Os 20 anos de inovação aberta que revolucionaram o nosso mercado

É fascinante ver como uma ideia levou à criação de um setor de inovação que impacta a vida de cada um de nós
Guilherme Amorim, Head de Innovation Services da Wayra Brasil e do Vivo Ventures.

Há pouco mais de 20 anos, Henry W. Chesbrough apresentou o conceito de “inovação aberta”, descrevendo-o como uma mudança fundamental na maneira como as empresas geram ideias e as levam ao mercado. Se antes as empresas seguiam um modelo de inovação fechada, no qual controlavam totalmente o processo de pesquisa e desenvolvimento (P&D), a inovação aberta convida as companhias a usarem tanto ideias internas quanto externas para criar novos produtos e serviços.

Alguns fatores contextuais impulsionaram esse novo paradigma, como o aumento de trabalhadores qualificados e a maior disponibilidade de capital de risco. Além disso, muitas ideias externas estavam sendo desperdiçadas porque as corporações não as integravam em seus processos.

A essência da inovação aberta parte da premissa de que “nem todas as pessoas inteligentes trabalham para nós”. Ou seja, é importante que as empresas aprendam a gerar valor com a pesquisa e desenvolvimento externos à companhia. Afinal, não é necessário originar inovações para lucrar com elas.

Desde então, a inovação aberta transformou a inovação corporativa. Muitas empresas começaram a colaborar interna e externamente, buscando sinergias com seus objetivos corporativos e convertendo esses esforços em novos produtos e serviços. Esse movimento criou uma verdadeira indústria de inovação, composta por fundos de investimento, startups e aceleradoras — um ecossistema que nasceu diretamente da visão de Chesbrough.

Vale destacar que, antes da inovação aberta, a inovação era frequentemente associada a processos produtivos, como teorizou Joseph Schumpeter nos anos 1930. O foco estava em melhorar a produção interna e otimizar serviços através de pesquisa fechada.

Com a inovação aberta, surgiram novos modelos, como o Venture Builder, que foca no desenvolvimento de inovações externas, muitas vezes vindas de startups. Essa abordagem, que privilegia o desenvolvimento de negócios (bizdev), se concentra em áreas complementares ao negócio principal da corporação, mas que ainda assim se beneficiam de sua infraestrutura.

Na Vivo, entendemos claramente as oportunidades e os limites da inovação aberta, já que há 13 anos atuamos no setor, por meio da Wayra. Nossa governança corporativa nos permite investir em empresas que não competem diretamente com nosso core business, o que nos dá espaço e oportunidade de investir em inovação aberta em áreas como agro, energia, saúde, educação e serviços financeiros. Com a Wayra e o Vivo Ventures, mecanismos de investimento CVC da Vivo no Brasil, construímos um amplo portfólio de startups investidas, muitas das quais fazem negócios com a Vivo, em uma parceria que gera mais de R$ 100 milhões em negócios para a empresa. Isso nos posiciona como uma das companhias mais maduras no mercado brasileiro para investir e escalar inovações.

Inovação aberta mais madura e robusta

Se há 20 anos o Brasil ainda não tinha a “massa crítica” necessária para implementar a inovação aberta como Henry Chesbrough previa, hoje o cenário é completamente diferente.

Naquela época, o perfil dos empreendedores brasileiros era, em sua maioria, de jovens programadores apaixonados por suas ideias. O conceito de “startup” ainda era desconhecido, e as soluções oferecidas geralmente supriam lacunas operacionais das empresas. Havia poucos investidores (VCs) e poucas aceleradoras, como a Wayra, cujo foco era acelerar e profissionalizar os fundadores e suas inovações, na maior parte dos casos visando o mercado internacional.

Agora, em um mercado mais maduro, a realidade é outra. Temos empreendedores mais maduros e experientes, vindos de diversas áreas de atuação, com estratégias claras e ambição financeira, o que leva a melhores resultados. O termo “startup” se tornou comum, e essas empresas são cada vez mais reconhecidas pelas grandes corporações como uma oportunidade para encontrar soluções capazes de melhorar a eficiência operacional e até criar novas linhas de negócios.

Tanto é que o mercado de VCs e CVCs no Brasil se expandiu, e hoje tem um claro foco em investir, escalar e tracionar inovações. Junto com isso, surge também uma nova visão estratégica dos empreendedores, que por serem mais experientes, entenderam os benefícios de consolidar suas soluções no mercado interno antes de buscar a expansão internacional.

Como reflexo dessas mudanças contextuais, não é exagero dizer que o ecossistema como um todo também evoluiu, contando com maior suporte, incluindo incentivos governamentais, como o Marco Legal das Startups e investimentos de instituições como o BNDES e a FINEP, além de programas de crédito voltados aos empreendedores, que reforçam esse ambiente favorável.

Essa combinação de fatores faz do Brasil um terreno fértil para inovação aberta.

Novos mercados

Com a evolução da inovação aberta e das transformações tecnológicas, vemos o surgimento veloz de novos mercados que, até pouco tempo, existiam apenas na imaginação dos empreendedores. Um exemplo é o avanço das fintechs, impulsionado por tecnologias que permitiram a criação de plataformas de pagamento e novos modelos de operação, algo inimaginável até o final dos anos 2000.

Hoje, diversas empresas podem atuar como intermediadoras de pagamentos, oferecer crédito e disponibilizar carteiras digitais. A variedade de produtos financeiros disponíveis é algo que só os empreendedores mais visionários poderiam prever há 15 anos.

Daqui por diante, a expectativa geral do mercado aponta para disrupções semelhantes em áreas como IA generativa, computação quântica e infraestrutura, tanto tecnológica quanto energética. Para quem investe em inovação aberta, o foco está em soluções verticalizadas. Ouso dizer que as soluções com maior chance de sucesso serão aquelas que forem adaptáveis e personalizáveis às realidades dos clientes.

Ao mesmo tempo, os CVCs enfrentarão o desafio de entender melhor a rentabilidade de suas investidas. Mais do que valorizar o momento de um exit, há interesse em medir o impacto das inovações na eficiência operacional e na criação de novas linhas de negócio para as corporações. Ou seja, o foco deve ir para além do KPI da inovação, adicionando também o entendimento de índices de impacto nas operações, processo que avançará conforme as métricas de avaliação amadurecem.

Está muito bom e ainda vai melhorar

Apesar de apreensões pontuais, o cenário atual é positivo e cheio de potencial, especialmente no Brasil. Isso porque, dada a dimensão continental do nosso país, há uma crescente compreensão de que a escala local também oferece oportunidades valiosas em nichos de mercado e regiões específicas. Mesmo produtos ou serviços com escala limitada (por região ou segmento de atuação) podem ter grande valor de mercado, garantindo uma base de clientes relevante e permitindo que as startups alcancem maturidade. Esse pensamento vem junto do entendimento de que nem toda startup precisa ser um unicórnio. Muitas vão se destacar como “camelos”, resilientes e sustentáveis.

Acredito que veremos mais startups com apelo regional, com abordagem verticalizada e profunda. Os empreendedores serão ainda mais estratégicos e direcionados. Setores como o agronegócio e o de energia devem ganhar destaque, especialmente com soluções para geração, transmissão e monitoramento de energia, impulsionadas pela abertura do mercado livre de energia no país. Fintechs continuarão relevantes no ecossistema, com inúmeros potenciais de negócios, e a Inteligência Artificial também continuará a transformar mercados, especialmente a generativa, até que se torne onipresente, integrando-se a praticamente todas as inovações. Com esse avanço, veremos também cada vez mais plataformas no-code e low-code – abordagens de desenvolvimento de software que permitem a criação de aplicações com pouca ou nenhuma necessidade de escrever código –, tornando-se ainda mais poderosas e flexíveis, capazes de permitir a criação de soluções cada vez mais robustas e sofisticadas, que integrem fluxos de trabalho, facilitando assim a inovação.

Talvez nem Henry Chesbrough pudesse imaginar tudo isso quando começou a conceituar a inovação aberta. O que posso afirmar é que vivemos um momento promissor para a inovação, e as perspectivas são de um crescimento ainda maior nos próximos anos. Felizmente, com a nossa experiência e entendimento do ecossistema, estamos mais do que preparados para aproveitar esse momento.

 


Guilherme Amorim | Head de Innovation Services da Wayra Brasil e do Vivo Ventures.

 

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Da Redação

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