Políticas públicas, sociedade, educação e banda larga

É utópico imaginar que o governo isoladamente conseguirá os vultosos recursos necessários para um indispensável programa de banda larga de dimensões nacionais
Antonio Ribeiro dos Santos (foto do autor)
Antonio Ribeiro dos Santos (foto: Divulgação)
(foto do autor)
Nelson Takayanagi
(foto: Divulgação)

*Antonio Ribeiro dos Santos e Nelson Takayanagi

Uma reflexão necessária surge da observação de um país como o Brasil, que proporciona a seus cidadãos bem-estar de primeiro mundo, mas ainda convive com bolsões de miséria disseminada, usualmente encontrada em países subdesenvolvidos.

A perplexidade provocada por esta constatação deve levar os líderes e cada cidadão individualmente a questionar seu papel e sua participação no contexto social geral e a procurar soluções para tal problema, com ações e atitudes efetivas.

Para tanto, é fundamental entender as desigualdades que se mantém e até se acentuam a cada dia, após centenas de anos de cultura Colonial, de Império e de República, a despeito de inegáveis progressos verificados ao longo do tempo.

Quais as razões que levam a sociedade brasileira a ocupar uma posição indesejável no ranking das desigualdades entre os povos e como encontrar saídas e servir de exemplo para os demais?

Talvez o desenvolvimento tecnológico e econômico não represente alternativa única na busca de um melhor posicionamento, quando comparado com o cenário internacional, em quesitos como paz, violência, segurança, trabalho, família, ética e prosperidade para todos.

Começa a tomar corpo a percepção de necessidades de soluções de longo prazo, para reconstruir identidades e conceitos culturais que fazem parte de sua história, arraigadas há séculos nos hábitos e modo de vida de seus cidadãos e no funcionamento de suas instituições. Paradoxalmente, alguns destes princípios têm sido prejudicados e, mesmo, destruídos pela torrente de informações perniciosas que circulam livremente e muito rapidamente pelas estruturas de comunicação proporcionadas pela tecnologia moderna, sustentadas pela Banda Larga.

O quadro agrava-se, com escassas perspectivas de melhoria no curto prazo, em função do ainda elevado índice de desemprego, da progressiva vulnerabilidade familiar e da falta de perspectivas sólidas no horizonte de diversas camadas sociais.

Na esteira desses quesitos surgem as naturais dificuldades de vida das pessoas. Estas, associadas a uma indesejável tendência à degradação dos costumes, ao sistemático e inconsequente desrespeito ao legal, e ao aumento do individualismo, berço de antissocial egoísmo, acabam por descambar numa disseminada apatia e num preocupante descompromisso coletivo com o futuro, certamente não intencional, mas, indubitavelmente, factual.

Num cenário desta natureza, no qual não se vislumbra uma solução rápida para o aumento do emprego nos níveis necessários, em que as pessoas não se sentem seguras para desempenhar livremente suas atividades,  e reflete uma realidade de baixa estima entre a população, torna-se cada vez mais importante traçar para a sociedade um rumo, um sonho a perseguir, fundamentado em políticas públicas de longo prazo.

Essa é a difícil tarefa de busca do bem comum. De uma forma que toda a sociedade entenda, aceite, e se envolva com convicção, na direção de se construir um futuro melhor, mais digno para as gerações que sucederão a atual. Para tanto, além dos desejos e dos aspectos teóricos há a prática a ser desenvolvida.

Termos e conceitos fundamentais como, por exemplo, educação e banda larga, essenciais na consecução de qualquer projeto sério na direção apontada, podem ser interpretados de modo muito genérico e levar a entendimentos díspares, por vezes descolados da realidade. Consequentemente, o conjunto das pessoas não chega a compreender bem o que se quer e onde se deseja chegar.

Isto, fatalmente, reduz as chances de sucesso de inúmeros programas lançados por sucessivos governos: muito alardeados, mas pouco efetivos. As estatísticas, infelizmente, estão aí para comprovar esta afirmação demonstrando os equívocos cometidos, ainda que involuntários.

Centenas de anos e diversos programas educacionais não permitiram reduzir as desigualdades, na dimensão desejada, nem proporcionar melhorias coletivas da qualidade de vida, de modo mais impactante, principalmente quando se estabelece uma comparação com países que conseguiram se superar com ações neste sentido.

Neste ponto, ressalta ainda mais o papel das telecomunicações e a importância do acesso à informação por toda a sociedade, proporcionado pelo uso disseminado da popularmente denominada Banda Larga.

Contudo, estabelecer que a Banda Larga, por si só, seja a solução ou o caminho para superar as históricas deficiências do processo educacional, também esbarra na abrangência ou nas dificuldades de se imaginar o que está por trás desse conceito. No fundo, depara-se com o desafio de entender como se coloca a educação no contexto das radicais e aceleradas transformações da sociedade moderna, proporcionadas por vertiginosa evolução tecnológica, sem dúvida alavancada pela própria evolução das telecomunicações.

Para o cidadão comum, um líder político ou um especialista, mesmo não sendo leigo, o termo Banda Larga leva a entendimentos diferentes, conforme ele se encontre no centro ou na periferia do tema. Isto, ressalta a dificuldade de se convergir para um conceito que seja unanimemente aceito, ponto essencial de partida para se chegar a resultados concretos.

Ademais, para que isto seja possível, é imprescindível a disponibilidade da “Banda Larga para Todos” ou do seu análogo “Internet para Todos” dentro de parâmetros comerciais e sociais adequados, atendendo ao amplo conceito da Universalização dos Serviços de forma a “não deixar ninguém para trás”.

É fundamental que, para tanto, haja interessados com recursos e com expertise, na prestação de Serviços de Banda Larga, naturalmente na expectativa de auferir resultados econômicos. É utópico imaginar que o Governo isoladamente conseguirá os vultosos recursos para um indispensável Programa de dimensões nacionais, que atinja os mais longínquos rincões do país. Mas, seu envolvimento, sem dúvida, é essencial, apoiando em tudo o que esteja ao seu alcance para a concretização prática das ações.

Os agentes da iniciativa privada seguramente se propõem a fazê-lo, no contexto das inúmeras oportunidades proporcionadas por um Setor dinâmico e essencial ao desenvolvimento econômico e social de qualquer nação.

Contudo, o processo que idealmente deve estar consolidado em documentos apropriados, demanda o rigor da conceituação técnica; a existência de um arcabouço regulatório que dê segurança jurídica; a liberdade de atuação dentro dos princípios da livre concorrência; o controle para evitar eventual competição predatória que leva a resultados antieconômicos; e, reiterando, o apoio governamental no fomento de uma atividade de interesse público, essencial no suporte de outras iniciativas desenvolvimentistas.

Isso leva a debates importantes e necessários, entre outros, sobre: a velocidade do transporte dos sinais; o volume de sinais transportados que a sociedade idealmente entende como “ilimitado”; os processos e redes de conectividade; a largura de banda; a cobertura, confiabilidade, segurança (qualidade do serviço); a segurança dos dados; tecnologias e inovação; o aumento da flexibilidade e redução, proposital ou não, da velocidade de transmissão no transporte dos sinais. Enfim, ao conjunto da infraestrutura que suportará a prestação dos serviços. Uma questão sobre a qual não se pode desconsiderar o aproveitamento e a evolução da infraestrutura existente, tanto em termos de expansão como de inovação.

Outro fator fundamental relativo à Banda Larga leva a entendimentos comuns sobre temas que envolvem, por exemplo, o “conteúdo” a ser transportado e suas relações com: a privacidade das pessoas e das informações de modo geral; a prioridade no seu uso em programas generalizados voltados, entre outros, para a educação, saúde pública, segurança pública e mobilidade urbana; a questão da democratização do acesso às redes e à informação; os elevados  tributos incidentes sobre a prestação dos serviços; os custos finais dos serviços de modo geral; e, como resultado objetivo, a tão desejada redução das desigualdades sociais empregando as ferramentas disponibilizadas pelas telecomunicações, no suporte a avançados sistemas educacionais.

Não há como dissociar os interesses sociais dos econômicos e tecnológicos. Assim é fundamental que a nova dinâmica digital a ser utilizada no País não descambe para situações de emprego qualificado para poucos (tecnologicamente privilegiados); possa ser, ao contrário do desejado, indutora do aumento das desigualdades; e na prática, não seja suficiente para evitar um distanciamento ainda maior dos países que conseguem melhores indicadores sociais atrelados às iniciativas de desenvolvimento econômico.

Essa dinâmica da construção social vinculada ao desenvolvimento econômico suportado pela evolução tecnológica, exige processo de amadurecimento, de compreensão profunda das necessidades, e, sem dúvida, uma visão humanista no trato das coisas públicas e privadas, sem descuidar da capacidade de criar e de um certo altruísmo na condução dos processos.

 

Antonio Ribeiro dos Santos, Analista, Engenheiro Eletricista, Professor da UnB, e Consultor Principal da PACTEL

Nelson Takayanagi, Engenheiro, Mestre e Doutorando em Educação, ex-Telebras e ex-Anatel.

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