Para Quadros, ausência de políticas públicas atrasa o setor

Juarez Quadros deixou a presidência da Anatel com a certeza de que fortaleceu a agência resgatando os recursos necessários para sua atuação. Mas se ressente da falta de iniciativas dos poderes Executivo e Legislativo para fazer avançar as redes de banda larga no país.
Tele.Síntese, anuário 2018 -Juarez Quadros, presidente Anatel. Photo Robson Regato

Juarez Quadros, que se despediu da presidência da Anatel no 4 de novembro, deixa a instituição com mais autonomia financeira e na confortável posição de poder contar com todos os recursos orçamentários planejados.

Mas sai da agência reguladora com a certeza de que as telecomunicações poderiam ter avançado mais se o governo, pelo qual foi indicado, tivesse se empanhado mais em modernizar a legislação e traçado políticas públicas mais adequadas ao setor.

Leia aqui os principais trechos da entrevista, que concedeu ainda como presidente, quando foi substituído hoje, 5, por seu colega de conselho, Leonardo de Morais.

Tele.Síntese: Você acha que a autonomia da Anatel está preservada?

Juarez Quadros: Espero que seja preservada a autonomia não só da Anatel mas de todas as Agências, porque as agências foram criadas por lei e foi dito que elas teriam autonomia administrativa e financeira. Nesses dois anos, consegui fazer com que houvesse essa autonomia, até mesmo financeira.

Tele.Síntese: O orçamento do próximo ano será de quanto?

Quadros: Praticamente o mesmo valor deste ano, que foi R$ 205 milhões. O ano que vem está em torno de R$ 190 milhões, mas foi o que pedimos. Não houve corte até agora, se bem que a Lei do orçamento tem que ser aprovada até o final do ano.

Tele.Síntese: Quadros, qual foi o seu legado?

Quadros: O legado foi que eu consegui.

Tele.Síntese: E você conseguiu junto ao que, ao mercado, à instituição, à sociedade?

Quadros: À sociedade, ao consumidor, aos regulados. Eles tem respeitado bastante a Agência. Tem havido uma crise econômica que reduz a demanda de serviço, mas tem havido melhoras na qualidade de serviços, quando se fala em redução do volume de reclamações. Há também uma atuação muito forte da Agência perante o regulado, no sentido de preservar aquilo que é obrigação. Aquele recurso de vir á Agência hoje é o norte. Você reclamou para a Anatel e aí a solução vai ser rápida. A Anatel tem hoje uma presença forte, um bom conceito, os serviços têm melhorado tanto no atendimento da demanda quanto na própria qualidade do serviço que é prestado. Faltam melhorias, mas eu sempre reclamo e digo que é por conta da falta de politicas setoriais, da vez que nós, da Anatel,  não podemos elaborar politicas.

 Tele.Síntese: Mas a Anatel não tem também muito poder?

Quadros: Não é a Anatel que vai poder alterar uma alíquota de Fistel. Não é a Anatel que vai mudar a destinação do recurso arrecadado no Fust que hoje pode ser somente destinado para o STFC. Eu vejo ficar no caixa 1 bilhão de reais por ano do Fust, que são usados em outras necessidades mas não vai nada para as telecomunicações. É claro que há problema econômico do país nas áreas de segurança, saúde e educação.

 Tele.Síntese: Você foi recebido com muita euforia pelo mercado, como alguém que conhece o setor e que foi Ministro.Hoje você acha que o mercado continua tendo a mesma visão? E se não tem, por quê? E por que o vice-presidente, que foi senador pelo PT, tem uma postura mais liberal em relação a várias questões regulatórias do que você?

Quadros: As demandas dos regulados, da iniciativa privada, estão mais em função   da falta das políticas públicas. Propõe-se, por exemplo, alterar o  PGMU, tentando  atender acesso à banda larga, usando o SMP em 4G. Vai acabar recorrendo a um problema que aconteceu no passado, ou seja, vamos rever um filme igual ao problema do backhaul. 

 Tele.Síntese: Mas ao que me parece, no caso do backhaul, a reversibilidade não foi estendida para toda a rede. Foi?

Quadros: O que foi instalado virou bem reversível em função da origem do recurso. Mas o que precisa não é só alterar o PGMU, precisa alterar a lei. A falta de alteração da lei é que está prejudicando os regulados. À Anatel compete implementar politicas e essas politicas, que podem ser decretos, que podem ser leis, não finalizam. Hoje, há três decretos para serem publicados. Vai terminar o governo. Aonde estão estes decretos, qual o empenho que dentro do poder Executivo se nota?

Tele.Síntese: Qual definição para você é melhor sobre bem reversível: funcional ou patrimonial?

Quadros: Prefiro a tese funcional, que é aquela em que o bem que está sendo útil à operação e exploração dos serviços. Não tem mais função, perdeu o objeto. Mas hoje, se os bens estão na relação de “bens reversíveis, integram a tese dos interesses patrimoniais, então, então o bem é vinculado sim e tem que considerar como não podendo alienar.

Tele.Síntese: Mesmo que não esteja na concessão?

Quadros: Mesmo que não esteja, pois o problema quando não está na concessão já é uma terceira tese, que é a despatrimonialização das empresas em dificuldade.

Tele.Síntese: E você votou a favor dessa tese.

Quadros: Justamente. Uma empresa que esteja em recuperação judicial ou em processo de abertura de caducidade,ela não pode alienar nada, porque primeiro precisa sair desse processo. Agora, se é uma empresa sadia, que está economicamente viável, explorando serviços com resultado, para essa empresa, pode muito bem ser permitido alienar aquilo que não seja funcional.

 

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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