FWA deve alcançar 20% da banda larga e ter modem em comodato, diz Qualcomm
Fornecedora de chipsets para CPEs (Customer Premises Equipment) de 5G FWA – equipamento que funciona como um modem que transforma o sinal da rede móvel em banda larga fixa –, a Qualcomm tem grandes expectativas no que diz respeito à adoção da tecnologia no Brasil. A empresa acredita que, com o amadurecimento do mercado, o “5G fixo” deve alcançar 20% dos acessos de internet fixa no País nos próximos cinco anos.
Em entrevista ao Tele.Síntese, Fiore Mangone, diretor sênior de Desenvolvimento de Negócios da fabricante, indica que a expansão da área de cobertura de quinta geração móvel deve estimular novas ofertas e o lançamento de terminais com características diversas, à semelhança do mercado de smartphones. Ou seja, com preços variando conforme a capacidade dos aparelhos.
Segundo o executivo, com a crescente adoção da tecnologia no mundo, a produção em escala vai ajudar a reduzir os custos dos CPEs. Inclusive, o fornecimento do modem em comodato, comum nos serviços de banda larga fixa, ainda será realidade nos planos oferecidos de FWA. “Entendemos que esse é o modelo que vai chegar com o tempo e, à medida que novos roteadores vão sendo introduzidos no mercado brasileiro, também veremos preços mais acessíveis”, afirma.
Mangone também diz que casos de uso B2B (como agências bancárias), aplicações que requerem baixa latência (games online), a ativação da frequência de 26 GHz e áreas em que não há cobertura de fibra óptica também puxarão a demanda pelo 5G fixo.
Ele ainda aponta que as operadoras entrantes da telefonia móvel que adquiriram lotes regionais de espectro no leilão do 5G também podem aproveitar a tecnologia como fonte de novas receitas. “Diria que, para as entrantes, deveria ser o primeiro serviço a ser lançado, porque é muito mais simples do que ativar uma rede celular”, sugere.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Tele.Síntese: Quais são as expectativas com o 5G FWA?
Fiore Mangone, diretor sênior de Desenvolvimento de Negócios da Qualcomm: Nós temos uma grande aposta no FWA, principalmente com a chegada do 5G. Temos a expectativa de que, considerando o gap digital em muitas residências, o serviço possa alcançar 20% da base de clientes de internet fixa no Brasil ao longo dos próximos cinco anos, com crescimento da base de usuários. Os atuais 47 milhões de acessos [de banda larga fixa] vão crescer, com o FWA crescendo proporcionalmente.
Tele.Síntese: Podemos basear essa expectativa em comparação com outro mercado, como os Estados Unidos?
Mangone: As operadoras Verizon e T-Mobile somam 9 milhões de usuários de FWA nos Estados Unidos. Comparativamente, o mercado americano tem 131 milhões de usuários de internet fixa. Então, vemos que, percentualmente, os números de FWA ainda estão abaixo de 10%. Ou seja, também há espaço para crescimento no mercado americano.
Mas se você me pergunta por que o mercado americano já avançou, isso ocorre porque o 5G chegou lá bem antes do que aqui. O lançamento lá foi em abril de 2019, antes da pandemia. E no Brasil foi em julho de 2022. Isso explica, em parte, porque o FWA avançou muito mais nos Estados Unidos do que aqui no Brasil até o momento.
Tele.Síntese: A expansão da cobertura é o que vai puxar o FWA?
Mangone: O aumento de cobertura vai fazer com que o FWA cresça no Brasil. Hoje, temos 5G nos grandes centros. Bem ou mal, o atendimento de internet já existe de alguma forma nesses locais, seja através de cabo ou de fibra. Então, hoje, o FWA, nesses grandes centros, vai ser utilizado para algumas alternativas. Tem muita gente usando de backup – você tem a internet fixa e um CPE para o caso de falha – e em áreas nas quais o cabo ou a fibra não chegam. No Rio de Janeiro, há muitos bairros que, por questão de não poder mexer na estrutura de passagem de cabos, não se consegue chegar com internet fixa. Então, o FWA resolve esse tipo de problema.
O grande crescimento vai acontecer realmente quando o 5G chegar – e está chegando agora – em áreas em que você não tem tanto atendimento por fibra ou cabo. Na nossa visão, o FWA não vem para competir com a fibra, mas para complementar. Ou seja, em áreas onde já tem fibra, provavelmente o cliente vai ser atendido por fibra, é o natural de acontecer. Em áreas em que não se tem fibra, aí é onde entra a oportunidade para o FWA se estabelecer.
Tele.Síntese: O modelo de franquia de dados que existe na banda larga móvel pode prejudicar o FWA, tendo em vista que o consumidor de internet fixa se acostumou com planos ilimitados?
Mangone: Isso vai de acordo com o perfil de uso e de consumo de cada cliente. Para isso, as operadoras estão criando diferentes perfis. A Claro lançou dois, a Vivo lançou outro diferente. Isso é uma questão de tempo até elas também entenderam quais são os perfis de consumo necessários para esse tipo de cliente.
Também é importante notar que, quando olhamos o perfil de uso de um cliente 5G de smartphone, é bem diferente de um perfil de uso de um cliente 5G FWA. Na sua casa, você está assistindo a streaming, baixando dados, fazendo uma conferência. Realmente, o FWA consome mais dados do que um smartphone convencional. Mas isso é planejado. Então, as operadoras, antes de lançaram esses planos, têm feitos pilotos e testes com usuários para entenderem os perfis de uso.
Tele.Síntese: Planos diferenciados vão estimular a adesão ao serviço?
Mangone: Acredito que o FWA vai ficar muito parecido com o mercado de smartphones, tanto no sentido dos planos de serviços – ter diferentes pacotes, perfis e até eventualmente um pré-pago –, como de dispositivos. Vamos ter produtos high-end, mais sofisticados, que entregam mais velocidades e recursos avançados, equipamentos em categorias intermediárias e outros de entrada. Temos trabalhado com os parceiros fabricantes e operadoras também para fazer essa segmentação, como a que se vê hoje nos smartphones. No mercado, há celulares de R$ 700 e de R$ 10 mil. É uma tendência que vamos ver no mercado de equipamentos.
Tele.Síntese: Diferentemente da banda larga fixa, o assinante do 5G FWA precisa adquirir o CPE, o equipamento não vem em comodato. Teremos preços mais acessíveis?
Mangone: Os planos lançados pela Claro e pela Vivo usam o GX 3000, da Intelbras, baseado no nosso processador SDX 62. Outros modelos estão a caminho. Já vemos alguns modelos sendo homologadas na Anatel. Em relação à precificação, as operadoras acabam precificando de formas diferentes. Como está começando agora, é um serviço novo, também vai chegar ao modelo do comodato. Entendemos que esse é o modelo que vai chegar com o tempo e, à medida que novos roteadores vão sendo introduzidos no mercado brasileiro, também veremos preços mais acessíveis. O FWA está ganhando escala mundial. Como consequência, o custo do equipamento cai e isso beneficia os clientes aqui no Brasil.
Tele.Síntese: A ampliação dos casos de uso é o que está puxando a produção em escala?
Mangone: Exatamente. Os casos de uso estão se ampliando. O FWA está sendo até testado pelos ministérios das Comunicações e da Educação para o projeto de conectividade nas escolas.
Tele.Síntese:A disponibilização de mais frequências para o 5G também vai contribuir para estimular o serviço?
Mangone: Existe uma oportunidade que eventualmente vai chegar ao Brasil. No leilão do 5G, além do espectro usado hoje, a Anatel licenciou o espectro de ondas milimétricas, em 26 GHz. Isso é outra oportunidade, porque você pode ter CPEs em ondas milimétricas, que são equipamentos mais sofisticados, para aplicações que necessitam de maior throughput, como gaming com baixa latência, ou aplicação de B2B. Quer um exemplo? Vários bancos começaram a utilizar CPEs de 5G FWA como solução de backup da internet fixa para caixas eletrônicos.
Tele.Síntese: Algum programa de incentivo do governo pode ajudar a reduzir os preços dos CPEs?
Mangone: O governo já tem programas assim, inclusive para o processo de produção no Brasi. A Intelbras e a Elsys têm vantagens ao fabricar aqui. De novo, existem outros fatores que vão contribuir para a redução dos custos dos roteadores: novos modelos, escala mundial, equipamentos diversos. À medida que o FWA cresce no mercado brasileiro, a tendência é que os preços diminuam. É questão de tempo para isso acontecer.
Tele.Síntese: O serviço também é uma oportunidade comercial para as entrantes do 5G?
Mangone: Para as operadoras regionais, que estão montando as suas redes 5G, é até mais fácil começar com o FWA do que com o celular. No caso do celular, é preciso ter uma rede completa e madura, porque o cliente vai se mover ao longo da rede – claro que as operadoras podem fechar parcerias para ter essa cobertura garantida. Mas, com o FWA, é muito simples, pois se sabe exatamente a área de cobertura e se é possível atender àquele bairro. Então, para a entrante, o FWA é um serviço muito mais simples, fácil e rápido para ser lançado dentro dessa nova rede 5G.
Para as incumbentes, o FWA completa a oferta de banda larga fixa e móvel. Quando as operadoras introduziram o 5G, basicamente quem tinha o SIM card 4G passou a ter o serviço 5G, desde que tivesse um aparelho compatível. Agora, o fato de a rede estar pronta, ter maior capacidade e você oferecer um novo serviço, é uma oportunidade de novas receitas para as operadoras. Já para as entrantes, diria que deveria ser o primeiro serviço a ser lançado, porque é muito mais simples do que ativar uma rede celular.