Fuchs: Realidade aumentada pode ser um diferencial também para IoT

O diretor de Inovação da Arqia, Daniel Fuchs, diz que Realidade Virtual e Realidade Aumentada, se vão exigir muito mais velocidade, também impulsionarão a Internet das Coisas (IoT). O executivo também fala do potencial da NB-IoT e da necessidade de incentivar a formação de especialistas em TI
Daniel Fuchs, diretor de Inovação da Arqia, diz que uso efetivo de novas aplicações puxará demanda por dados
Daniel Fuchs, diretor de Inovação da Arqia, aponta que uso de novas aplicações precisa ser demonstrado ao setor privado (crédito: Izilda França/Divulgação)

A Realidade Aumentada e a Realidade Virtual, quando chegarem de fato ao mercado, também afetarão de forma significativa a Internet das Coisas (IoT),  indica Daniel Fuchs, diretor de Inovação da Arqia, unidade de tecnologia móvel do Grupo Datora. Mas ele reconhece que ainda há um longo caminho a percorrer. Daniel Fuchs assinala que as novas tecnologias no Brasil, como a IoT, precisam trazer redução de custos, primeiro requisito demandado pelo mercado.

Em entrevista ao Tele.Síntese, Fuchs destaca que, quando as funcionalidades de novas soluções IoT são exibidas de modo profissional, as empresas se interessam em adotá-las e entendem a necessidade de incrementar seus ecossistemas de conectividade.

“Quando você consegue ter uma interação com a equipe horizontal da empresa, muitas ideias interessantes aparecem. Eles aprendem o que dá para fazer com a tecnologia e, assim, surgem demandas”, pontua.

Além disso, Fuchs sinaliza que muitos periféricos de Internet das Coisas (IoT) ainda devem surgir na era do 5G, na esteira da adoção de hardwares de realidade aumentada (AR) e realidade virtual (VR). Ao mesmo tempo, aplicações de NB-IoT (Banda Estreita para Internet das Coisas) vêm ganhando espaço em projetos de cidades inteligentes, na agricultura e em dispositivos voltados ao usuário comum.

O diretor da Arqia também comenta sobre a escassez de profissionais qualificados para atuar na área de TI, argumentando que a formação de novos especialistas deveria ser tratada como política pública nacional.

Confira a entrevista, a seguir.

Tele.Síntese: Quais são as perspectivas para o mercado de Internet das Coisas na era do 5G?

Daniel Fuchs, diretor de Inovação da Arqia: O 5G é mais uma tecnologia que vem para estimular a Internet das Coisas (IoT). Ele tem algumas grandes vantagens. A gente sempre volta para o triângulo principal do 5G: permitir uma alta densidade de dispositivos numa mesma região, ou seja, pôr muito mais coisas conectadas por quilômetro quadrado; trabalhar com aplicações de baixa latência, como uma cirurgia remota, que é algo que hoje não se consegue fazer com outras tecnologias sem fio por uma questão de precisão; e a [maior] velocidade, que é necessária para algumas aplicações.

Existe uma expectativa muito grande para realidade aumentada e realidade virtual, que precisam de uma velocidade de transmissão muito mais alta do que temos hoje. Isso pode ser um grande diferencial e estimular a IoT, porque, no final, para que realidade virtual e realidade aumentada funcionem, também é preciso transmitir os sensores.

Assim, transmitir a realidade aumentada e a realidade virtual quando você tem um sensor na cadeira que vibra junto com alguma aplicação que você esteja assistindo ao mesmo tempo, isso tem uma importância muito grande. Então, acho que vai ter todo um IoT periférico às realidades virtual e aumentada que não estamos vislumbrando ainda justamente porque não tem aplicação.

Tele.Síntese: Como está o mercado de IoT hoje? Conforme novas soluções chegam ao mercado, a tendência é de crescimento?

Fuchs: Com certeza. No final, quem puxa [a tecnologia] é sempre o usuário. Por exemplo, minha esposa gostaria de sair para correr no parque sem levar o celular, só o smartwatch. Sei que isso é uma aplicação muito simples, mas são coisas que só estão sendo possíveis com avanços tecnológicos que o 5G está trazendo, ou que o eSim está trazendo. Acho que o usuário vai puxar essas aplicações.

Sempre vamos ter pessoas como Steve Jobs que conseguem perceber antes o que o usuário quer, mas a demanda do usuário por certas aplicações também vai ser muito importante.

Falo muito sobre aplicações de saúde. Por exemplo, como a população está envelhecendo, poder rastrear uma pessoa com risco de demência é muito importante. Quando você faz isso com as tecnologias atuais, há um problema de bateria. A pessoa, com o tempo, não vai lembrar de recarregar. Essa demanda vai fazer com que a gente invente um hardware cuja bateria dure um mês, de modo que fique mais fácil de a família gerenciar isso. Então, acredito que essas demandas é que vão motivar o melhor uso das tecnologias 5G e IoT como um todo.

Tele.Síntese: Em quais segmentos a IoT se destaca atualmente?

Fuchs: Hoje, os dois segmentos líderes em IoT são meios de pagamento e rastreabilidade – não só de carro, mas tudo que envolve logística e telemetria. São os dois segmentos despontando com aplicações, e o Brasil tem muito para crescer, principalmente na parte de rastreabilidade.

Na parte de meios de pagamento, o Brasil é bastante avançado. Há países que só agora estão colocando os POS no volume que temos hoje. Nos Estados Unidos, por exemplo, não se colocava senha no cartão, demorou muito para entrar senha no cartão. Então, você ia a um restaurante e não tinha POS. Ele [garçom] levava o seu cartão e trazia de volta. Na Europa, idem. Fui para o Mobile World Congress agora [em fevereiro] e foi a primeira vez que todos os restaurantes tinham maquininha para trazer na mesa. Então, em Barcelona, na terra do Mobile World Congress, se você tivesse que usar o chip do cartão e pôr a senha, você tinha que se levantar e ir ao caixa. Na questão de meios de pagamento, o Brasil é bastante avançado.

Já na parte de rastreabilidade, telemetria e logística, se você comparar com o mercado americano, por exemplo, nós não atingimos nem 20% do que eles usam dessa tecnologia na frota deles. Então, podemos multiplicar por cinco o número de unidades com algum tipo de rastreabilidade e ainda assim vamos estar abaixo do mercado americano percentualmente.

Tele.Síntese: Quais os motivos dessa disparidade?

Fuchs: É custo. Sempre falo que só se consegue vender no Brasil o que reduz custo para os clientes, e não novas aplicações. Em outros mercados, as novas funcionalidades conseguem ser comercializadas. No Brasil, até pela cultura de achar que haverá uma crise no dia seguinte, o empresário é muito mais restritivo. Você só consegue vender funcionalidades novas para ele depois que ele perceber uma redução de custos ao implantar aquela tecnologia.

Tele.Síntese: Muito se fala que as operadoras têm sentido dificuldade para monetizar o 5G. Do mesmo modo, novas aplicações ainda não conquistaram o grande público. Você acha que falta, do ponto de vista das empresas ofertantes, fazer uma divulgação mais didática sobre as novas tecnologias?

Fuchs: Concordo com você, acho que falta, sim. Só que essa divulgação não pode ser de marketing. Tem que ser mais no estilo de treinamento, mostrar o que se pode fazer com a tecnologia.

Temos um modelo aqui que poucas empresas aceitam fazer. Por exemplo, visito uma empresa e fico à disposição da diretoria. Falo sobre IoT, e eles me perguntam se a tecnologia se aplica às ideias que têm. Respondo o que dá para fazer e apresento ideias em cima disso. Então, quando você consegue fazer uma interação desse tipo com a equipe horizontal da empresa, muitas ideias interessantes aparecem. Eles aprendem o que dá para fazer com a tecnologia e, assim, surgem demandas.

Então, acho que, sim, falta essa divulgação, mas é mais no perfil de treinamento, e não de propaganda. Os clientes têm que encontrar as aplicações que precisam, e não um pacote de uma operadora. Isso vai derivar, automaticamente, para a necessidade de um pacote de dados.

Tele.Síntese: Vocês estão apostando em NB-IoT agora. Qual é o diferencial dessa tecnologia e o público dela?

Fuchs: Em equipamentos de IoT, a quantidade de dados transmitidos é irrisória. Diria que 90% das aplicações de IoT seriam atendidas pela internet discada. A quantidade de dados que você precisa transmitir é muito baixa. A questão é que, ao mesmo tempo que se quer transmitir esses dados, você quer transmiti-los com o menor custo possível.

Por exemplo, uma estação meteorológica numa fazenda. A gente acha que é um negócio gigante, que fica uma a cada 10 mil km da outra. Não é assim. Hoje, uma fazenda de 15 mil hectares tem três estações meteorológicas de pequeno porte dentro dela. Então, essa estação fica num lugar da fazendo que não é a sede. A sede tem energia – talvez um pivô também tenha energia. Então, se você tiver, entre a sede e o pivô, o cabo de energia passando, você tem que abrir o cabo de energia, mas custa caro, não vale a pena.

Com isso, onde você vai colocar essa estação vai ter que funcionar, de repente, a base de energia solar. Talvez, a base de bateria, porque não há incidência de sol suficiente. Enfim, tem “n” variações. Mas, se ela precisa transmitir poucos dados, por que não usar uma tecnologia com baixa transmissão de dados, como o NB-IoT, que atinge, no máximo, 250 Kbps, muito abaixo do LTE e do 5G, mas, consequentemente, preserva a energia do equipamento? A bateria que vou colocar lá vai ser de menor tamanho, o painel solar vai ser de menor tamanho e a solução como um todo fica mais barata.

Então, o NB-IoT surge porque as necessidades do mundo vão desde rastreamento veicular simples ou rastreamento pela coleira do cachorro até uma estação meteorológica numa fazenda. Você tem que trabalhar com tudo isso ao mesmo tempo. Daí surgiu o conceito de LPWA [low power wild area communictation], do qual o NB-IoT faz parte.

Tele.Síntese: Você citou exemplos bastante diferentes, como a coleira de um cachorro e uma solução para a agricultura. Então, o NB-IoT tem condições de prover aplicações para diversos segmentos da sociedade.

Fuchs: Com certeza. Até o smartphone, de repente, vai ter coisas sendo transmitidas em 5G e outras em NB-IoT ao mesmo tempo. Não se pode esquecer que isso aqui [celular] é um dispositivo de IoT também. A quantidade de sensores que temos aqui dentro é relevante.

Acho que vão surgir – talvez não smartphones para usuários comuns – dispositivos que vão ter mais de um meio de transmissão dependendo da aplicação que se quer transmitir naquele momento. Então, o NB-IoT e a tecnologia LPWA vão ser presentes nos vários ambientes em que a gente vive.

Tele.Síntese: Quando pensamos nas cidades, essa tecnologia também pode potencializar dispositivos para gerenciamento de trânsito, iluminação pública e tudo o que entra no escopo de cidades inteligentes?

Fuchs: Sem dúvida nenhuma, até o próprio medidor de energia, uma das aplicações do IoT, – uma discussão que volta e meia reaparece. Às vezes, as empresas elétricas querem ter a própria frequência, montar uma rede própria para o medidor de energia. Isso vale para a iluminação pública, vale para a câmera que transmite avisos, mas não propriamente o vídeo. Então, essa tecnologia faz com que não seja necessário implantar uma rede separada para essas aplicações.

Hoje, quando você faz uma smart city usando uma frequência privativa ou aberta, a sua área de cobertura é muito menor. Então, tem que fazer várias redes. Muitas vezes, para smart lighting, por exemplo, usa-se um poste com conexão de backhaul e os outros postes transmitem para ele. Aqui, com tecnologia NB-IoT, todos os postes podem transmitir para a central ao mesmo tempo, então, não precisa gerenciar uma nova rede de telecomunicações só para administrar os postes de cidades inteligentes. Até para vídeos no futuro, vamos ver o 5G slicing. Quando se fatia a rede, você garante mais segurança para transmissão dos dados das câmeras públicas.

Tele.Síntese: Como o mercado brasileiro tem recebido tecnologias IoT?

Fuchs: Com a IoT, vemos cada vez mais empresas interessadas em conectar sensores. Está havendo uma procura mais natural, mas sinto, pessoalmente, uma necessidade de estimular ainda mais [o setor privado]. Vemos, sim, uma demanda crescente do mercado, originada a partir dele mesmo ou do que sai na imprensa.

Tele.Síntese: No âmbito da política nacional, quais pautas você considera prioritárias para IoT no País ou que podem travar o desenvolvimento dessas soluções?

Fuchs: Vi uma entrevista com o José Pastore, especialista em leis trabalhistas. Ele levantou um ponto interessante de que o Brasil tem uma demanda, nos próximos anos, de 800 mil pessoas para vagas de TI, mas só tem previsão de formar 300 mil profissionais. Então, acho que uma das barreiras que temos que superar, através de políticas públicas, é a formação de mão de obra capacitada para essas áreas de tecnologia – e o IoT não escapa disso. Pelo contrário, é até mais complicado.

Hoje, a gente forma muita gente em TI sem conhecimentos específicos de rede. Assim, o profissional acaba não conhecendo como um pacote de dados é transmitido. Então, é muito importante ter politicas públicas que incentivem o treinamento. E mesmo nas faculdades que não são técnicas, como administração e marketing, é preciso ter cadeiras sobre o mundo digital.

Tele.Síntese: Vocês já sentiram dificuldades para preencher postos de trabalho na área de tecnologia?

Fuchs: Já. Quando a empresa vai crescendo, isso vai ficando um pouco mais fácil. Imagine um escritório de dez pessoas que tem que contratar alguém com conhecimento técnico avançado. Essa pessoa tem a oportunidade de trabalhar nesse escritório, na Cisco ou na Microsoft. Naturalmente, por medo ou por achar que terá uma carreira mais longínqua nas grandes empresas, o profissional vai optar por elas.

Acho que o maior problema que se enfrenta na contratação de profissionais de qualidade é esse: quanto menor a empresa, maior a dificuldade de contratar mão de obra qualificada. E outro problema é que, desde a pandemia, tem muito brasileiro trabalhando para empresas estrangeiras remotamente.

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Eduardo Vasconcelos

Jornalista e Economista

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