TCU diz que contas de todas as frequências do leilão do 5G precisam ser revistas

O Tribunal aponta como incompletos os estudos apresentados pela Anatel para encontrar os preços das faixas de 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e de 26 GHz, além da inexistência de documentação sobre as redes privativa do governo e da Amazônia (Pais). Somente depois de fornecidas todas essas informações é que começará a contar o prazo de 90 dias para o Tribunal se manifestar.
Primeira videochamada com o serviço foi uma ligação de São Paulo para Brasília

Está cada vez mais remota a possibilidade de o leilão do 5G acontecer nos meses de julho ou agosto deste ano. Isso porque, além das ilegalidades existentes na construção das redes  privativa do governo e da Amazônia (PAIS) já apontadas pelo relator do processo, ministro Raimundo Carreiro, para as quais o governo ainda não encontrou uma saída, há ainda muitas outras questões que, segundo o Tribunal, estão “incompletas” na documentação enviada, e que demandam muitas novas explicações da Anatel e do Ministério das Comunicações. Somente quando os questionamentos formulados forem respondidos a contento é que se começará a contar o prazo de 90 dias para a manifestação do Tribunal.

Conforme a íntegra do documento do TCU a que o Tele.Síntese teve acesso, enviado para a Anatel no dia 7 de maio, estão incompletas as informações que somam nada menos do que R$ 28,4 bilhões do total do preço mínimo calculado pela agência. Além das “incompletudes” nas informações há ainda uma outra relação de 15 questionamentos, tratados como “lacunas” pelo tribunal que precisarão ser respondidos pela agência, antes do o tribunal começar a analisar a documentação.

Embora as críticas à falta de informações consistentes sobre a Rede Privativa do Governo e o Programa Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS), sejam bem mais contundentes quando o tribunal aponta claramente para a “ilegalidade” da proposta de construção dessas duas redes, há também sérios questionamentos sobre os critérios adotados pela Anatel para encontrar os preços de venda das frequências de 700, 2,3 GHz, 3,5 GHz e de 26 GHz. Somados esses itens, esses questionamentos apontam para a soma de R$ 28,4 bilhões. A seguir os principais questionamentos do órgão:

1- Ausência de especificação técnica, de orçamento e de previsão editalícia de aspectos essenciais
do compromisso da obra da rede privativa de comunicação, valorada em R$ 1,260 bilhão

Segundo o Tribunal, a  Anatel incluiu o compromisso de rede privativa como o pagamento de um valor fixo, de R$ 1,260 bilhão (que corresponde ao R$ 1 bilhão sugerido pelo MC acrescido de uma margem de 26% definida pela agência), para a associação privada da EAF, que ficaria responsável por implantar essa rede no prazo de quatro anos. “Contudo, não há nos estudos entregues qualquer indicação sobre parâmetros básicos, como quantidade de pontos, pessoas e órgãos a serem atendidos”, aponta a Corte.

2- Ausência de especificações técnicas, repartição de riscos e definição de instrumento jurídico de transferência da obra da rede do Programa Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS), valorada em R$ 1,890 bilhão

O TCU constatou que há ausência de elementos necessários  para definir e dimensionar a obra, seus custos e prazo de execução, para a construção da rede do PAIS, especificação insuficiente das infovias e cidades a serem atendidas, ausência de especificação de valores financeiros, pesquisas de preços de mercado e de características técnicas. “Essas informações elencadas não constam dos documentos enviados pela Anatel ou pelo MC ao TCU e nem compõem os anexos aprovados da minuta do edital de licitação do 5G”, ressalta o TCU.

3- Ausência de informações que caracterizem as garantias de execução e outros mecanismos de enforcement para os compromissos, valorados em R$ 6,3 bilhões, e ausência de critérios de governança da EAF

Para o TCU, neste quesito, faltou à minuta do edital elaborado pela Anatel definir quais são, de fato, as responsabilidades da entidade privada EAF e de suas empresas associadas, que serão as vencedoras de lotes nacionais do 3,5 GHz, “bem como de eventuais sanções diante de cenários como um possível não cumprimento pleno dos compromissos pela entidade”.
O TCU questiona ainda, o fato de que não há, no edital, qualquer definição de quais serão os mecanismos de governança da EAF e do grupo de acompanhamento formado pelas vencedoras do leilão, pelo MCom e pela Anatel.

4- Ausência de referências, fontes e descrição metodológica suficiente para o cálculo da estimativa de receitas do serviço 5G no atacado, que representam, no mínimo, cerca de R$ 18 bilhões

Para a faixa de frequência de 3,5 GHz, a precificação foi realizada por intermédio de fluxo de caixa, no qual a Anatel estimou as receitas que a vencedora do lote obteria com a prestação do serviço de telecomunicações. Foram modelados pela Anatel três mercados  como os mais prováveis de serem explorados no lote de frequência do 3,5 GHz: prestar serviços de telefonia móvel para usuários finais; internet fixa para usuários finais; e atacado de telecomunicações para outras empresas que atuem no setor de telecomunicações ou em outros serviços.  Esse último tipo de serviço é denominado pela agência de linha de negócios de atacado ou “oferta de serviços de digitais e de automação (URLLC e mMTC)”.

O TCU apontou, no entanto, que, para esse serviço, a planilha feita pela Anatel  “apresenta valores colados e sem qualquer detalhamento metodológico, o que inviabiliza a compreensão dos números e auditabilidade do seu uso no estudo”

5- Incompletudes nos estudos de precificação das faixas de frequência de 2,3 GHz e 700 MHz

A precificação das faixas de frequência de 2,3 GHz e 700 MHz ocorreu por intermédio de fluxo de caixa. Todavia, nos estudos de precificação referentes aos modelos de negócios das faixas de 700 MHz e de 2,3 GHz, a Anatel não considerou a utilização dessas faixas para prestação de serviços em 5G, mas apenas para oferta de planos de voz e banda larga móvel na tecnologia 4G. “No entanto, é certo que as duas faixas mencionadas têm o potencial de utilização para serviços em tecnologia 5G, sendo uma tendência atual no mercado nacional e internacional”

6- Ausência de justificativa para a escolha dos países do benchmarking de precificação da faixa de 26 GHz, valorada em R$ 4,1 bilhões

O estudo de precificação dos 26 GHz é o único no qual a agência não utilizou a metodologia de fluxo de caixa, mas sim um benchmarking internacional. Mas, para o TCU, “o estudo não apresenta as informações relevantes de todos os países que foram
avaliados ou descartados no benchmarking realizado pela Anatel, como os valores de preço mínimo e o ágio da licitação, citados em alguns países, bem como a motivação técnica para exclusão de cada país”. Para o Tribunal, com a falta de informações mais detalhadas, não é possível a área técnica opinar sobre o preço calculado pela Anatel.

7- Ausência de motivação e clareza nos cálculos de precificação do estudo de viabilidade econômico-financeira das faixas de frequência a serem licitadas e dos compromissos do edital

Para o Tribunal, o novo sistema utilizado pela Anatel para fazer os cálculos dos preços das frequências, o Python, deve prever rotinas de cálculos ” explicadas de forma clara, didática e transparente não apenas para os servidores que elaboraram o código mas para todos aqueles que têm acesso a ele e trabalham com seus cálculos” 

8- Lacunas.

Por fim, entre as 15 lacunas que ainda precisarão ser melhor detalhadas pela Anatel ao TCU, foram elencadas, entre outras: incompatibilidades nas premissas do cálculo do raio da ERB em 700 MHz; ausência de precificação para os lotes regionais; ausência de referência para incluir no cálculo de cobertura de 95% da localidde, se não há essa obrigação no edital; ausência de fundamentação para desconsiderar receitas de ran sharing nas faixa de 700 MHz e de 2,3 GHz; ausência de referência para o incremento de 30% no ARPU do usuário de 5G.

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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