Governo quer tirar obrigação de dono de tele manter sede no país. Anatel apoia

Em resposta a uma consulta do MCTIC, a agência se manifesta favorável à revogação do Decreto 2.617, de 5 de Junho de 1998. Esse decreto é um dos baluartes do modelo de privatização do setor. Segundo fontes da agência, o seu fim não tem qualquer impacto sobre a prestadora de serviço, que continua a ser obrigada a ter sede no país e cumprir as leis brasileiras. Mas flexibiliza as regras para o seu controlador.

Por meio de uma nota à imprensa, publicada hoje, 13 de julho, a Anatel afirma apoiar uma das mais importantes alterações regulatórias desde a privatização da Telebras. Em resposta a uma consulta ao MCTIC, a agência se manifestou favorável à revogação do Decreto 2.617, de 5 de Junho de 1998.  Esse decreto, embora com apenas quatro artigos, sustenta uma cláusula pétrea do setor de telecomunicações. Entre outros,  estabelece que qualquer grupo econômico, para ter licença de telecom no país, precisa ter sede e administração no país.

Fontes da Anatel ouvidas pelo Tele.Síntese asseguram que a revogação desse decreto não muda em nada essa obrigatoriedade, pois ela está estabelecida no corpo da Lei Geral de Telecomunicações (LGT). O que muda, afirmam, é que, se esse decreto for revogado, os Controladores das operadoras de telecomunicações deixam de também ser obrigados a constituir sede no país. ” Hoje o Brasil é o único país da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) que exige que o controlador das prestadoras de telecomunicações também tenha sede no país, e isso é motivo de muita reclamação”, afirmou fonte da agência.

O que diz o decreto:

Art 1º As concessões, permissões e autorizações para exploração de serviços de telecomunicações de interesse coletivo poderão ser outorgadas ou expedidas somente a empresas constituídas sob as leis brasileiras, com sede e administração no País, em que a maioria das cotas ou ações com direito a voto pertença a pessoas naturais residentes no Brasil ou a empresas constituídas sob as leis brasileiras e com sede e administração no País.

Art 2º As autorizações para exploração de serviços de telecomunicações de interesse restrito poderão ser expedidas para empresas constituídas sob as leis brasileiras e com sede e administração no País e para outras entidades ou pessoas naturais estabelecidas ou residentes no Brasil.

O impacto sobre o fim dessa medida poderá ser verificado principalmente nos grandes grupos de telecomunicações que já atuam no país, mas também abre uma enorme flexibilidade para novos investidores ingressarem tanto nesses grupos como nos menores.

Mas o relator da matéria, conselheiro Moisés Moreira explica que a obrigatoriedade das empresas de telecomunicações terem sede no Brasil e seguirem as leis brasileiras se mantém, até porque, afirma, é uma obrigação expressa em lei. E cita:

“Art. 86 A concessão somente poderá ser outorgada a empresa constituída segundo as leis brasileiras, com sede e administração no País, criada para explorar exclusivamente serviços de telecomunicações.”
Art. 133. São condições subjetivas para obtenção de autorização de serviço de interesse coletivo pela empresa: I – estar constituída segundo as leis brasileiras, com sede e administração no País”

Técnicos

Conforme o parecer da área técnica da agência, se o decreto “objetivou criar condições à participação desse capital estrangeiro na estrutura societária das empresas prestadoras de serviços de telecomunicações, buscando garantir, ainda, que seu centro decisório, consubstanciado no primeiro nível da estrutura de controle (holding controladora direta), permanecesse em território nacional” ……

….”passados mais de vinte anos da sua publicação, é notória a expertise da Agência no controle, prevenção e repressão das infrações da ordem econômica e os seus reflexos sobre o ambiente competitivo setorial são patentes, na medida em que se observa a existência de níveis razoáveis de contestabilidade entre os players atuantes e, por conseguinte, uma melhor oferta de serviços aos consumidores finais. A Resolução nº 101/1999 segue em plena utilização, não tendo sofrido reparos em seu texto desde a sua edição, e continua servindo de modelo, inclusive, para outros setores de infraestrutura”.

Ou seja, para a Anatel, se por um lado a revogação dessa norma irá permitir uma redução de custos para os investidores, que não precisarão mais criar um outro veículo acionário que tenha sede no país para aportar recursos às empresas de telecom, por outro, não mexerá em nada nas regras de estímulo à competição e controle de concentração no mercado brasileiro da agência, porque os instrumentos para exercer tal fiscalização não foram alterados. A conferir.

Burocracia

Para o professor José Leite Pereira Filho, ex-conselheiro da Anatel, a obrigatoriedade de os controladores terem sede no país e seguirem a legislação brasileira tornou-se uma mera questão burocrática, visto que que não proíbe, na prática, o controle estrangeiro. “O decreto deve ser modificado para eliminar essa restrição de controle, que é inócua”, afirmou.

Mas observa que é melhor que a norma seja modificada, ao invés de revogada na íntegra porque poderia acabar desobrigando as prestadoras de serem empresas brasileiras, o que na sua avaliação seria ilegal.

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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