Regulação das plataformas: as mudanças em debate para além da entidade reguladora
O Congresso Nacional e o Judiciário retomam as atividades nesta semana, após recesso em julho e com isso, volta também as expectativas sobre o avanço do debate sobre a regulação das plataformas digitais. O tema foi debatido nesta terça-feira, 1, em seminário realizado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em Brasília, abordando temas que vão além da questão sobre quem deve ser a entidade reguladora.
O secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República, João Brant, afirmou que é necessário deixar o texto do PL 2630/2020 – conhecido como PL das Fake News – mais explícito quanto ao fato de que nenhum órgão vai moderar conteúdos.
“Tem muita gente de boa-fé que acabou sem compreender o que era a discussão do PL 2630. O PL 2630 precisa que o conteúdo seja observado em um processo das próprias plataformas. Em processos, eventualmente, de autorregulação do setor, mas que os procedimentos [entre eles, relatório de transparência, análise de riscos sistêmicos e obrigações do dever de cuidado] estejam acompanhadas de um regulador que tenha a condição de dizer se estão cumprindo a lei, se não estão cumprindo e, se não estiverem, qual é a melhor forma de cumprir”, afirmou Brant.
Bia Barbosa, integrante da DiraCom (Direito à Comunicação e Democracia ) e representante do 3º Setor no Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), manifestou preocupação sobre sugestões que ainda estão em estudo como possíveis alterações no parecer.
“Nos preocupa muito uma perspectiva que está colocada no debate – apesar de não estar dessa maneira no projeto – que é uma perspectiva de determinar que as plataformas interpretem determinados conteúdos à luz de legislações inteiras e tenham o dever de remover esses conteúdos. Acho que isso traria um risco significativo para o exercício da liberdade de expressão e, felizmente, o texto do 2630 está caminhando par um arranjo que não é esse, apesar da gente saber que tem setores do governo que defendem”.
Marco Civil da Internet
O Supremo Tribunal Federal (STF) pode decidir sobre a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet, o qual diz que “o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências”.
Pra Brant, esse modelo de responsabilidade “gera uma hiperproteção à dimensão individual da liberdade de expressão, mas não protege adequadamente a dimensão social ou coletiva da liberdade de expressão”, no contexto de crimes de discriminação e ataques ao Estado Democrático de Direito. Por isso, o secretário sugere mudanças.
“Nós temos que pensar se o que a gente tem visto acontecer é fruto de uma dinâmica normal, em que o empoderamento do usuário gera um conjunto de casos que as plataformas precisam lidar nas suas regras, ou se há efeito – que tenho chamado de externalidades negativas – da própria dinâmica de funcionamento das plataformas nesse ambiente. Então, do nosso ponto de vista, e eu falo também pela discussão que houve nos últimos três meses, é preciso rever e discutir o modelo de funcionalidade que está no Marco Civil da Internet”, afirmou Brant.
Já Bia Barbosa ressaltou que a Coalizão Direitos na Rede, da qual a DiraCom faz parte, defende que o artigo 19 seja “mantido na sua essência”. “A gente defende a manutenção do regime de responsabilidade que está previsto no Marco Civil da Internet” em relação a conteúdos postados por terceiros, [no sentido de que] a responsabilidade só começa no momento em que as plataformas decidem manter o conteúdo no ar”.
“A internet não é só as redes sociais. Uma mudança nesse regime de responsabilidade [ no Marco Civil da Internet] vai impactar o funcionamento de absolutamente todos os provedores de conteúdo da internet, que vão muito além das redes sociais, ferramenta de busca ou aplicativos de mensageria. Haveria riscos significativos para a liberdade de expressão”, opinou Barbosa.
Não há previsão de quando o tema será pautado pelo Supremo.