Vinhas Catão: A tributação na Internet das Coisas

A grande incógnita que paira é se a IoT deve ser tratada como um serviço puro e simples ou se deve ser inserido no arcabouço normativo de telecomunicações.

*Por Marcos André Vinhas Catão (foto), Sócio do Escritório Vinhas e Redenschi Advogados;
Luciana Prates C. Cordeiro, Advogada do Escritório Vinhas e Redenschi Advogados;
Maria Fernanda Sirotheau, Advogada do Escritório Vinhas e Redenschi Advogados

 

Na ausência de um marco normativo definido, a Internet das Coisas (Internet of Things – IoT) se projeta nos mais variados campos do direito, entre os quais, em matéria tributária. Do ponto de vista da natureza dos negócios jurídicos que se poderiam incluir dentro desse guarda-chuva, a Iot envolve de uma só vez plataformas, infraestruturas e programação.

De fato, do ponto de vista da aplicação de regras, a IoT exigirá a compreensão do suporte fático de cada negócio jurídico, de modo a estabelecer o tratamento jurídico adequado à cada uma dessas tecnologias. Condenar a modernização das relações digitais e econômicas em razão das dificuldades normativas não nos parece ser o caminho mais virtuoso, considerando o atual cenário de evolução tecnológica.

E esse é um desafio não apenas enfrentado pelo ordenamento jurídico brasileiro, mas também pelos países Europeus e especialmente pelos Estados Unidos, onde a IoT se encontra em exponencial crescimento. Essa evolução sem precedentes que afeta diretamente a forma com que vivemos e interagimos com máquinas, tende a aguçar conflitos que são inerentes ao Direito como o próprio conceito de jurisdição, vis-a-vis os elementos de conexão, tanto provedores quanto consumidores. , mormente em relação a operações B2B, não são em sua maioria das vezes, visíveis. Não é de se estranhar uma evidente inabilidade mundial dos sistemas jurídicos na adaptação das normas que se adequem aos avanços da tecnologia.

A verdade é que muito se tem discutido sobre os modelos de IoT. As empresas dos mais variados setores estão começando a otimizar as suas atividades através dessas soluções.

Em razão da economia digital caracterizar-se por sua estreita ligação com bens intangíveis, transferência massiva de dados cibernéticos e soluções tecnológicas, a definição de sua natureza se mostra cada vez mais complexa, de modo que, apesar das particularidades da economia digital, a adoção de uma definição engessada não nos parece ser adequada à pluralidade de modelos de inteligência artificial já existentes no mercado.

Mas qual é o dilema para a definição no contexto jurídico, em especial, tributário, em que a IoT se insere? Em resumo, a grande incógnita que paira é se ela deve ser tratada como um serviço puro e simples ou se deve ser dedicado à essa tecnologia todo o arcabouço normativo de telecomunicações.

Sob a perspectiva tributária nacional, se a IoT for tratada como serviço de valor adicionado à telecomunicação, sobre o produto incidirá carga fiscal igual a das empresas de internet: ISS e tributos federais.

Por outro lado, sendo considerada serviço de telecomunicação, a carga tributária será impactada pelo ICMS e demais taxas para os fundos setoriais, além de tributos federais, suportando uma carga de, em média, 35% sobre as prestações – uma das maiores do mundo no setor –, motivo pelo qual, cruzar a linha entre um serviço puro e simples e um serviços de telecomunicação é algo que a maioria das empresas tende a querer evitar. A verdade é que a IoT pode habitar ambos os campos.

Sob o aspecto superficial, toda IoT pressupõe uma transformação tecnológica de um bem, seja para a venda de um produto capaz de se conectar com outro produto, seja para a venda de um serviço que envolve uma conexão. Então qual seria a linha tênue que define a sua natureza?

Nos Estados Unidos um método que tem se mostrado eficiente para definir se estamos tratando de um simples serviço ou se estamos tratando de telecomunicação é a realização de testes. Isto é, quando um componente no dispositivo permite que um ser humano se conecte à internet para atividades como navegação, transmissão ou inicialização de aplicativos, ele estará inserido no campo de telecomunicações. Por outro lado, caso uma máquina esteja simplesmente usando a conexão de seu cliente para transmitir dados para outra máquina, sem qualquer input humano, não há nesse cenário o elemento de comunicação para fins de tributação.

Então, considerando a pluralidade de campos que a IoT pode se inserir, onde tantas aplicações são usadas para conectar coisas e transmitir dados, a questão não se resume em definir o que é IoT, mas sim analisar os instrumentos que permitem o funcionamento do dispositivo, o que os americanos chamam de “traga sua própria Internet”, no qual as conexões existentes dos clientes são usadas para transmitir dados de um dispositivo para outro. Estamos falando de uma prestação de serviço pura e simples, porém, se determinada IoT precisa de um input humano e é dotada de conexão própria, nesse caso estamos tratando de um serviço de telecomunicação.

Então, ao analisarmos uma IoT devemos partir da premissa que ou se trata de um serviço puro e simples ou se trata de uma modalidade de telecomunicação. A segunda etapa é questionar se a conexão é tão somente entre máquinas e, havendo uma conexão, se esta é fornecida pelo cliente. Se sim para ambos, a essa IoT deve ser aplicado o tratamento de serviço, sujeito ao ISS.

No Brasil os avanços com o tema ainda são sutis. É verdade que regimes de tributação e regulamentação incertos e complexos afetam a capacidade de investimento em novas tecnologias, muitas das vezes mais do que pela ausência de políticas de fomento, do que pela insegurança jurídica. Por isso urge um marco onde se priorize a simplicidade e a redução do grau de intervencionismo, para buscar uma adaptação ao eminente avanço da inteligência artificial, ante o prejuízo de nos tornarmos um país tecnologicamente defasado.

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