Como se dá um bloqueio de site ou serviço digital no Brasil?
Entre as possibilidades abertas pela Justiça do Brasil para enfrentar a desinformação espalhada por redes sociais existe a alternativa do bloqueio à ferramenta digital. No fim de semana, representantes da Anatel, entendendo que a temperatura em torno da disputa com o X (Twitter) vinha subindo, pediram informalmente para as operadoras a ficarem de prontidão.
O sobreaviso, extraoficial, não significa que virá bloqueio, mas que integrantes da agência entendem que, por parte do STF ou do TSE, pode partir a ordem judicial da retirada do X, o antigo Twitter, do ar a qualquer momento. E podia vir especialmente neste fim de semana, quando as equipes de trabalho das operadoras para crises estão com contingente reduzido.
A Anatel, vale lembrar, é órgão fiscalizador de telecomunicações. Tem como papel transmitir as ordens que chegam da Justiça aos regulados e acompanhar o cumprimento. A agência não determina, por si só, qualquer retirada, mas o cumprimento do comando judicial. Não entra em debate sobre o mérito das ordens.
Um eventual bloqueio do Twitter, caso determinado pela Justiça, seria idêntico a bloqueios que já afetaram Telegram em 2023 e Whatsapp em 2016 e 2015:
A agência recebe a ordem via meio eletrônico, e por meio eletrônico a superintendência de fiscalização a repassa para as operadoras, de todos os portes. Inicia, então, o acompanhamento para atestar se a medida foi tomada nos termos descritos pelo juiz. Da mesma forma, quando e se a Justiça rever a ordem, a agência solicita seu levantamento. A Anatel não faz contato com as plataformas, pois estas não são empresas reguladas.
Cada operador de rede e provedor em ação
Tecnicamente, cabe às empresas de telecomunicações decidirem como agir para cumprir as determinações judiciais e fazer o bloqueio de uma plataforma ou serviço digital no Brasil. As operadoras não têm como excluir posts específicos de redes sociais, por isso, mesmo que venha ordem judicial pela retirada de um conjunto detalhado de conteúdos, a saída é impedir o acesso dos seus clientes à plataforma objeto da decisão judicial como um todo.
O bloqueio não é simples. Depende da arquitetura da plataforma em solo brasileiro. O serviço pode usar um IP único, múltiplos IPs, usar uma ou várias portas de um mesmo IP, redes de entrega de conteúdo (CDN), múltiplos data centers etc. O serviço pode também reconfigurar as rotas de tráfego que utiliza, obrigando a identificação sistemática de novos IPs.
Em cada situação, a forma de bloqueio exige um movimento técnico distinto, mas cuja consequência é a mesma: o site, app ou serviço fica indisponível para ser acessado em solo nacional pelos clientes de banda larga fixa ou móvel das operadoras locais.
Wilson Cardoso, diretor de infraestrutura da Fiesp e Diretor do Grupo Setorial de Telecomunicações, explica:
“Todo site tá associado a um endereço IP. Você precisa pegar o endereço e bloquear. Um ISP pequeno pode bloquear no roteador dele de borda. Um grande operador, em um roteador de core ou no DNS, ao fazer a conversão de domínio para IP. Mas falar que todo mundo vai conseguir bloquear, é impossível, porque existem as VPNs”, observa.
Segundo ele, o bloqueio não tem baixo custo operacional. A empresa faz um mapeamento dos IPs, identificando-os a partir de pontos de troca de tráfego, por exemplo, e então procede ao bloqueio fechado o fluxo de dados nos equipamentos para aquele endereço.
Lembra também que, para realizar o bloqueio, a operadora precisa deter infraestrutura. Ou seja, no caso de um provedor que utilize rede neutra, o bloqueio será feito, na prática, pela operadora neutra que lhe fornece a conectividade.
Curiosamente, a situação pode levar a Musk a se bloquear no Brasil. Isso porque a Starlink, e provedores representantes da operadora de banda larga satelital no país, seriam também notificados pela Anatel a fim de cumprirem a ordem judicial. A Starlink pertence a Musk. Por ora, não há determinação da Justiça para a suspensão do X no Brasil.
Aos usuários, continuará existindo a possibilidade de acessar o conteúdo via VPN (uma rede privada), ou algum outro modelo de “tunelização”. Mas também a Justiça pode agir para solicitar o consequente bloqueio de ferramentas que permitam o acesso a um site que esteja proibido de ser acessado no país, o que não comum.