Leilão reverso piloto vai testar interesse das teles por conexão de localidades

Em entrevista, Antonio Martelletto, CEO da Seja Digital, conta que a proposta no momento é que os editais prevejam responsabilidade das operadoras vencedoras até o vencimento de suas outorgas de espectro.

A EAD – Seja Digital, já começou a trabalhar na elaboração do leilão (ou leilões) reverso para destinar R$ 250 milhões à conexão de localidades em todo o Brasil. A utilização deste dinheiro foi definida pelo Conselho Diretor da Anatel no começo de agosto.

Os recursos, que sobraram da digitalização da TV analógica, vão para construção de rede móvel em áreas onde não é lucrativo para as operadoras atuarem – ou seja, distritos ou zonas rurais com VPL zero ou negativo. Poderão concorrer operadoras donas de espectro em caráter primário na região, embora estas possam atender o compromisso com espectro em caráter secundário.

Dessa forma, espera-se a participação das grandes teles nacionais Claro, TIM e Vivo, mas também das regionais Brisanet, Iez! Telecom, Ligga Telecom e Unifique. Estas últimas, embora tenham licenças para uso da faixa de 3,5 GHz, contam já com autorização da Anatel para explorar banda de 700 MHz em caráter secundário – espectro mais eficiente em termos de cobertura para áreas menos povoadas – em milhares de cidades.

Antonio Carlos Martelletto, presidente da EAD (Foto: Divulgação)

A EAD já constituiu um Grupo de Trabalho SMP, para o qual todas as operadoras donas de frequências foram chamadas a participar, conta Antonio Carlos Martelletto, CEO da Seja Digital. O GT vai elaborar as premissas do edital, que serão aprovadas pelo Gired. O primeiro leilão será um piloto, a fim de verificar o interesse das empresas na proposta. A partir de então, a Seja Digital vai realizar quantos leilões forem necessários para esgotar os recursos.

Confira, abaixo, a entrevista do executivo ao Tele.Síntese:

O Conselho Diretor da Anatel aprovou a realização de leilões reversos com recursos que sobraram da digitalização da TV no Brasil para financiar a chegada do 4G (ou superior) a localidades hoje não atendidas. A EAD – Seja Digital já começou a elaboração dos editais?

Antonio Carlos Martelletto, CEO da EAD – Seja Digital: Criamos no dia 22 dois grupos de trabalho. O GT SMP, que vai trabalhar em cima da entrega desse projeto de conectividade, e o GT Radiodifusão, responsável pelos projetos ligados a TV. Cada um responsável por elaborar as regras para uso de 50% dos recursos, ou seja, R$ 250 milhões cada. O projeto de conexão de localidades é considerado prioritário. Até agosto tem que estar concluído. E por concluído, significa que as ERBs, as estações das operadoras, já têm que estar instaladas e ativadas. Essa é a diretriz que o Gired recebeu do Conselho Diretor da Anatel, e é nisso que vamos trabalhar.

O Gired, no passado, foi palco de disputas pelos recursos entre a radiodifusão e o setor de telecom. Com a divisão já definida pelo Conselho Diretor da Anatel, ainda há chance de embates?

Martelletto: Os grupos formados são técnicos. Vão apresentar os estudos ao Gired, que então vai dizer se aprova o que o GT sugerir. E tanto os GTs, quanto o Gired, são coordenados pela Anatel.

Os  grupos têm representantes da radiodifusão e das operadoras. O GT do SMP é aberto a todo mundo, para haver a possibilidade de cobrir municípios em todas as regiões. Obviamente, que neste caso, as operadoras vão se pronunciar mais, enquanto no GT Radio, a participação mais ativa será das associadas da radiodifusão. E tem ainda os representantes da Anatel e do MCOM.

Você disse que há abertura para todos participarem. O Artur Coimbra afirmou no dia que aprovaram a destinação dos recursos que todo SMP poderia participar. Alguma exigência adicional?

Martelletto: O que temos conversado é que toda empresa com licença SMP e com outorga de espectro em caráter primário na região pretendida pode participar. Todas as empresas que compraram lotes regionais de espectro no último leilão da Anatel foram convidadas a integrar o GT. O que poderemos ver no edital, com essa premissa, será uma operadora nacional concorrendo para cobrir localidades com uma operadora regional.

Então, para fins de exemplo, a Brisanet, que obteve licença no Nordeste e no Centro-Oeste, só poderá disputar os recursos nestas regiões?

Martelletto: Isso, mas ainda estamos conversando sobre isso. Pois entra também uma discussão técnica, a de que a faixa de 3,5 GHz pode não ser a melhor para cobrir as localidades. Neste caso, os regionais podem participar, e na hora de implementar, recorrer aos 700 MHz em caráter secundário se acharem conveniente. Mas tem que garantir a conectividade: se o detentor primário solicitar depois os 700 MHz, a regional terá que manter o serviço com a licença primária que ela tiver. Mas isso ainda está em discussão.

Até quando o GT precisa concluir o trabalho em cima do edital?

Martelletto: Existe uma intenção de que a gente lance esse edital muito rapidamente. Então vai realmente depender do entendimento comum entre todas as partes que estão envolvidas do grupo técnico. O único prazo que temos mesmo é que em um ano a conectividade das localidades tem que estar concluída.

E já vai ter qual obrigação?

Martelletto: O principal compromisso é que a estação deve estar instalada em 12 meses. Se houver algum empecilho, o GT também vai avaliar. O primeiro vai ser um leilão piloto, com poucas localidades, para testar o modelo e ver a atratividade. Depois, deve ter mais dois ou três leilões, com o maior grupo de localidades.

O conselheiro Artur Coimbra estimou haver cerca de 4 mil localidades hoje que não são alvo de nenhuma política pública e podem ser beneficiadas. Sabe quantas devem entrar nestes leilões?

Martelletto: Este é o número de localidades pendentes de cobertura, mas não significa que há recursos para todas, infelizmente. Então a disputa vai ser direcionada a um grupo de localidades cujo número total vai depender dos lances apresentados. Quanto menores os lances em relação ao valor de referência, mais conexões serão possíveis.

Como as localidades serão definidas?

Martelletto: Caberá ao Ministério das Comunicações elencá-las como alvo da política pública.

Você mencionou valor de referência. Já se tem uma ideia de quanto é?

Martelletto: É algo que o GT vai analisar. O que tem se falado informalmente é que uma implantação custe cerca de R$ 1,25 milhão. Caso isso seja comprovado, haveria recursos para 200 localidades. Se os lances apresentados forem a metade disso, então vão ser 400 localidades etc. Portanto, depende mais é dos lances do que do valor de referência. São áreas com VPL zero ou negativos, então cabe às empresas avaliarem dentro de suas estratégias.

E como isso se dará na prática? Faz-se dois ou três leilões, de 200 localidades, e ainda sobrou dinheiro. O que acontece?

Martelletto: Vamos ter vários leilões, até o dinheiro acabar, até consumir todos os R$ 250 milhões.

Tem algum outro compromisso?

Martelletto: Está tudo a cargo do ministério, que vai discutir esse assunto com a Anatel. A Seja Digital não tem nenhuma interferência nesse processo.

A empresa que ganhar um leilão, terá de manter a rede naquele local que tem VPL negativo por quanto tempo?

Martelletto: Pelo tempo de duração da licença de espectro dela na região. Se não me engando, o espectro comprado em 2021 tem outorga até 2041.

Pelo que se tem até o momento, qual sua percepção como executivo longevo do mercado? Haverá interesse?

Martelletto: Vamos ter que experimentar. O piloto é exatamente para ver a atratividade. Nosso papel aqui, como EAD, é viabilizar o processo e acompanhar para certificar que quem ganhar cada localidade fará a ativação. Até porque, a operadora só receberá o recurso depois que finalizar e comprovar a implantação do projeto.

Então não é tanto um financiamento, mas um reembolso pelo investimento…

Martelletto: A empresa tem que comprovar que instalou de acordo com as regras. A partir dali, é validado pelo Gired, e aí os recursos serão transferidos.

Um ano para leilão e implantação da rede não é pouco tempo?

Martelletto: Acho que o maior desafio é chegar na fórmula da atratividade. O desafio de implantação é pequeno, pois isso já é do dia das operadoras.

O GT SMP está mais acelerado que o GT Radiodifusão?

Martelletto: Já teve reunião. O da radiodifusão, acho que a primeira reunião será agora em meados de setembro. Os projetos da radiodifusão têm que estar concluídos até 2026. Mas lembrando, nosso papel como Seja Digital é ser o gestor dos processos. Estamos seguindo à risca o que foi definido pelo Conselho Diretor da Anatel, que traçou o cronograma de 52 semanas para o caso do SMP.

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Rafael Bucco

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