de profissionais qualificados na área de tecnologia de modo a suprir essa crescente demanda.
As startups da região foram conclamadas a se engajarem em hubs de inovação aberta, mediante parcerias em diferentes níveis de maturidade. Uma vez que as startups brasileiras precisam se aprofundar no desenvolvimento de plataformas de inteligência artificial, inclusive a Inteligência Artificial generativa. Por se tratar de uma região “Satellite Frendely”, as comunicações por satélite na Amazônia foram destacadas como complementariedade para a conectividade na região, onde o emprego de satélites será uma solução viável para o acesso à banda larga.
Por fim, resta-me agradecer à promotora do Inovatic Pará que me confiou o papel de Curador, às pessoas e entidades que aceitaram nossos convites e se interessaram em impulsionar o desenvolvimento econômico-social, a promover a inclusão digital no Brasil e consequentemente no Estado do Pará. Que venham novos Inovatic’s na Região Amazônica!
(*) Juarez Quadros é Engenheiro Eletricista, Head da JMQN Advisors e presidente do Conselho Curador da Fitec. Foi ministro de Estado das Comunicações e presidente da Anatel.