A subnotificação ameaça os provedores regionais

Para permanecer no Simples, os provedores regionais multiplicam CNPJs e subnotificam o número de clientes. O que parecia uma boa estratégia para pagar menos impostos pode virar um sério problema competitivo, com repercussões na política pública de banda larga

Não é de agora que todo mundo sabe que os provedores regionais de acesso à internet e serviços de comunicações subnotificam seus dados à Anatel. Ou seja, informam um número inferior ao de terminais de banda larga que realmente têm em operação. Se no passado não enviavam os dados mensais que as prestadoras são obrigadas a informar ao SICI – Sistema de Coleta de Informações da agência, por falta de cultura, depois passaram a minimizar os dados por problemas tributários. Muitos, especialmente os que estão no regime do Simples e já contam com uma base de clientes cujo faturamento levaria a estourar o limite desse regime tributário, subnotificam os registros.

O resultado é que ninguém sabe ao certo qual é a dimensão da base de terminais de banda larga fixa dos provedores regionais. Pelos dados oficiais da Anatel, os registrados no SICI, em setembro deste ano foram registrados 30,727 milhões de terminais de banda larga fixa, dos quais 5,866 milhões na categoria outros (19,09%) onde a agência reúne as pequenas prestadores de SCM à exceção daquelas pertencentes a grupos econômicos. Dados do Netflix e do Google sugerem, segundo diretores de entidades de provedores, que estes já responderiam por 40% do tráfego da banda larga fixa do país. Mas nada preto no branco.

No entanto, os números podem guardar muito distância da realidade. Marcelo Romão, do Departamento de Banda Larga da Secretaria de Telecomunicações do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, fez uma comparação, a título de exercício para discutir com os provedores regionais em um evento, entre o backhaul de fibra óptica existente no estado de Pernambuco e o percentual de domicílios com banda larga em fibra segundo os dados do SICI naquele estado. E a discrepância é alarmante. Mesmo considerando uma defasagem sobre as informações, 66,5% dos municípios de Pernambuco contavam, em setembro de 2018, com backhaul de fibra óptica, de acordo com informações fornecidas à agência. No entanto, também pelas informações da Anatel só 18% dos domicílios daquele estado tinha internet com fibra.

 

 

“Os números não batem. Por que as empresas estariam investindo em backhaul se não colocam fibra na última milha?”, é a pergunta que fez Romão à plateia durante o Encontro Provedores
Recife, realizado no dia 12 de novembro, na capital pernambucana. Para Romão, a subnotificação é elevada e grave porque gera distorções e vai influenciar nas políticas públicas, prejudicando os próprios provedores regionais.

Se aprovado o PLC 79, por exemplo, que está para ser votado pelo plenário do Senado, as concessionárias de telefonia fixa vão ter como obrigação investir em banda larga nas regiões menos desenvolvidas e mais carentes. Se a Anatel não tiver informações atualizadas dos provedores regionais sobre suas redes, sejam de longa distância sejam locais, ela poderá definir investimentos para as concessionárias, como contrapartida à migração da telefonia fixa do regime de concessão para o regime de autorização, em área onde eventualmente provedores regionais tenham já operação mas não informaram à agência. “Esse é uma risco grande”, alertou Romão, chamando a atenção para o perigo da subnotificação tanto do número de terminais como das redes.

Prevendo o que pode vir a acontecer se o PLC 79 for aprovado e com medo de uma competição das concessionárias com recursos da troca de obrigações, a Abrint, entidade nacional que representa provedores regionais, que já vem se empenhando em estimular seus associados a melhorar o nível de informações prestadas à agência, decidiu programar uma ação mais afirmativa para 2019. Vai promover um curso em plataforma EAD para ensinar os pequenos provedores, ainda não habituados com a burocracia da Anatel, a preencher o SICI.

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Lia Ribeiro Dias

Seu nome, trabalho e opiniões são referências no mercado editorial especializado e, principalmente, nos segmentos de informática e telecomunicações, nos quais desenvolve, há 28 anos, a sua atuação como jornalista.

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