Desafio da indústria de TICs é reduzir a dependência externa sem depender de benefício fiscal
De carregador de celular a torre de transmissão de sinal 5G, a indústria de Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) é tão diversa e abrangente quanto as discussões a respeito da política nacional mais eficiente para o setor, tendo em vista, por um lado, a necessidade de facilitar a importação de componentes para o País e, por outro, a de preservar e potencializar a produção doméstica.
Ao longo de 2022, diversos produtos classificados como Bens de Informática e de Telecomunicações (BIT) tiveram as alíquotas do Imposto de Importação (II) reduzidas em pelo menos 10%.
Em mais de uma ocasião, o Comitê Executivo de Gestão (Gecex) da Câmara de Comércio Exterior (Camex), vinculada ao Ministério da Economia, editou resoluções – como as 318/2022 e 353/2022 – reduzindo as tarifas de importação, sendo que algumas chegam a contemplar 87% dos códigos tarifários que compõem a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM).
Dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) apontam que as importações de produtos eletroeletrônicos devem crescer 14% neste ano, somando US$ 45,9 bilhões. Semicondutores, módulos fotovoltaicos e componentes para telecomunicações lideram a lista de itens adquiridos no exterior.
No cômputo geral, o déficit da balança comercial do setor deve chegar a US$ 39,3 bilhões, ampliando o saldo negativo em 14% em relação a 2021.
“A Abinee é sempre favorável a qualquer redução tributária que possa ocorrer, mas com os devidos cuidados necessários, principalmente se tratando do Imposto de Importação, pois pode afetar de forma muito significativa a produção nacional”, afirmou Humberto Barbato, presidente executivo da associação, em recente encontro on-line com jornalistas.
“Tivemos, por exemplo, um reflexo [da redução do II] muito grande na importação de módulos fotovoltaicos que levou até mesmo ao fechamento de uma planta no País”, acrescentou.
O secretário de Empreendedorismo e Inovação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), José Gustavo Sampaio Gontijo, reconhece que, ainda que facilite a aquisição de tecnologias estrangeiras, o encolhimento das alíquotas do II, feito de forma ampla, tem impactos sobre a indústria, sobretudo as fábricas de componentes.
Nesse sentido, dada a importância do setor de TICs para o convívio social na contemporaneidade, Gontijo aponta que o desafio é prover condições para que a indústria nacional seja competitiva sem depender de benefícios fiscais.
“Reduzir imposto é importante desde que tenha isonomia tributária para quem produz dentro e fora do País. Precisamos de uma indústria de prontidão, capaz de produzir em períodos necessários, mas que não dependa de questões unicamente tributárias”, avalia o secretário da Secretária de Empreendedorismo e Inovação (Sempi).
SEMICONDUTORES
De acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) compilados pela Abinee, a importação de semicondutores deve crescer 19% neste ano, atingindo US$ 6,634 bilhões. O mercado destes chips foi um dos mais afetados pela pandemia de covid-19, e a expectativa é de que desarranjo se prolongue por mais tempo.
Segundo a entidade que representa as empresas do setor elétrico e eletrônico, a aquisição de semicondutores foi um dos principais problemas enfrentados pela indústria nacional em 2022. No primeiro semestre, 71% das empresas tinham dificuldades para obter os componentes. Mais recentemente, nos meses de setembro e outubro, houve uma leve melhora (60%).
Um levantamento da associação indica que, para 33% das empresas, a oferta de semicondutores deve se normalizar na primeira metade de 2023. Outros 28% acreditam que a escassez deve ser resolvida no segundo semestre do ano que vem. Entretanto, ainda há uma parcela significativa (15%) de empresários que esperam que a aquisição de componentes volte ao normal somente em 2024.
De todo modo, o mercado internacional desses chips não deve voltar a ser o mesmo do período anterior à pandemia. Um dos motivos é a guerra tecnológica entre os Estados Unidos e a China. Neste ano, o governo de Joe Biden anunciou subsídio bilionário para a produção de semicondutores no território norte-americano e restringiu a exportação de insumos para Pequim, com a intenção de reduzir a participação chinesa no setor.
O governo brasileiro, no entanto, se mostra hesitante em relação a uma política de incentivo à fabricação de semicondutores. Em dezembro de 2020, quando a escassez do componente já era sentida globalmente, decretou a dissolução do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), até então única empresa fabricante de semicondutores na América Latina.
Em janeiro deste ano, porém, o governo Bolsonaro sancionou uma lei que prorrogou a vigência do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores (Padis) até 2026. Além disso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, indicou, em setembro, que o governo planejava editar uma medida provisória para incentivar a produção doméstica de semicondutores – até o momento, o suposto texto não foi publicado.
“A expectativa é trazer o desenvolvimento desses produtos para o Brasil, de tal maneira a diminuir a nossa dependência externa. Temos capacidade para produzi-los, principalmente porque a indústria brasileira, a cada dia, tem mais demanda por semicondutores, que integram desde brinquedos a automóveis”, afirmou Barbato, da Abinee.
Gontjio, por sua vez, salienta que os países líderes na produção dos chips mais potentes concedem subsídios vultosos às fábricas, o que dificilmente o Estado brasileiro poderia fazer. No entanto, para se precaver de crises internacionais e disputas geopolíticas, o País poderia considerar produzir chips intermediários.
“É importante ter essa atividade no território nacional pela questão da indústria de prontidão, poder produzir internamente quando fica mais difícil adquirir fora. Assim, mesmo que não façamos os chips mais poderosos, evitaríamos a escassez que impede as indústrias de operar”, avaliou o secretário.