Decreto amplia a rede móvel do governo para todo o país, sem previsão da Anatel
A construção da rede privativa do governo – uma das obrigações do leilão do 5G, que gerou bastante polêmica à época – poderá ser bastante ampliada, e gerar novos desdobramentos, caso seja aplicado na íntegra o decreto assinado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, publicado em 21 de dezembro do ano passado, quando ele transfere para a Telebras a operação dessa rede.
O decreto Nº 11.299, de 21/12/22 de Bolsonaro e que altera aquele publicado pela então presidente Dilma Rousseff ( de número 9612, de 2018) explicita que vai mesmo caber à Telebras operar a rede do governo que será construída com os recursos do leilão do 5G. Mas a norma foi publicada com o seguinte texto:
A rede privativa de comunicação da administração pública federal, [ ] de abrangência nacional, será composta por segmentos de rede móvel e fixa, incluída rede satelital, e observará as seguintes condições:
II -utilizar, em caráter primário, faixas de radiofrequências designadas pela Anatel para a consecução das atividades de segurança pública, defesa, serviços de socorro e emergência, resposta a desastres e outras atribuições críticas de Estado, incluídas as realizadas por entes federativos, e para atendimento aos órgãos públicos federais, em especial aquelas previstas em editais de licitação de radiofrequências.
O grande problema, contudo, é que não existem “faixas de frequências” de abrangência nacional para a construção dessa rede. A única frequência que foi destinada pela agência reguladora à rede privativa é de 700 MHz e está restrita ao Distrito Federal. Não há mais espectro disponível em 700 MHz no restante do território nacional.
Custo
Além de não existir frequências “de abrangência nacional”, a própria construção dessa rede de celular nas demais unidades da federação também extrapola muito dinheiro reservado para programa de governo. No leilão, foi reservado R$ 1,25 bilhão para a construção dessa rede, que deverá estar pronta até 2026, e que, a princípio, foi vislumbrada como uma infraestrutura de banda larga fixa.
A inclusão da rede privativa do governo no edital do 5G foi uma iniciativa do ex-ministro das Comunicações, Fábio Faria, para contornar a pressão que existia à época por parte do grupo do Palácio do Planalto e de militares radicais contra a participação de fabricantes de origem chinesa na infraestrutura de telecomunicações brasileira. Esse movimento já estava acontecendo nos Estados Unidos (o banimento da fabricante Huawei do solo norte-americano pelo então governo republicano, e novas medidas adotadas no governo democrata) e havia pressão para que também fosse replicado em território brasileiro.
Mas todo o mercado privado das telecomunicações brasileiras agiu para que essa intenção não prosperasse, tendo em vista que os equipamentos Huawei estão presentes em mais da metade das redes de celular e das redes fixas tanto dos grandes como dos pequenos operadores. Sem a oferta dessa fornecedora de tecnologia, as operadoras apontavam para aumento dos custos/e dos preços de todo o serviço de telecom.
Sem definição
Consultados pelo Tele.Síntese, Anatel e Telebras preferem aguardar a manifestação do novo governo sobre como deverá ser tratada essa questão. Alguns interlocutores da agência disseram que ainda esperam as demandas da Telebras para poder entender as razões da publicação da norma. Na Telebras, os interlocutores informaram que o ideal é buscar informação junto ao Poder Executivo.
Mas para a Anatel, no entanto, o que tem força de lei é o edital de licitação, que prevê apenas a rede de celular em Brasília. “As cláusulas editalícias são imutáveis”, argumentou dirigente da agência. A expectativa é que o novo governo republique o decreto, delimitando melhor os limites da rede móvel.