Para preservar cabos submarinos, Anatel se opõe à construção de usina em Fortaleza

Um debate que envolve o governo do Ceará e a prefeitura de Fortaleza, o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, a Anatel e o Ministério das Comunicações desde 2021 avança para um desfecho com a recente posição da Superintendência de Obrigações da agência.
Anatel quer preservar cabo submarino de Fortaleza. Crédito-Tele.Síntese
A construção de usina de dessanilização põe em riscos os cabos submarinos. Crédito-Tele.Síntese

Um debate que envolve o governo do Ceará e a prefeitura de Fortaleza, o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, a Anatel e o Ministério das Comunicações desde 2021 avança para um desfecho a partir do recente parecer da superintendência de Controle de Obrigações da agência, que se opôs formalmente à construção da usina de dessanilização na Praia do Futuro, em Fortaleza, Ceará, para preservar os cabos submarinos que ali aportam.

O parecer contra o projeto do estado – que tinha feito a licitação e declarado o vencedor-, já foi referendado pelo presidente da Anatel, Carlos Baigorri, que já encaminhou ofício com a posição da área técnia para que todos os envolvidos tomem as providências para a escolha de outro local para a construção dessa usina. O posicionamento da superintendência vem com o peso de sua atribuição de gerir os riscos às infraestruturas críticas de telecomunicações.

A polêmica

O governo cearense, através da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) abriu licitação para a implantação de uma usina de dessanilização da água marinha para o consumo humano, que, segundo anunciava o governo,  “será a maior em extensão na produção de água”. Em março de 2021 a licitação para a construção, operação e manutenção da usina foi vencida pelo consórcio Águas de Fortaleza, liderado pela empresa cearense Marquise. A Anatel, ao tomar conhecimento da localização do projeto e, ao fazer o primeiro estudo sobre a obra, constatou que a implantação dos dutos para a captação de água do mar pela usina poderia romper os dutos de telecomunicações com fibra óptica ou mesmo romper o próprio cabo submarino repousado no fundo do mar.

A partir de então, iniciaram-se as negociações e troca de ofícios sobre a viabilidade técnica e o interesse público do projeto e as ameaças que ele trazia. Para o governo do Ceará, as alterações técnicas feitas durante as negociações garantiriam a continuidade das obras e, o mais importante para o governo,  seria preservado o interesse público no atendimento à população cearense.

Para as operadoras que têm cabos lá ancorados – Angola Cables, China Unicon, Claro, EllaLink, Telxius e V.tal (em nome da Globenet), no entanto, não se tratava de contraposição entre o interesse social por parte do consórcio Águas de Fortaleza e das operadoras privadas de cabo submarino, mas sim, havia dois interesses sociais e públicos distintos. ” Os cabos submarinos são estruturas críticas de telecomunicações, que o Brasil se comprometeu a proteger no plano internacional”, argumentaram as operadoras.  Para as empresas, o projeto da usina era incompleto em relação ao impacto que  poderia causar aos cabos on shore, sem descartar os riscos de rompimento da estrutura submersa.

Durante as negociações, a Anatel buscou a posição do Internacional Cable Protection Commitee (ICPC), que se manifestou preocupado com o pouco espaçamento que haveria entre as estrutura de telecom existentes e as tubuluações da usina a serem construídas.

A posição da Anatel

Para a área técnica da Anatel, não há dúvidas sobre a importância do projeto cearense, que visa ampliação da oferta de água potável para sua população, assim como a legitimidade dos interesses defendidos pelos entes públicos e privados, mas a agência entende que houve “uma avaliação de riscos desproporcional – a menor- nas fases de estudos tanto para a escolha do local, como para a interação com as estruturas de telecomunicações lá instaladas”.

A agência argumenta ainda que a infraestrutura de telecom instalada em Fortaleza proporcionou uma grande propulsão econômica da região, na medida em que foram instaladas diversas outras empresas, como provedores de data center e de serviços digitais. ” Alterar tal infraestrutura de lugar é inimaginável, pois envolve uma série de proprietários privados nacionais e internacionais com graves repercussões para o país. Por outro lado, a infraestrutura de dessanilização, ainda que atenda a um interesse público estadual legítimo, ainda não foi construída e possui outras localidades como opção”, argumentou.

E ponderou ainda que, se a usina já estivesse ali instalada, a praia do Futuro “certamente não seria o local escolhido para receber as infraestruturas marítimas e terrestres relativas aos cabos ópticos transoeânicos”.E assinalou que uma eventual interrupção de um desses cabos, a depender do grau e abrangência ” afetaria de maneira impactante a economia e soberania do país”. Assim, a superintendência de Controle de Obrigações da Anatel manifestou-se pela “oposição à construção da usina em proximidade aos cabos submarinos instalados na Praia do Futuro”.

 

 

 

 

 

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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