União de tecnologia e finanças tira poder de intermediários
Depois dos lançamentos dos fundos de índice (ETFs) de cripto QBTC11 e QETH11, a QR Asset Management, gestora de recursos do grupo QR Capital, lançou nesta semana, na B3, o primeiro ETF de DeFi do mundo. DeFi, ou “finanças descentralizadas” é um protocolo que busca retirar os intermediários das transações financeiras – sejam os bancos ou as próprias corretoras de criptomoedas. Sob o ticker “QDFI11”, o novo ETF está disponível para negociação nos terminais das principais corretoras.
Alexandre Ludolf, diretor de Investimentos da QR Asset, destaca que não é necessário fazer reservas, pagar taxa de estruturação e nem ter a complexidade de uma estrutura offshore, com uma taxa de administração de 0,9% a.a. Ele explica que as DeFi’s adquiridas pelo QDFI11 serão custodiadas pela Gemini, exchange fundada pelos irmãos Winklevoss.
O QDFI11 procurou selecionar as DeFi’s com maior probabilidade de sucesso seguindo o Bloomberg Galaxy DeFi Index, índice de referência 100% DeFi, com mais de um ano de histórico. Atualmente, a cesta do ETF conta com nove ativos. São eles: Uniswap (UNI), Aave Decentralized Lending Pools (AAVE), MakerDao (MKR), Compound (COMP), Yearn Finance (YFI), SushiSwap (SUSHI), 0X (ZRX), Synthetix (SNX) e Curve (CRV).
Nesta entrevista, Alexandr Ludolf fala do potencial das finanças descentralizadas, sobre a revolução da união entre tecnologia e finanças na chamada Web 3.0 e os cenários mais promissores no cenário DeFi global.
DMI: Qual o modelo de negócios da QR Asset?
Alexandre Ludolf: A empresa foi criada há três anos como uma holding de tecnologia e ativos digitais e vários negócios em cripto. Além da gestora, temos empresas de crédito, de tokenização. Com a evolução da legislação brasileira, lançamos inicialmente um fundo de bitcoin e percebemos que havia espaço para ETFs – sobretudo depois que a legislação canadense permitiu – lançando um dos primeiros ETF de bitcoin da América Latina. O segundo produto listado foi um fundo de Ethereum, que tem toda a infraestrutura de contratos inteligentes.
Mas não somos uma casa só de ETFs, nosso principal produto é o QR Blockchain Asset, em parceria com a Vítreo do Grupo BTG.
DMI: O que é e como funciona um ETF DeFi?
Alexandre Ludolf: A melhor forma de entender é por meio de analogia. Depois da internet e do computador, o mercado de finanças descentralizadas é maior evolução do mercado financeiro. O DeFi é uma força descentralizadora que permite produtos mais eficientes para o cliente e tira o poder dos intermediários. Um banco tem um spread elevado porque tem um monte de compromissos. No mundo de finanças descentralizadas existem apenas protocolos e regras de contratos que permitem criar produtos mais eficientes.
É interessante comparar com o mercado de fintechs, que democratizaram o acesso a serviços financeiros de maior qualidade. Olhando para cripto, é como se os produtos DeFi fossem uma fintech 2.0. Qualquer pessoa com acesso à internet consegue acessar os produtos, não há cadastro positivo nem restrição de Serasa. É somente uma confiança na matemática de produtos que oferecem vantagens tecnológicas. Quando se compra um produto como esse que estamos lançando, a pessoa tem acesso a produtos que tradicionalmente não tinha como de tesouraria, empréstimos, seguradoras.
DMI: Qual o potencial desse mercado?
Alexandre Ludolf: É um segmento novo que representa menos de 5% do mercado de cripto e ínfimo em relação aos produtos financeiros mundiais. Mas quando olhamos o que as fintechs fizeram, como o market share que a XP pegou dos grandes bancos ou a forma com o Nubank democratizou o cartão de crédito, acredito que essa tecnologia descentralizada – tirando toda a ineficiência e o poder que as organizações centralizadas têm de cobrar quanto querem – pode criar produtos mais eficientes.
DMI: DeFi e cripto necessariamente caminham juntos?
Alexandre Ludolf: Sim, DeFi é um subcomponente do universo de cripto. Voltando ao exemplo do computador e da internet, evoluímos até o celular que nos permitiu ter soluções inovadoras mudando a forma como pedimos táxis, namoramos, ou alugamos uma casa. Acredito que agora há uma nova internet sendo construída, a web 3.0. Na Web 1.0 só consumíamos os dados, na web 2.0 passamos a poder participar. Na Web 3.0, além de participar, podemos ter um pedaço dessa infraestrutura. A pessoa pode participar da infraestrutura com o Ethereum, ou do Metaverso, ou de games. São as chamadas descentralized applications.
DMI: Quando se investe em DeFi, está se comprando exatamente o quê?
Alexandre Ludolf: Esses protocolos tentam fazer os mesmos produtos centralizados, desde um produto bancário como crédito ou uma apólice de seguros. Essa curadoria que fizemos para a carteia do ETF DeFi QDFI11 foi feita em conjunto com a Bloomberg. O índice é agnóstico, não escolhe segmento e nem há restrição ao tipo de produto financeiro.
DMI: O ETF começou a ser negociado nessa terça-feira. Qual a sua expectativa? E o que você prevê com tendência no mercado de DeFi?
Alexandre Ludolf: O investidor médio brasileiro não tem ideia de quão avançada é a regulação nacional para este mercado de ativos digitais. Fomos o primeiro do mundo a lançar um produto com esse perfil. Eu realmente acredito que as tecnologias descentralizadas estão desenvolvendo uma nova internet. Finalmente, depois do advento das NFTs em 2021, estamos podendo oferecer produtos reais ao investidor brasileiro que está tendo oportunidade de participar de um novo Itaú ou numa nova Allianz, sem intermediários. A tecnologia superior, por mais que tenha uma resistência regulatória e de concorrência, acaba vencendo e poder participar de uma tendência global é muito importante. É uma revolução monetária e tecnológica. Foi iniciada há 13 anos com o nascimento do bitcoin e hoje vemos o florescimento de soluções para resolver outros problemas. É a coisa mais inclusiva que existe, o protocolo não faz distinção social.
DMI: É possível incluir os excluídos?
Alexandre Ludolf: O game Axie Infinity permitiu que muitas pessoas conseguissem renda com jogo, e optaram por jogar em vez de ser entregadores do ifood ou do Rappi, especialmente nas Filipinas.
DMI: O Bitcoin surgiu com a bandeira de eliminar um poder central. Como você vê a iniciativa dos governos em criar moedas soberanas digitais, as chamadas CBDC (Central Bank Digital Currency)?
Alexandre Ludolf: Eles querem o benefício da maior eficiência das tecnologias descentralizadas – a CDBC é um PIX melhorado – mas não querem abrir mão do controle. O cidadão para de ter um relacionamento com o banco e passa a ser controlado diretamente pelo Banco Central. Em termos de política monetária passa-se a ter um conhecimento muito maior do que está acontecendo com a economia e ainda tirar poder dos EUA em mecanismos como a rede Swifit, de transferências internacionais.
A construção da moeda digital chinesa tem muito controle e censura. O BC pode unilateralmente cancelar os Yuans digitais de um cidadão se achar que ele é um dissidente. Eles interferiram no Alipay e agora proibiram cripto no país. O risco é esse modelo de controle servir para o mundo, mas não acho que funcione para o ocidente.
Por: Carmen Nery