Para Alex Inglês, da BT, processo no Cade contra Oi, Claro e Telefônica já inibe o consórcio das empresas
Quando assumiu a direção geral da subsidiária da British Telecom no Brasil, no final de 2016, Alex Inglês definiu com sua equipe um plano de trabalho de três anos. Nesse período, a empresa precisaria rever sua estrutura devido à perda do maior cliente, os Correios, aumentar a rentabilidade dos negócios que restaram (e não são poucos) e prospectar novos.
Para conseguir isso até 2020, a empresa vai lançar novos produtos, sempre com foco no mercado corporativo. Conta com a queda do custo da capacidade satelital e aposta no desenvolvimento do mercado local de redes definidas por software e segurança. Vai lançar, ainda este ano, soluções de SDNs e contra ataques digitais.
Na entrevista abaixo, Inglês fala do desafio de recuperar a receita perdida em função do fim de seu maior contrato. Analisa o modelo de privatização brasileiro. E comenta a recente decisão do Cade de acolher a denúncia da BT contra a formação de consórcios por parte de Claro, Oi e Telefônica, empresas com grande poder de mercado e que, a seu ver, usam o consórcio para destruir a concorrência.
Tele.Síntese – Como estão os negócios da BT no país este ano?
Alex Inglês, diretor geral da BT no Brasil – Estamos focando nos produtos em que temos diferenciação. A rede definida por software é uma área na qual eu acredito. Estamos lançando um produto globalmente, inclusive no Brasil, agora em outubro.
A gente não só tem um produto melhor que o mercado, como também acho que a gente não tem tanto a perder como os nossos competidores, que já têm muitos negócios vindos de acesso. Então acho que é uma oportunidade de criar uma disrupção no mercado brasileiro, oferecer um roteador com capacidade SDN na ponta, no escritório, na loja do varejo.
Os clientes querem SDN?
Inglês – O mercado ainda está muito pouco maduro no assunto. Tem muita conversa, muita prova de conceito, mas pouca contratação. Acho que temos uma janela de oportunidade porque tem pouca gente com solução boa no mercado. E a demanda vai ser muito grande. A gente pode aumentar o nosso share of wallet dos clientes que já são nossos, conquistar mais espaço dentro dos clientes que compartilhamos com outros competidores, e conquistar clientes que ainda não atendemos.
Já tem alguém usando em fase piloto?
Inglês – Estamos fazendo uma prova de conceito com um grande banco. Inicialmente, são 20 agências, com potencial de rollout muito maior.
E além da SDN?
Inglês – Segurança. Essa é uma área que eu também acredito que temos vantagem competitiva. Fazemos a segurança do governo do Reino Unido, fizemos a segurança das Olimpíadas de Londres. Temos uma presença forte no Brasil, um dos nossos 14 SOCs (Security Operation Center) fica aqui. No mundo, temos 2,5 mil profissionais nessa área. Temos a vantagem de poder, em função da rede global, limpar o tráfego de ataques DDoS na origem.
Estão investindo no Brasil?
Inglês – Tivemos uma redução de receita em função da perda de um grande contrato [Correios]. Mas meu budget de Capex tem se mantido estável nos últimos anos. O que buscamos é investir em produtos que nos trazem diferenciação. Além de SDN e segurança, a gente oferece serviços em nuvem de forma associada com parceiros como Amazon, Google, HP, Cisco e Microsoft, de forma que a gente maximize o valor da nossa rede global. Qualquer cliente conectado à nossa rede tem acesso aos produtos desses parceiros. Fizemos investimentos neste sentido. Temos um nó da solução de Skype for Business no Brasil. E estamos investindo na interconexão local de mais parceiros. A gente quer que a interconexão seja local para reduzir a latência.
A gente também investiu em recursos no último ano. A gente trouxe para o Brasil o Design Studio, um núcleo de 50 engenheiros que trabalham em uma fábrica de desenho de redes. Uma iniciativa que não atende apenas o Brasil. A maioria dos desenhos vai para fora do país.
Por que trazer o Design Studio ao Brasil?
Inglês – Foi parte motivada pela demanda local, parte por uma redução de custo de trabalho, trazendo profissionais, de lugares como EUA, onde é mais caro. Nessa migração, além da redução do custo, vimos um aumento da qualidade. Por isso o hub continuou crescendo depois da primeira migração de trabalho, com dez profissionais.
Como foram os resultados do ano passado, e como estão este ano?
Inglês – Tivemos uma queda da receita por conta da perda da conta dos Correios. Mas se a gente excluir esse caso, tivemos um aumento da receita. Nossa base continuou crescendo. Estou com foco muito grande em aumentar a rentabilidade, que temos conseguido fazer nos últimos oito meses, e voltar a crescer no longo prazo. Como os Correios eram muito importantes, não vamos crescer no top line este ano, apenas no bottom line. Minha chegada aqui acontece com foco em eficiência. A gente conseguiu manter a base de clientes estável nos últimos dois anos, passando relativamente bem durante a crise.
O setor público se fechou…
Inglês – Ainda temos um grande cliente do setor público, que é a Caixa Econômica Federal. É um cliente que continua sendo bom pra gente. Estamos até nos beneficiando de problemas que outras operadoras estão sofrendo. A Caixa está passando mais negócios para a gente em função das preocupações com a situação financeira de alguns de nossos concorrentes.
Então a crise na Oi tem efeito positivo nos resultados da BT?
Inglês – Nós temos uma preocupação com a saúde financeira da Oi e com a estabilidade do serviços deles, até porque também somos clientes deles. Não detectamos, até agora, nenhuma degradação do serviço deles. Mas é uma preocupação nossa e dos nossos clientes, que nos beneficia apenas ao vermos a migração de alguns clientes corporativos da Oi para a BT.
O que acontece se a Oi falhar na entrega do serviço a vocês?
Inglês – O que nós fizemos quando começou a recuperação judicial, foi: listar todas as dependências que a gente tinha, melhorar toda a resiliência dos links mais críticos e adotar um plano de contingência para outros fornecedores, dependendo da criticidade do link. Isso foi preparado há bastante tempo, desde junho de 2016.
Eu fui muito cobrado de preparar uma alternativa, porque a gente não sabia o que ia acontecer. Até agora, como disse, não percebemos nenhuma degradação do serviço, então o plano de contingência não precisou ser executado, mas existe.
A Oi guarda algumas semelhanças com o grupo British Telecom. É dona de um vasta infraestrutura no país de origem, responsável por grande parte do tráfego no atacado, herdou boa parte das operações da privatização do setor. No entanto, os resultados são bem diferentes…
Inglês – São decisões de gestão. Decisões históricas na gestão de ambas as empresas. Mesmo no Brasil a gente tem empresas mais bem sucedidas. Na verdade, a melhor comparação com a BT seria a Oi combinada com Embratel e com a Telefônica, porque elas dividiram o mercado todo.
Acho que tem algo a se dizer sobre como o processo foi gerenciado no início. Talvez o modelo de privatização do Brasil não tenha sido o ideal. Mas acho que, como você vê diferença de sucesso entre as empresas que atuam aqui, o impacto maior foi em função das decisões de gestão. Acho que a fusão com a BrT foi uma decisão equivocada, mas foi motivada por uma questão política. Então, tem um conjunto de coisas que desfavoreceram a Oi.
Por outro lado, a BT tomou decisões que foram importantes. A construção da divisão Global Services, que atua em todo o mundo, foi muito bem tomada. E das divisões que atuam só no Reino Unidos, foi feita uma boa decisão de separar o monopólio natural, o lado que a gente chama de OpenReach, além de continuar investindo em P&D. Esses dois passos mantiveram a vantagem competitiva no Reino Unido e fora, da divisão Global Services.
A separação do monopólio natural faria sentido no Brasil?
Inglês – É uma pergunta difícil. Claramente existe uma diferença de tamanho geográfico entre Brasil e Reino Unido porque é difícil cabear um país grande como o Brasil. Mas também acho que a divisão de áreas geográficas entre as operadoras não foi a ideal.
Se a gente tivesse um operador nacional, altamente regulado, e separasse as outras divisões daquele monopólio natural, acho que teria sido melhor modelo. Porque aí você claramente teria uma parte da infraestrutura altamente regulada, por ser um monopólio natural, e deixa a parte que pode ser mais competitiva livre para o mercado. Acho que é um modelo que funciona. A dúvida é se mantém [a empresa monopolística] dentro de uma mesma estrutura, ou se separa. No Reino Unido é uma briga que vem de muito tempo; competidores querem separar, a gente vem lutando para manter junto.
O Brasil poderia seguir qualquer um dos modelos. Manter uma estrutura nacional, altamente regulada, numa mesma empresa nacional, ou então separar as duas organizações. Acho que teria sido melhor que a solução aplicada aqui, de separação geográfica.
A BT tem um processo correndo no Cade contra a formação de consórcios por parte de Claro, Oi e Telefônica. Para quando esperam uma decisão final?
Inglês – O resultado que eles [executivos da Superintendência-Geral do Cade] publicaram até agora está totalmente alinhado com o que pensamos: que o Brasil se beneficia por não permitir esse tipo de consórcio entre as empresas que já têm poder de mercado significativo, como é o caso das três.
Saindo a decisão favorável, o que vai acontecer?
Inglês – Não sei. No mínimo, impedir que isso volte a acontecer no futuro já é benéfico para a BT e para o mercado de telecomunicações. Minha visão é de que o mecanismo de consórcio existe para que as pequenas empresas se juntem para ser capazes de concorrer com as grandes. E não que as grandes se juntem para massacrar a concorrência.
E para quando espera o resultado?
Inglês – As estimativas da nossa área legal é de entre mais um ano e dois anos para o processo correr no Cade, e mais entre um e dois anos para a decisão final do Cade. Enquanto isso, acho que é muito pouco provável que as três formem um novo consórcio. Acho que esse benefício a gente já conseguiu para o mercado brasileiro. Se elas tentarem, será cavar a própria cova.
A possibilidade de fazer consórcios continua possível…
Inglês – Sim, e acho que a lei não deve mudar. O que tem de acontecer, e acho esse o efeito positivo, é que as grandes fiquem impedidas de se consorciar.
Inclusive no SGDC há possibilidade de consórcio. Vocês vão participar diretamente do leilão?
Inglês – Vamos monitorar de perto, preferimos que nossos fornecedores participem. A gente pode se beneficiar desse leilão. Como somos um comprador de capacidade muito grande por sermos o maior provedor de capacidade corporativa por satélite no Brasil, o efeito pode gerar uma redução do custo da capacidade. Isso barateia nosso serviço, e o serviço para nossos clientes. Então o satélite passa a ser tornar uma alternativa viável para mais clientes do que no passado. Existe uma ameaça, de ter mais competidores no mercado por baixar as barreiras de entrada. Mas vejo mais oportunidade, porque reduz o custo de capacidade satelital, que é um item muito importante no meu balanço.
Há uma explosão de capacidade em banda Ka no Brasil. A contratação desse tipo de capacidade vai crescer muito?
Inglês – Em valor absoluto, não, porque os preços estão caindo. A gente vai continuar investindo nessa tecnologia porque o país precisa disso. Vai continuar como parte do portfólio de produtos. Estamos considerando seriamente entrar numa oferta de banda Ka em parceria com uma empresa fornecedora de satélite. [Nota do editor: a BT já tem parceria com a Yahsat para construção de infraestrutura no Brasil no satélite que entra em operação em 2018].
A gente vê a manutenção desse produto, o satélite. Além da banda Ka, tem outras soluções. Tem a solução da OneWeb, de baixa órbita, tem a solução da O3b, de média órbita, tem os satélites HTS, que usam banda Ku. Temos parceria com todos, e estamos continuamente analisando como incorporar isso a nossos serviços. Tudo isso reduz os preços. A entrada da Ka automaticamente reduz o preço da Ku e permite ofertas diferenciadas.