Governo prepara minuta de banimento da Huawei e operadoras se chocam com o custo da irracionalidade
A Conexis, entidade que representa as maiores operadoras de telecomunicações do país (que investem mais de R$ 20 bilhões ao ano), divulgou hoje, 27, um documento em que as suas associadas demonstram-se ” preocupadas com as incertezas geradas por essas discussões [de restrição de fornecedores], e ressaltamos a necessidade de transparência de todo o processo, prezando assim pelo princípio fundamental da livre iniciativa presente em nossa Constituição Federal”.
As operadoras, nesse processo de discussão sobre a manutenção da Huawei do mercado brasileiro, provocado muito mais por questões ideológicas do que técnicas, estavam bem mais contidas sobre o tema, pois confiavam que o debate público poderia abordar todos os ângulos desse problema que no final iria amenizar qualquer ação mais restritiva. Esse posicionamento começou a mudar recentemente, com o convite da embaixada norte-americana ao apoio à “Clean Network” (ou “Rede Limpa”), quando as operadoras “declinaram do convite”.
Conforme um executivo, logo depois desse incidente, com a mudança do cenário internacional (vitória de Biden nos Estados Unidos) as empresas avaliaram que não haveria mudanças nas atuais regras, e que o mercado não sofreria qualquer intervenção governamental. Mas a reunião dessa terça-feira, dia 24,quando o ministro das Comunicações Fábio Farias, levou os diretores da Anatel e staff ministerial para reunião com o presidente Jair Bolsonaro, as operadoras resolveram agir mais ativamente.
Conforme diferentes fontes, a reunião não foi marcada para “apresentar” Carlos Baigorri, o conselheiro que assumiu a Anatel havia já 15 dias, ao presidente. O governo esperava ali um posicionamento dos técnicos da agência reguladora que justificasse o banimento da fabricante chinesa. Vale lembrar que, logo depois dessa reunião, um dos filhos do presidente vai para as redes sociais acusar o governo chinês de “espionar” o Brasil, o que gera uma forte reação da embaixada chinesa.
A Anatel, com técnicos reconhecidamente qualificados no setor de telecomunicações, posicionou-se como qualquer agência de Estado autônoma deve fazer: ponderou que quem faz política pública é o governo, cabendo à ela, Anatel, estabelecer as regras para cumprir essa política.
Ou, trocando em miúdos, quem quer banir algum fornecedor, que encontre a lei para isso. E é justamente nesse ponto que há o problema. Como justificar esse banimento, que não seja por uma medida de exceção? A base da iniciativa do Palácio do Planalto é a norma 4 do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), publicada em março deste ano, e que define os requisitos mínimos de segurança cibernética que devem ser adotados na implantação das redes 5G. Na reunião, chegou-se a comentar que o decreto deveria ser feito de tal forma que “que não fale sobre o banimento de qualquer empresa, mas que uma empresa específica não consiga cumprir”.
Operadoras
As operadoras, ao analisarem o desdobramento desse encontro, avaliaram que um possível banimento da fabricante chinesa estava bem mais próximo e lançaram essa carta insistindo na abertura do diálogo.
Embora o ministro Fábio Farias tenha em mãos um documento que aponte que a presença dos equipamentos da Huawei nas redes brasileiras de telecomunicações não seja maior do que 35% do market share, as grandes operadoras afirmam que esse número é bem defasado. Conforme um levantamento feito em cada uma delas, comenta-se que a Huawei já ocuparia 50% do mercado de todas as redes de celular do Brasil. ( Na Claro, estaria com 55% do market share; na Nextel, com 100%; na Vivo, com 65%; na TIM com 45% na Oi, com 60%, na Algar Telom, com 50%).
E as empresas fizeram as contas do que representaria uma decisão de banimento desse fabricante. Os número variam muito, pois alguns consideram que o impacto viria desde a rede de 3G . Para outras empresas, esse impacto começaria a partir das redes de 4G. Mas todos concordam que a 5G, sem a Huawei, além de ficar muito mais cara, se espalhará muito mais lentamente no território brasileiro.
No mínimo, sem a Huawei, todos os equipamentos da 4,5 G, já instalados, terão que ser trocados. Há empresa que estima custos de mais de US$ 200 bilhões para repor toda a tecnologia Huawei nas redes brasileiras. Valor que pode estar superestimado, na avaliação de outros especialistas do setor.
Mas os interlocutores consultados pelo Tele.Síntese concordam que uma decisão como essa irá certamente afetar o leilão da 5G. ” O leilão pode ficar em risco”, avalia um executivo. Ou “em risco, não, mas as contas certamente terão que ser refeitas”, afirma outro.
Conforme algumas projeções, sem Huawei, a 5G só chegará em oito capitais brasileiras em cinco anos… “É isso o que a sociedade espera?”, indaga um terceiro.