Embaixador da China reage a acusações de subsecretário dos EUA

Mercado tenta traçar cenários diante das incertezas relacionadas à pressão dos EUA para que Brasil restrinja o número de fornecedores de redes

O embaixador da China no Brasil, Yang Wanming, usou sua conta na rede social Twitter para responder a acusações do subsecretário de Estado dos Estados Unidos, Keith Krach.

Nesta quarta-feira, 11, último dia de sua visita oficial ao país, o norte-americano falou à imprensa que já foi vítima de roubo de propriedade intelectual por parte da China em “várias ocasiões” e que há lei no país asiático que obrigaria as empresas locais a entregar dados a pedido do Partido Comunista Chinês (PCC). Krach afirmou, em sua fala, que o objetivo dos EUA é “proteger nossos dados e interesses de segurança nacional do estado de vigilância do PCC e de outras entidades malignas”. O subsecretário também afirmou que os EUA são os maiores investidores estrangeiros no Brasil.

Wanming reagiu a essas afirmações chamando-as de mentirosa e classificando Krach como um “desavergonhado”. Também disse que a mentira é prática recorrente do governo norte-americano.

Rede limpa vs. rede discriminatória

A manifestação de Wanming no Twitter foi seguida pela publicação, no começo da noite, de um posicionamento oficial no site da Embaixada da China. Ali, Wanming afirma que durante a visita ao Brasil, Krach fez acusações mal-intencionadas com o objetivo de abalar as relações sino-brasileiras.

“A chamada “rede limpa” pregada pelos Estados Unidos é discriminatória, excludente e política. É de fato uma “rede suja”, e sinônimo de abuso do pretexto da segurança nacional por parte dos EUA para promover guerra fria tecnológica e bullying digital”, diz Wanming no texto, que acusou os norte-americanos de praticarem espionagem.

Segundo ele, as empresas chinesas fazem parte de uma Iniciativa Global de Segurança de Dados. Ele também afirmou que não há, ao contrário do que disse Krach, legislação na China que exija as empresas a colaborar com a espionagem cibernética. “Como a maior fornecedora de equipamentos de telecomunicação no mundo e líder em 5G, a Huawei tem mantido um excelente histórico de segurança e está disposta a assinar com qualquer país um acordo de “anti-backdoor””, afirmou.

Por fim, ele disse que o objetivo dos americanos é defender os próprios interesses. “Objetivo não é, de forma alguma, salvaguardar a segurança nacional ou a dos dados de outros países, mas cercear as empresas chinesas de alta tecnologia, coagir outras nações a sacrificar seus próprios interesses, servir ao “America First” e manter seu monopólio tecnológico”, completou.

E finalizou cobrando uma postura neutra do Brasil. “Acreditamos que a maioria dos países, incluindo o Brasil, vai tomar decisões objetivas de forma independente e autônoma, e por consequência, criar regras de mercado e ambiente de negócios com parâmetros abertos, imparciais e não discriminatórios para empresas da China e de outras nacionalidades”.

Tour brasileiro

Nesta quarta-feira, Keith Krach encerrou a visita que fez ao Brasil. De manhã, em fala à imprensa, voltou a tecer acusações contra a China, que resultaram na resposta de Wanming. Ele fez um discurso acusatório no qual chamou a Huawei de “espinha dorsal do Estado de vigilância do Partido Comunista Chinês” e disse que o país asiático rouba propriedade intelectual.

Segundo ele, a Rede Limpa, conceito em que tecnologias chinesas não são usados em redes de telecomunicações, recebeu adesão de 170 empresas, em 50 países. Desses, 31 países integram a OCDE, e 26 são da União Europeia. Afirmou que, no Brasil, obteve apoio explícito da fornecedora de equipamentos de rede NEC, da Stone Pagamento, que vende máquinas de pagamento por cartão, e da Siemens.

Impacto incerto

Os reflexos práticos de uma decisão brasileira de alinhar-se à proposta dos EUA e banir a Huawei são incertos. Fontes ouvidas pelo Tele.Síntese apontam que há muitas variáveis em jogo. Em termos de custos para as operadoras, há quem defenda impacto baixo, uma vez que mesmo sem a chinesa o mercado de equipamentos e software é competitivo de dinâmico para se ajustar rapidamente. Além disso, o hardware já costuma ser substituído a cada três ou cinco anos.

Há quem lembre dos desafios de rever processos, treinar pessoal hoje especializado na tecnologia chinesa para atuar com outros fornecedores e lidar com cláusulas nos contratos de fornecimento que podem ser onerosas em caso de rompimento. Ou aponte ainda as possíveis economias em realizar upgrades nos equipamentos pré-existentes para o caso de implementações de redes 5G non-standalone.

Há unanimidade, porém, que em termos de penetração, a Huawei tem forte presença no país. Considerando-se apenas o segmento móvel, a empresa fornece de 35% a 40% das ERBs de quarta geração (4G). Menos que a Ericsson, hoje detentora de fatia acima de 40%, enquanto a Nokia teria menos de 30%. Os números exatos, nem operadoras, nem fornecedores, expõem.

Além dos rádios, há presença significativa em núcleo de rede móvel, backhaul, backbone, núcleo de rede fixa, redes IPs e rede fixa legada, em proporções que ninguém arrisca dizer. Esses componentes todos também seriam afetados no caso de uma adesão incondicional à proposta dos EUA.

Por fim, diante de cenário tão complexo, há quem defenda ainda que a solução é incentivar um salto para a 5G standalone (SA), que independe das redes 4G já construídas, minimizando, portanto, a quantidade de dados que passam por núcleo que vier a ser considerado “não confiável”. O padrão SA acaba de ser definido pela 3GPP, e a aposta é que em 2021 as fabricantes tenham produtos compatíveis e com preços equiparáveis aos atuais 5G NSA.

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Rafael Bucco

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