CGU aponta falhas milionárias na gestão do Funttel

Analisando contribuições de 2018 a 2023, auditoria aponta queda de contribuição e recomenda que MCom reforce o controle. Relatório identifica defasagem de norma, lacunas e “desafios significativos” na gestão do recurso.
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CGU faz auditoria sobre a administração do Funttel | Foto: Reprodução/CGU

Uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) identificou uma série de falhas no processo de arrecadação do Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel). A exemplo prático, o processo de gestão tributária por parte do Ministério das Comunicações (MCom) ocorre em um ritmo no qual a análise de processos administrativos fiscais de 2019 chegaram a junho de 2023 com apenas 15% do acompanhamento concluído. 

O relatório aponta, entre outros pontos, “lacunas na gestão tributária” e “desalinhamento na organização do plano de aplicação de recursos”, o que motivou uma diversas recomendações ao MCom para suprir lacunas no ciclo de apuração do fundo, que arrecadou pelo menos R$ 2,5 bilhões nos últimos seis anos – sob problemas que podem ter jogado esse número para baixo ou para cima. 

A auditoria da CGU partiu de uma análise da receita arrecadada desde 2018 até parte de 2023. A auditoria foi iniciada no segundo semestre do ano passado, concluída em julho deste ano e publicada no último mês. Em síntese, os achados são:

  • Redução de arrecadação do Funttel”, demandando a “necessidade de estudo para identificação de causas e mitigação dos riscos”;
  • Na gestão da arrecadação, “desafios relacionados à infraestrutura tecnológica, à capacidade operacional e aos processos internos que limitam o aperfeiçoamento da eficiência na gestão dos recursos arrecadados”;
  • Necessidade de revisão dos critérios técnicos na gestão dos processos de cobrança do Funttel”;
  • Defasagem da norma que disciplina a aplicação de recursos do Funttel (Resolução nº 66/2010); 
  • Ausência de cronograma e atribuição de responsabilidades para implementação da Declaração Mensal pelo Contribuinte e da GRU Cobrança; e 
  • Necessidade de maior observância dos percentuais e prazos de comprometimento pactuados com os agentes financeiros. 

 

Falhas

A arrecadação do Funttel vem principalmente das teles. Trata-se de 0,5% sobre a receita bruta das prestadoras e uma alíquota de 1% sobre a arrecadação bruta oriunda de eventos participativos realizados por meio de chamadas telefônicas. 

O processo administrativo fiscal ocorre no MCom, após o recebimento de relatório de fiscalização enviado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A dinâmica, na visão da CGU, “impacta a efetividade do controle e da gestão integral da arrecadação da contribuição para o Funttel”.

“É primordial destacar que, mesmo iniciado o processo de gestão da arrecadação do Funttel com a fiscalização pela Anatel, o Ministério das Comunicações possui acesso a uma pequena parcela da base total de contribuintes, atuando somente sobre os contribuintes que foram fiscalizados pela Agência”, consta no relatório.

Para se ter noção, a Controladoria aponta que “analisando os dados de 2018 a 2022, notou-se que a Anatel emitiu lançamentos fiscais de ofício referentes a 8% das declarações feitas pelas empresas nesse período“. A agência explicou aos auditores que isso ocorre porque o procedimento padrão direcionou o exercício de 2021 em 2023.

Apesar disso, a Controladoria aponta que “mesmo se houvesse maior tempestividade por parte da Anatel em encaminhar os relatórios de fiscalização, ele [o MCom] não teria condições de promover as tratativas necessárias para gestão da arrecadação“, isto porque o processo no MCom também é lento, tanto é que o trabalho referente aos relatórios do ano fiscal de 2020 ainda estava em andamento em 2023, com prazo final em 31 de dezembro de 2024.

“Essa discrepância entre os relatórios enviados e os efetivamente analisados destaca um desafio no cumprimento dos prazos e na agilidade do processo de análise por parte do MCom. Esses números evidenciam a importância não apenas de acelerar as análises diante do prazo estabelecido, mas também de otimizar o recebimento e a gestão dos relatórios de fiscalização enviados pela Anatel. Essa otimização se torna crucial para evitar a possível perda de créditos tributários e garantir a eficiência do processo fiscal“, analisa.

Durante a formulação do relatório, o MCom informou à CGU ainda neste ano que iniciou tratativas com a Anatel para a celebração de um convênio para o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais constantes das Declarações da Contribuição ao Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust). Isto porque o Funttel compartilha a mesma base de contribuintes. O estudo de tal alternativa não é novidade e já passou por impasses técnicos anteriormente, mas a expectativa é de que se encontre uma solução. 

A Controladoria entende que “a introdução dessa Declaração no Funttel se mostra crucial para alinhar os processos de gestão de tributos” e “traria ganhos significativos de produtividade, reduzindo processos manuais e minimizando erros, como também harmonizaria os procedimentos entre os fundos”. 

Redução da arrecadação

Analisando uma receita estimada a ser arrecadada pelo Funttel para o período de 2018 e 2022, o levantamento aponta “uma redução significativa de 27%” no período, aproximadamente, 241 milhões. “Este declínio aponta para a necessidade premente de uma análise detalhada das estratégias de arrecadação, bem como de possíveis práticas de evasão fiscal ou lacunas nas políticas existentes que possam estar contribuindo para esse cenário desfavorável”, afirmou a CGU.

O relatório também chama atenção para a inadimplência. “[…] apesar de as contribuições não pagas totalizarem, aproximadamente, R$ 241 milhões de reais no período de 2018 a 2022 e haver uma melhora nos percentuais de inadimplência ao longo dos anos fiscais de 2018 a 2022, nos quais observa-se oscilações de 19%, 18%, 2%, 0,5% e 1%, respectivamente, é importante ressaltar que, principalmente a partir do ano de 2020, haverá alterações desses percentuais, pois ainda não foram computados os lançamentos de ofício decorrentes das fiscalizações da Anatel”, acrescenta. 

Revisão milionária

Ainda de acordo com a auditoria, os processos de revisão de juros na cobrança pelo MCom não são transparentes o suficiente. A exemplo, em 2019, houve uma notificação de R$ 525,2 milhões reduzida para R$ 33 milhões sem "documentação em que fosse possível evidenciar a retificação, bem como a data dessa nova notificação". 

"Este caso ressalta a importância de uma revisão rigorosa dos processos de cálculo e emissão de notificações fiscais. Além disso, destaca-se a necessidade de garantir a correta configuração dos sistemas e ferramentas utilizadas, a fim de evitar erros que possam impactar significativamente os valores envolvidos e a legitimidade das cobranças fiscais.

Acesse aqui a íntegra do relatório.

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura de telecom nos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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