Ano legislativo: Veja o que avançou e o que ficou parado em 2024

Para além da reforma tributária e da regulação da IA, pautas setoriais de longa data estão mais próximas da conclusão – em alguns casos, com impactos que contrariam o interesse das teles.
Ano legislativo de 2024 aproximou pautas do setor de telecom da conclusão | Foto: Pedro França/Agência Senado
Ano legislativo de 2024 aproximou pautas do setor de telecom da conclusão | Foto: Pedro França/Agência Senado

O ano legislativo de 2024 foi marcado pelo avanço de reformas estruturais como a regulamentação do novo regime tributário, e a construção de alguns consensos acerca de marcos legais, como as regras para uso, aplicação e desenvolvimento de sistemas de Inteligência Artificial (IA). Estas e outras pautas que estiveram entre as demandas prioritárias do setor de telecom nos últimos anos tomaram forma – algumas delas, no entanto, caminhando para o sentido oposto do que as grandes operadoras defendem. 

Com base na Agenda Legislativa divulgada pela Conexis Brasil Digital no ano passado, que cita 20 subtemas entre projetos de lei em tramitação, as movimentações se concentraram em cinco deles. Para além da IA e a reforma tributária, os parlamentares deram respostas importantes sobre: o combate ao roubo e furto de cabos, a fair share, e a prestação de serviços por cooperativas.

  • Roubo e furto de cabos

No dia 11 de dezembro, o Plenário da Câmara aprovou nova proposta de aumento da pena para os crimes de furto e roubo de cabos de telecomunicações, com base no texto que buscou consolidar um conjunto de propostas de lei protocoladas entre 2016 e 2024 (PL 5853/2016). Sugere-se ainda poupar as prestadoras de sanções administrativas decorrentes da interrupção de serviço que for comprovadamente causada pelos ilícitos. 

A redação voltou para o Senado, onde tramita como PL 4872/2024, já designado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), com parecer favorável do senador Marcelo Castro (MDB-PI). 

A proposta só não foi aprovada pelo colegiado ainda este ano por pedido de vistas apresentado pelo senador Sérgio Moro (União-PR), na última quarta-feira, 18, que se opôs a uma emenda incluída no projeto, que reduz a pena para crime de lavagem de dinheiro, trecho considerado ilegal por se tratar de tema que não tem relação com a matéria principal. O parlamentar também lembrou que o colegiado aprovou recentemente outros PLs sobre a subtração de equipamentos de serviços essenciais, com isso, o texto que chegou da Câmara precisaria passar por adequações. 

Em síntese, o projeto recentemente aprovado pela Câmara trata apenas dos casos de crimes de roubo e furto de equipamentos de telecom e energia. Já outras propostas analisadas pela CCJ promovia um endurecimento da pena de forma geral, independente do objeto roubado, com alguns agravantes em caso de cabos ou aparelhos celulares. Apesar de tropeçar na última semana legislativa do ano, o tema está mais próximo da conclusão em relação a 2023. 

  • Fair share

O projeto de lei que proíbe as operadoras de implementarem cobrança das plataformas digitais pelo tráfego gerado por elas, o que inviabiliza o chamado “fair share” (PL 469/2024) defendido pelas teles, terminou o ano de 2024 com relatora designada para última análise colegiada na Câmara, a deputada Caroline de Toni (PL-SC), na CCJ. A sessão não ocorreu porque todas as reuniões em comissões foram suspensas por ordem do presidente, Arthur Lira (PP-AL), para concentrar os últimos dias no Plenário. 

Ainda em dezembro, o projeto passou com folga pela Comissão de Comunicação (CCom), por votação simbólica, pela falta de parlamentares contrários. A CCJ pode decidir terminativamente, passando o projeto diretamente ao Senado, a menos que haja requerimento para análise em Plenário. O ritmo agora pode depender dos ajustes em decorrência da nova eleição da Presidência da Casa e, consequentemente, das comissões. 

  • Cooperativas

O projeto de lei que assegura a prestação dos serviços de telecomunicações por cooperativas (PL 1303/ 2022) avançou para decisão terminativa na Comissão de Comunicação Direito Digital (CCDD) do Senado, apoiada por organizações que já atuam, por exemplo, na área de energia elétrica. Grandes operadoras de telefonia têm receio de que a permissão possa trazer desequilíbrios competitivos ao mercado.

O avanço ocorreu no dia 10 de dezembro na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), a partir de parecer do senador Eduardo Gomes (PL-TO), presidente da CCDD. 

  • Reforma tributária

O Congresso Nacional concluiu o projeto de lei complementar (PLP) 68/2024, que trata da regulamentação da reforma tributária, com detalhes da implementação da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS), em substituição a tributos federais, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), no lugar de cobranças subnacionais, conforme previsto na Emenda Constitucional 132/2023.

O setor de telecom conseguiu emplacar a principal demanda, que mobilizou grandes e pequenos provedores, que foi a inclusão dos serviços de telefonia e internet no cashback de 100% da CBS e 20% do IBS, igualando ao patamar de outros serviços essenciais.

  • Regulação de IA

O Senado Federal aprovou o projeto de marco legal para a IA, com base principalmente no texto proposto por comissão de juristas e assinado pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) – PL 2338/2023 –, passando a bola para a Câmara.

Uma das principais preocupações do setor, acatada no texto, foi manter as competências da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) quando se tratar do setor regulado por ela.

O projeto assegura o papel dos órgãos setoriais como membros do Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA) e prevê atribuições compartilhadas com a coordenadora, Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Outro pleito do setor que foi acatado no texto diz respeito aos critérios para a classificação de risco. Pela proposta, sistemas considerados de “alto risco” estarão sujeitos a uma carga maior de obrigações regulatórias. Com isso, uma das sugestões apresentadas pelas teles e outros tipos de provedores de serviços digitais foi retirar o conceito de “larga escala” entre os parâmetros usados para determinar o risco, visto que qualquer aplicação estaria enquadrada, considerando a base de usuários.

Ainda como um ajuste em relação ao texto preliminar, houve a delimitação dos sistemas usados para gestão de infraestruturas críticas a serem considerados de alto risco, incluindo que a classificação valerá apenas “quando houver risco relevante à integridade física das pessoas e à interrupção de serviços essenciais, de forma ilícita ou abusiva, e desde que sejam determinantes para o resultado ou decisão, funcionamento ou acesso a serviço essencial”.

Projetos parados

Outros projetos permaneceram parados durante todo o ano, incluindo propostas que as grandes empresas são contra, como regras que contrariam o que já vem sendo discutido pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para gestão do compartilhamento de infraestrutura, e outras que tratam da remoção ou enterramento de cabos. 

Ainda entre proposições paradas estão novas obrigações acerca do direito dos consumidores, como o PL que prevê indenização por “tempo jurídico” causado por prática abusiva de prestadoras.   

Mudanças relacionadas aos fundos setoriais, que poderiam gerar redução da contribuição, também estão engavetadas. Apesar do Congresso Nacional acumular novos projetos relacionados ao Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), a novidade que efetivamente avançou se limita à emenda na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que proíbe o contingenciamento dos recursos.

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura de telecom nos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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