Setor reage a pedido da Starlink para explorar 7,5 mil satélites no Brasil

Viasat é a mais vocal contra o licenciamento da nova constelação da empresa de Elon Musk e diz que resultará em um monopólio dos serviços de satélite no Brasil. Claro, Vivo e TIM temem impacto sobre backhaul 5G.

(crédito: Freepik)

Terminou no dia 31 de julho a consulta pública da Anatel a respeito do pedido da SpaceX, que usa a marca Starlink, para explorar comercialmente no Brasil mais 7,5 mil satélites de baixa órbita. E houve forte mobilização das operadoras brasileiras nacionais e de satélite para questionar a solicitação.

A Claro apresentou o temor de que o serviço da Starlink interfira nos enlaces de Banda E utilizados pela operadora em sua rede terrestre de transporte. “Atualmente, temos enlaces de micro-ondas na banda E com presença em cerca de 50% do território nacional”, explica. Diante disso, pede cautela à Anatel.

“O assunto requer um aprofundamento para análise da possibilidade de convivência intersistêmica, o que demandará informações técnicas mais precisas acerca do Sistema GEN2 da Starlink, como a localização das estações terrenas, as características de radiação das antenas, capacidade de apontamento, potência de transmissão, entres outras informações que não são conhecidas”, diz a Claro na manifestação.

A Telefônica também aponta suas preocupações com o uso da Banda E pela provedora satelital, em função de possível impacto sobre o backhaul da rede celular. “É prematura a decisão de utilizar a Banda E sobre o satélite, assim recomenda-se que a Anatel aguarde o resultado de estudos para evoluir a utilização sem impactar as redes existentes”, indica.

Para a companhia, o pedido da SpaceX desafia o atual marco regulatório mundial que organiza a relação entre as empresas utilizadoras de espectro. “É necessário o acompanhamento do desenvolvimento de enquadramento regulatório adequado, em um esforço global por meio de partilha das melhores práticas, seja na criação de normais globais para a localização de objetos espaciais, a coordenação operacional para tornar o espaço mais seguro; seja no estabelecimento de normas e princípios para a remoção ativa de detritos ou o desenvolvimento de um quadro regulamentar para a exploração sustentável dos recursos espaciais”. E reclama da falta de informações técnicas sobre a proposta colocada em consulta.

A TIM apresentou também preocupação relativa a interferências que os satélites da empresa de Elon Musk podem ocasionar aos enlaces de microondas utilizados no backbone das redes 5G. Para garantir que haja harmonização, a tele diz: “é fundamental que as estações remotas da STARLINK sejam cadastradas no Sistema MOSAICO-ANATEL, em caráter secundário, para garantir a coordenação adequada de frequências e a proteção aos sistemas já em operação, evitando assim, impactos significativos na infraestrutura de micro-ondas das prestadoras e de difícil reversão”.

Operadoras de satélite

Futura concorrente direta no segmento de constelações de baixa órbita com o Projeto Kuiper, a Amazon também enviou sua contribuição. Nela, diz preocupar-se com a sustentabilidade espacial e potenciais colisões em órbitas congestionadas de artefatos. Assim, cobra a imposição de que os operadores de satélites usem equipamentos rastreados e, a 400 Km de altitude, capazes de realizar manobras.

“Diante dos muitos benefícios das tecnologias baseadas no espaço, incluindo conectividade, navegação, comunicações e resposta a emergências, tomar medidas ativas e ponderadas para proteger a sustentabilidade de longo prazo do ambiente espacial é cada vez mais importante”, traz a Amazon em sua contribuição.

Outra satelital que opinou foi a Hughes. A empresa também apontou preocupações com possíveis colisões e aperfeiçoamento da coordenação dos artefatos entre as empresas. Para o grupo, as donas de constelações precisam fornecer uma avaliação de risco de colisão de objetos grandes, planos de descarte de fim de vida, planos de mitigação de debris em órbita, planos de descarte pós-missão.

“A Anatel pode exigir que grandes operadoras de constelações, como a SpaceX, se coordenem com outras operadoras de satélites e compartilhem dados relevantes para aumentar a consciência situacional e reduzir o risco de colisões. Isso inclui fornecer informações sobre posições de satélite e manobras planejadas de forma constante”, escreve.

Viasat quer impedir liberação da nova constelação de Musk no Brasil

A Viasat, em sua posição, diz que a solicitação da SpaceX para lançar mais 7,5 mil satélites carece de informações técnicas detalhadas, não cumpre o Regulamento de Rádio da UIT e resultará em uma distorção da competição no Brasil.

Por isso, solicita que a Anatel negue o pedido da concorrente pelo direito de exploração da nova constelação de segunda geração sobre o Brasil e acesso ao espectro da Banda E.

“Não está claro no texto da consulta pública o que exatamente a SpaceX está requerendo. O pedido parece combinar (i) satélites nas órbitas e trajetórias adicionais limitadas, nas quais a FCC dos Estados Unidos permitiu à SpaceX operar 7.500 satélites adicionais; com (ii) aspectos de vários filings na ITU não autorizados pela FCC para uso pela SpaceX e que cobrem diferentes órbitas e trajetórias”, escreve.

Diz ainda que também não está claro de que forma a autorização do uso da banda E por uma constelação não geoestacionária tão grande seria compatível com o uso da faixa por satélite geoestacionário. “Minimamente, a Anatel não deve permitir que o sistema NGEO da SpaceX opere quando qualquer um dos satélites estiver ‘em linha’ entre um local na terra e uma rede GEO”, avalia.

E aponta ainda que a licença à Starlink poderia resultar em alta concentração de mercado. “Sem esclarecer que esses satélites e frequências adicionais teriam uma menor prioridade no mercado brasileiro para fins de coordenação, ficaria praticamente garantido à SpaceX o monopólio sobre essas faixas e ângulos de visão disponíveis no Brasil”.

A Viasat diz que os satélites da Starlink, posicionados conforme o pedido à Anatel, poderão bloquear o sinal de outras operadoras de artefatos geoestacionários. “Não só o acréscimo de mais satélites reduz a capacidade de encontrar um ângulo de visão adequado, como também a proposta da SpaceX para atender os usuários do ESIM, e implantar pequenos terminais terrestres reduzirá ainda mais a disponibilidade de ângulos de visão para qualquer outro operador NGEO. Isso afetará os usuários finais de qualquer concorrente da Starlink”, vaticina.

Falta de conformidade

O Sindsat, que reúne as operadoras de satélite Claro, Hughes, SES, Intelsat, Eutelsat e Hispasat, também critica o pedido da Starlink. Aponta que a o pleito não deve ser de mera adaptação do direito de exploração de satélite já outorgado. Deve ser tratado pela Anatel como um novo pedido, uma vez que a segunda geração dos artefatos da empresa têm outras características técnicas.

Como as demais, reclama da falta de informações sobre a rede, tanto no espaço, como em terra, e diz que a própria SpaceX reconheceu falta de conformidade da segunda geração de satélites Starlink com relação a interferências causadas na Banda Ka – a mais utilizada pelo setor para banda larga satelital.

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Rafael Bucco

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