TV 3.0 pode ganhar a faixa de 300 MHz e decreto sai em dezembro com o padrão

Wilson Wellisch diz que até dezembro o Ministério das Comunicações envia ao Palácio do Planalto a minuta com o novo decreto que vai definir como a TV 3.0 será implementada no Brasil.
Wilson welish, secretário de radiofifusão | Crédito: Shizuo Alves/MCom
Wilson welish, secretário de radiofifusão | Crédito: Shizuo Alves/MCom

Até dezembro deste ano o Ministério das Comunicações entrega ao presidente Lula a minuta do novo decreto da TV 3.0, para que a nova tecnologia comece a ser adotada no Brasil a partir do próximo ano. E, segundo o secretário de Radiodifusão do MCom, Wilson Wellisch, nessa conversa com o Tele.Síntese, o novo decreto irá estabelecer não apenas o padrão de transmissão de sinais, como também indicará as frequências que serão usadas por essa nova tecnologia. O secretário aponta que a Anatel, a pedido do governo, já está estudando a opção de destinação da faixa de 300 MHz, hoje ocupada por serviços privados e pelas Forças Armadas, para a nova tecnologia.

O secretário não falou expressamente, mas a opção por essa faixa pode ser um caminho para se atender ao pleito do setor de telecomunicações, que apontou a atual frequência de 600 MHz, ocupada pela radiodifusão brasileira, como uma das boas opções para a telefonia celular.

Ele disse ainda que a indicação feita esta semana, pelo Fórum da TV Digital, padrão tecnológico ATSC 3.0, norte-americano, tem  um peso importante na decisão final que estará consolidada pelo Decreto da TV 3.0, mas salienta que caberá ao presidente Lula a palavra final, já que o padrão japonês, atualmente adotado no Brasil, traz quase as mesmas características, mas ainda não está operacional. Também disse que o padrão europeu, o 5G Broadcast,  pode ser uma opção para a TV móvel, a ser implantado nos aparelhos celulares, mas depende de ele ganhar mercado em outros países. Leia aqui os principais trechos da entrevista:

Tele.Síntese – O Fórum de TV digital escolheu, nesta segunda, o padrão norte-americano para a TV 3.0 no Brasil. O Mcom vai seguir essa orientação?

Wilson Wellisch – Vale a pena fazer uma retrospectiva. O fórum da TV Digital foi escolhido pelo Ministério para fazer os testes com todos os padrões existentes levando em conta os principais aspectos que deveriam constar na tecnologia da recepção, fixa e móvel; a qualidade de vídeo e áudio, que devem ser superiores  à  tecnologia anterior, e a possibilidade de contar com conversores de sinais.

Tele.Síntese – Por que conversores, já que o sinal já é digital?

Wilson – As televisões atuais não têm a tecnologia nova, tanto para a transmissão quanto para a recepção. Ou seja, não existe a retro compatibilidade com a tecnologia anterior. Qualquer que seja a tecnologia, japonesa ou americana, teria que haver a troca de aparelho. Por isso, a decisão pelos conversores, para não ter que trocar todo o aparelho de TV, já que o objetivo da política pública é que a transição seja suave. Outra decisão que também está no primeiro decreto presidencial, é que a Anatel deveria estabelecer faixas de radiofrequência para essa nova aplicação.

Tele.Síntese – Aí entra a disputa pela faixa de 600 MHz, que a telefonia celular está reivindicando para si?

Wilson – Essa frequência, atualmente, é da radiodifusão. A Anatel está fazendo estudos, mirando a faixa de 300 MHz, que poderia ser destinada para a TV 3.0.

Tele.Síntese – Mas a radiodifusão precisa mesmo de mais banda?

Wilson – Muito provavelmente, sim. Desde a digitalização dos sinais, entraram novos canais, e não há atualmente canal para todas as emissoras fazerem o simulcast, ou seja, transmitir ao mesmo tempo a TV digital e a TV 3.0.

Tele.Síntese – Já houve o pleito formal pela frequência de 300 MHz para a radiodifusão? E a faixa de 600 ficaria liberada para o celular?

Wilson – Sim já foi feito o pleito da frequência de 300 MHz à Anatel. No caso do 600 MHz, a Anatel está estudando.

Tele.Síntese – Posso falar, sem medo de errar, que todos terão que trocar de aparelho de TV, se quiser assistir à transmissão da TV 3.0, e isso estará explícito no Decreto da TV 3.0?

Wilson – Bom, a TV 3.0 obriga a mudança de aparelho, seja em que padrão for, mas aqui, poderá ter também o conversor do sinal.

Tele.Síntese – E qual vai ser a motivação para o telespectador ter esse gasto?

Wilson – Além de ter muito melhor imagem, a possibilidade, por exemplo, de contar com a segmentação do áudio, o que pode ajudar muito uma pessoa que tem um problema visual, que poderá ouvir o áudio de forma separada da família. Além dos aplicativos que virão.

Tele.Síntese – Voltando ao padrão. Ele será mesmo o ATSC 3.0 e virá no Decreto da TV 3.0?

Wilson – Até o final do ano, o Ministério envia para o Palácio do Planalto uma proposta de decreto, que vai sugerir o padrão e a frequência, mas é o presidente Lula quem vai bater o martelo.

Tele.Síntese – Sim, mas a indicação do Fórum já é um importante passo para essa definição, não?

Wilson – Sim, é importante. Mas vale lembrar que as duas tecnologias – a japonesa e a norte-americana –  são muito próximas. O ATSC performou melhor nos testes. Ele tem também um diferencial importante, por já estar em operação nos Estados Unidos e na Coréia. O modelo japonês, por sua vez, ainda não está em operação nem no Japão. Há uma expectativa de que estaria pronto só em 2030, ou seja, ainda não têm o padrão pronto.

Tele.Síntese – E o padrão europeu, o 5G Broadcast? Nem foi testado no Brasil?

Wilson- A tecnologia não foi avaliada em testes de campo, mas pode ser uma possibilidade, especialmente para a telefonia móvel. Essa tecnologia tem como um dos apoiadores a Qualcomm, empresa de chip norte-americano, que tem presença em todos os aparelhos móveis. E o decreto poderá estar aberto para permitir padrões para a tecnologia móvel. Depende de escala. Um dos problemas é que, com dois padrões, terão que ser feitos dois investimentos, para o fixo e para o móvel. Itália, Alemanha e França estão traçando o caminho de usar essa opção móvel. Mas estamos olhando com muito cuidado a Índia, que pode tomar essa decisão até o final do ano. Se a Índia adotar o padrão móvel, pois lá eles assistem muita TV pelo celular, cria escala suficiente para a tecnologia.

Tele.Síntese – E como os radiodifusores irão fazer essa migração, tendo em vista que na primeira etapa da digitalização dos sinais de TV os recursos vieram do setor de telecomunicações, com os leilões de frequências da Anatel?

Wilson – Vale lembrar que na primeira etapa da digitalização somente as emissoras de TV que investiram na digitalização receberam os transmissores para migrar para a nova frequência. E, na segunda fase, o governo estava preocupado com um apagão digital na TV, pois havia muitas localidades onde só havia transmissão analógica e, por isso, os recursos do leilão de espectro para o celular foram usados. Agora, já estamos conversando com o  Banco Mundial, que demonstrou interesse para abrir linhas de crédito subsidiadas para a TV 3.0.

Tele.Síntese – Pode explicar melhor como é essa interatividade da TV 3.0? As emissoras vão entrar no mundo da internet e oferecer streaming, de que forma?

Wilson – A TV 3.0 mantém o princípio da TV aberta, livre e gratuita, mas poderá permitir o canal de retorno, para fazer o uplink, pelas redes de telecomunicações.

Tele.Síntese – Na primeira fase da digitalização da TV, o governo estabeleceu um cronograma para o desligamento dos sinais analógicos. Haverá esse cronograma também no decreto?

Wilson Só poderá ter cronograma, ou seja, a migração mandatória, se tiver canal para todas as emissoras. E isso hoje não existe. Uma das hipóteses é a migração voluntária. Mas a Anatel está estudando a opção da faixa de 300 MHz. Para a radiodifusão é  mais fácil, pois os canais não precisam ser contínuos, podendo ocupar diferentes pontos do espectro, com os 6 MHz destinados a eles.

Tele.Síntese – E em relação à política industrial, a TV 3.0 terá algum estímulo à produção e tecnologia nacional?

Wilson Sim. Vamos estabelecer o Processo Produtivo Básico (PPB) para a fabricação dos equipamentos aqui. Essa etapa já foi iniciada com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.

 

 

 

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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