Estudo do Instituto Lula levanta desigualdade digital no país

Mulheres negras realizaram transações financeiras (37%), serviços públicos (31%) e cursos (18%) pela Internet, em proporções bastante inferiores às de homens brancos (51%, 49% e 30%, respectivamente).
O estudo sugere apoiar grupos sociais vulneráveis. Crédito – Freepik

A pesquisa “Democracia e representatividade – Novas formas de representação diante da transformação digital”, realizada pela Friedrich-Ebert-Stiftung (FES) Brasil em parceria com o Instituto Lula, mostra que 83% dos brasileiros têm acesso à internet, o que revela um aumento considerável nas classes C, D e E. O resultado, no entanto, tende a mascarar as desigualdades: a grande questão que se coloca é o tipo de conexão a que têm acesso esses grupos sociais.

Em relação ao uso da internet, o estudo constatou um aumento de 12 pontos percentuais comparados a 2019 (71%), agregando um total estimado de 152 milhões de brasileiros, ou 81% da população com dez anos ou mais, que usam a rede. O movimento foi observado em praticamente todos os segmentos analisados na pesquisa, mas foi mais acentuado nos estratos socioeconômicos mais vulneráveis: as classes C (de 80%, em 2019, para 91%, em 2020) e D/E (de 50%, em 2019, para 64%, em 2020).

Acesso pelo celular

O telefone celular continuou sendo o principal dispositivo utilizado para acessar a internet, atingindo quase o total da população com dez anos ou mais (99%). Mais uma vez, indicadores aparentemente positivos mostram seu lado perverso. Para mais da metade desses usuários (58%), o acesso se deu exclusivamente pelo celular.

Dos mais de 250 milhões de celulares ativos no Brasil, 118, 7 milhões são pré-pagos, aponta a pesquisa, que não dispõem de memória para baixar vídeos, salas de reunião online, trabalho e ensino online.

O uso exclusivo do celular para acessar a internet foi predominante para pessoas negras (65%) e pardas (60%), sendo que a questão de gênero também é significativa, uma vez que entre os negros, 67% são mulheres. Regionalmente, essa realidade é preponderante nas regiões Nordeste (72%), Norte (60%) e Sudeste (58%).

No contexto da pandemia, as desigualdades sociais também se manifestam e se aprofundam no ambiente digital, com potencial de restringir oportunidades e até mesmo as condições de cumprimento de medidas de isolamento e proteção social.

Sob as condições de restrição de mobilidade social, as mulheres negras realizaram transações financeiras (37%), serviços públicos (31%) e cursos (18%) pela Internet, ou seja, em proporções bastante inferiores às de homens brancos (51%, 49% e 30%, respectivamente).

Analfabetismo digital

De acordo com o estudo, que contou com a organização de Cosette Castro, “a pessoa tem aparelho e acesso à internet, mas não tem alfabetização digital relacionada ao uso do aparelho, ao uso das plataformas, à produção de conteúdo, a saber analisar os conteúdos e compartilhar, uma vez que 75% das pessoas idosas no Brasil são analfabetas digitais”, aponta.

A situação dos quilombolas, das populações ribeirinhas e de aldeias indígenas é ainda mais difícil, uma vez que, nas regiões Norte e Centro-Oeste, onde estão localizadas, não existem torres de transmissão próximas.

Sobre a inclusão digital de comunidades indígenas no Brasil, observa-se ainda que ela vem se dando, sobretudo, com o apoio de organizações não governamentais (ONGs) e governamentais, e de grupos ativistas.

O estudo apresentou como sugestões para ampliar a inclusão digital o acesso à internet gratuito para pessoas vulnerabilizadas, o financiamento de equipamentos, pontos de internet em bairros, associações, sindicatos, ONGs e áreas rurais, além da formação e capacitação para o uso de aparelhos, novas tecnologias e análise das mídias digitais.

Mais números

Em 2020, a penetração de computadores nos domicílios brasileiros atingiu a marca de 45% e a proporção de domicílios com acesso à internet chegou a 83%, representando perto de 61,8 milhões de domicílios com algum tipo de conexão à rede em todo o país.

A presença domiciliar de computadores acentuou-se nas áreas urbanas (de 43%, em 2019, para 50%, em 2020) e das classes A (de 95% para 100%) e C (de 44% para 50%), evidenciando o acirramento da exclusão digital na base da pirâmide social, segundo o site cetic.br.

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Cândida Bittencourt

Jornalista com experiência em jornais, rádios e TV do Brasil e exterior. Formada pela UNI-BH, tem MBA em gestão de marketing pela FGV e especialização em comunicação corporativa pela ESPM.

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