Nova Lei do Fistel, que mexeu em nove leis, continua a provocar reações
A Lei 14.173/21, publicada hoje, 16, no Diário Oficial da União, continua a despertar reação dos diferentes segmentos de mercado atingidos pela medida, que teve uma tramitação em forma de Medida Provisória fulminante no Congresso Nacional, sem que fosse realizada uma única audiência pública para tratar dos assuntos que foram nela incorporados.
Criada inicialmente para atender a um pleito da indústria de satélite, que queria ter a taxa de fiscalização (Fistel) equalizada aos valores da telefonia celular, a Medida Provisória que virou lei acabou mexendo na lei do Fundo de Universalização das Telecomunicações, na Lei Geral de Telecomunicações, no Código Brasileiro de Telecomunicações, na Lei que criou o SEaC (Serviço de Acesso Condicionado), na Lei que regula as emissoras de TV de Amazônia Legal, na Lei que estabelece os limites à exposição às radiações radioelétricas, e por fim nas leis que tratavam diretamente do imposto para as antenas do satélite: a Lei que criou a Ancine, com a Condecine, a Lei do Fistel propriamente dita e a a Lei do fomento à radiodifusão pública.
Com tantos “jabutis” que surgiram com a tramitação do projeto, os grandes estúdios de produção de conteúdo audiovisual nacional e internacional lamentam que somente o pleito deles acabou sendo vetado pelo presidente Jair Bolsonaro. Trata-se do veto às alterações legais que previam a redução em mais de 90% do pagamento das taxas que devem ser recolhidas à Condecine para os serviços de Video On Demand (VOD), ou streaming.
Conforme uma fonte desse segmento, na verdade, a proposta de redução da Condecine não poderia ser considerada um “jabuti” frente aos demais que foram aprovados, até porque a Medida Provisória original foi elaborada justamente para alterar as taxas da Condecine, do Fistel e da Radiodifusão Pública. Essas três taxas, na verdade, anteriormente eram concentradas unicamente no Fistel, e novas proposições legislativas acabaram deslocando uma parcela desses recursos para fins específicos, como a da Condecine, criada para fomentar a produção do audiovisual nacional, e a da radiodifusão pública, criada para sustentar a EBC.
Argumenta esse interlocutor: ” por uma interpretação antiga da Ancince, o VOD (ou vídeo on demand) está enquadrado na categoria de “outros mercados”, que se tratam de mercados residuais, e por isso, nunca se conseguiu cobrar, pois a Condecine é baseada em títulos. Mas ao se cobrar essa taxa, acaba-se “matando” a beleza do vídeo on demand, que tem “cauda longa”. Pagar Condecine sobre títulos, desestimula que se coloque conteúdos de nichos, que não tem espaço em locadoras, cinemas e grades de programação”.
Mas os produtores nacionais, representados pela BRAVI (Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão), reclamaram, durante a aprovação do projeto no Congresso Nacional, dessa isenção, tendo em vista que seriam retirados recursos para o fomento do audiovisual.
Mas as razões do veto, expostas pelo Palácio do Planalto, foram puramente econômicas e não se basearam na produção do cinema nacional. O argumento principal é o de que o Tesouro iria perder arrecadação. Isto porque, como se sabe, desses recursos arrecadados uma ínfima parcela é direcionada para os fins para os quais foram criados. A sua maioria – e estamos falando em cerca de R$ 200 milhões do audiovisual e cerca de R$ 1 bilhão das teles – vai mesmo para o Leão.
Antenas e emissoras de TV do Norte
Outras alterações legislativas promovidas na nova lei estão bem distantes ao conteúdo original da proposição, embora os segmentos que foram por elas contemplados tenham argumentos legais para defendê-las. Uma dessas mudanças trata do fim da obrigatoriedade do compartilhamento de antenas de telecomunicações à distância de 500 metros, que estava explicitada na lei de emissões radioelétricas.
Embora a maior entidade patronal do setor – a Conexis – tenha elogiado a medida e considerado natural a inclusão desse tema nesta Medida Provisória, que também tratava de questões vinculadas às empresas de telecomunicações, o fato é que um novo modelo de negócios que se fortalecia no Brasil, o das empresas de infraestrutura de telecomunicações, será afetado por essa nova regra. O quanto isso impactará no modelo dessas empresas, ainda não se pode mensurar, e se a revogação dessa obrigatoriedade de compartilhamento poderá gerar novos conflitos urbanos na instalação de novas antenas, também só o tempo dirá.
Mas uma outra alteração referendada pela sanção presidencial certamente terá impactos monetários grandes para as operadoras de TV por assinatura, o único segmento que ainda carrega uma enorme carga regulatória, em contraposição aos seus concorrentes diretos, livres e soltos fornecedores do mesmo serviço pela internet. A nova lei, além de dar voz a emissoras religiosas e evangélicas no Norte do país, ao liberar a retransmissoras de produzirem programação local, como se geradoras fossem, obriga que esses canais sejam transmitidos nos pacotes das operadoras de TV paga. Com audiências em traço, essas emissoras passam a ganhar a confortável posição de ingressar, de graça, no line up das operadoras de TV por assinatura, que terão que arcar, estima-se, perto de R$ 50 milhões para alterar seus sistemas e equipamentos.
Fust
A nova lei pelo menos destravou a possibilidade de um dia as operadoras usarem os recursos do Fust (Fundo de Universalização das Telecomunicações) para a ampliação dos serviços à população de baixa renda e áreas isoladas. Mas ainda há muitas dúvidas – o Senado Federal, por exemplo, rejeitou a alteração, que foi resgatada pelos deputados – se o fato de não se priorizar os recursos para os municípios com menor IDH, estará se escancarando a porta para projetos menos republicanos. A conferir.
A íntegra da nova Lei: