Nvidia estará por trás da maioria dos softwares do 6G, diz Marcio Aguiar

Diretor da Nvidia para América Latina afirma que GPUs da empresa serão as principais aceleradoras das plataformas da próxima geração móvel; executivo também enaltece Plano Brasileiro de Inteligência Artificial.
Nvidia será a principal responsável pelas infraestrutura computacional do 6G
Marcio Aguiar, diretor da divisão Enterprise da Nvidia para América Latina; plataformas e softwares de 6G terão apoio da empresa (crédito: Nvidia)

Principal responsável pelo fornecimento de chips que abastecem infraestruturas de Inteligência Artificial (IA), a Nvidia ganhou capilaridade no setor de telecomunicações com a ativação do 5G e projeta papel de destaque na era do 6G, geração móvel que deve habilitar tecnologias que demandarão ainda mais poder computacional.

“Na chegada do 6G, a maioria dos softwares compatíveis com a tecnologia estará acelerada pelas nossas plataformas de GPU [unidade de processamento gráfico]”, afirma Marcio Aguiar, diretor da divisão Enterprise da Nvidia para América Latina, em entrevista ao Tele.Síntese. “Até o momento, não existe nenhum outro tipo de tecnologia acelerada usadas por nós hoje que não seja por GPU”, acrescenta.

O executivo diz que a empresa tem como filosofia de negócio se posicionar como pioneira no advento de novas tecnologias, e não como líder de mercado. Ainda assim, assegura que, apesar de concorrentes ampliarem os investimentos em IA, a companhia com sede em Santa Clara, na Califórnia (Estados Unidos), dificilmente perderá a liderança nesse setor.

“Vai demorar um pouco para outras empresas criarem esse ecossistema tão vasto e sólido como criamos”, assinala.

Aguiar conta que o Brasil (2%) e a América Latina (4%) ainda respondem por uma parcela pequena da receita da empresa, que se tornou uma das mais valiosas do mundo na era da IA. No entanto, diz que a companhia recebeu muito bem o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA).

“Estamos trabalhando agora em proximidade ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), às universidades e aos laboratórios nacionais que vão se beneficiar desse investimento”, aponta o executivo.

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Tele.Síntese: Como são as operações da Nvidia no Brasil atualmente?

Marcio Aguiar, diretor da divisão Enterprise da Nvidia para América Latina: O nosso time, até seguindo o exemplo da corporação, é bem enxuto e versátil. O trabalho da Nvidia é promover o engajamento do nosso ecossistema. Então, atuamos muito próximos de OEMs, que são os fabricantes de servidores – como Dell, Lenovo, HP, Supermicro – e também com os Cloud Service Providers (CSPs), como Amazon, Oracle, Google, Microsoft, além de consultorias. O time próprio da empresa é composto por 16 pessoas no Brasil, divididas em áreas comercial, marketing e técnica.

Tele.Síntese: O papel da empresa no Brasil é de interligar a matriz com a demanda local ou as operações também são realizadas aqui?

Aguiar: As operações acontecem aqui, porque existem as empresas brasileiras. Temos uma atuação muito forte no setor de óleo e gás. Com as grandes empresas do setor, inclusive a Petrobras, temos contato direto e geramos muito interesse por inovação tecnológica. Obviamente, uma vez que elas entendam o valor das nossas soluções de software e hardware, vão ao mercado comprar as soluções dos nossos parceiros. Não fazemos a venda direta, não atuamos como B2C. É simplesmente B2B, um capacitador de tecnologia.

Tele.Síntese: Como tem sido a demanda no Brasil? Quais são as soluções e produtos mais procurados?

Aguiar: Nós não temos um produto, temos plataformas de desenvolvimento que contêm software e hardware. Tudo depende da demanda computacional do cliente. Entramos com as nossas tecnologias para o que ele quiser resolver e usar. Muita gente ainda nos enxerga como uma empresa de hardware e nos pergunta qual é o produto mais vendido. Mas, na verdade, é variado, porque depende muito do workload. Não existe uma GPU melhor do que a outra. O que existe é uma GPU que foi desenhada para atender a uma demanda computacional específica.

Tele.Síntese: Qual é a representatividade do Brasil nos negócios na América Latina?

Aguiar: O Brasil é o primeiro país [na região] que tem mais demandado o uso das nossas tecnologias. O time todo está concentrado no Brasil e temos agora duas pessoas no México, mas o Brasil está muito mais maduro. Temos mercados de óleo e gás, telecomunicações, energia, varejo, manufatura. Obviamente, temos a nível global a indústria de saúde, mas muitos dos laboratórios que estão no País são internacionais. Dentro do nosso faturamento global, a América Latina representa em torno de 4%. O Brasil, 2% do total mundial.

Tele.Síntese: Há perspectiva de crescimento da participação da América Latina na receita da empresa?

Aguiar: Temos bastantes projetos acontecendo, até porque vários dos governos da região anunciaram recentemente planos de investimento em IA. O Brasil foi um deles. Há mais ou menos um mês, o governo anunciou R$ 23 bilhões que serão investidos em oito data centers. Isso repercutiu muito bem em outros países. Há duas semanas, estive no Chile e assinamos um acordo de inovação tecnológica. O México, pela proximidade com os Estados Unidos, também tem demanda em desenvolvimento. Mas, obviamente, o Brasil vai estar sempre na frente.

Estamos trabalhando agora em proximidade ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), às universidades e aos laboratórios nacionais que vão se beneficiar desse investimento já anunciado e realmente trazer uma infraestrutura mais adequada para que o Brasil possa continuar seguindo como protagonista da região.

Tele.Síntese: E o Plano Brasil de Semicondutores? Vocês chegaram a avaliar o programa?

Aguiar: Confesso que sei muito pouco sobre o plano de semicondutores. Acho que é um desafio – não só para o Brasil, mas para qualquer outra nação. Não é simples desenvolver um chip. A Nvidia desenvolve desde 1993 e tem o privilégio de ter o que é considerado um dos melhores chips do mundo, principalmente agora para IA. Não temos nenhuma interação com o plano de semicondutores. Torcemos para que dê certo.

Tele.Síntese: Como a empresa avalia o destaque que ganhou na área de IA?

Aguiar: Os mercados entenderam que nós, há 16 anos, estamos desenvolvendo softwares que podem ser aplicados aos seus negócios. Isso é o que nos dá essa posição de destaque, mas o nosso foco é ser visto como pioneiro na indústria de tecnologia, nunca líder. Liderança varia conforme a comparação feita, mas o pioneirismo não se esquece.

Tele.Síntese: Nos últimos dois anos, houve um boom em IA generativa e as big techs passaram a investir muito nessa tecnologia. As coisas mudaram muito para vocês desde que a Nvidia passou a ser uma das empresas mais comentadas do mundo?

Aguiar: Isso é extremamente positivo, porque a Nvidia tem sido a principal provedora de GPUs para essas companhias. Internamente, não mudou nada na nossa maneira de trabalhar. Hoje, temos um problema bom, uma demanda muito alta, muito maior do que o nosso poder de entregar essa quantidade para esse ecossistema de parceiros. Então, a gente vem lançando novas arquiteturas de GPU para atender uma demanda computacional que os CSPs precisam.

No Q4 [quarto trimestre do ano fiscal], que começa em novembro, vamos lançar a nossa geração Blackwell, que vai atender à demanda dos provedores de nuvem, enquanto a Hopper, a geração atual, ficará para atender à demanda computacional das empresas, para que possamos, simultaneamente, atender a todo o mercado.

Tele.Síntese: Como se prepararam para tudo isso?

Aguiar: Sabíamos que essa demanda computacional iria vir. Por isso, em 2016, lançamos o primeiro supercomputador, que era uma arquitetura de um servidor com oito GPUs. À época, nenhum OEM queria fabricar aquilo, diziam que era muito visionário. Então, conversamos com os fabricantes chineses e produzimos com eles. Hoje, todo mundo fabrica esse servidor com oito GPUs, mas fizemos isso lá atrás, em 2016. E quem foi o primeiro cliente? A primeira parceira foi a OpenAI [criadora do ChatGPT]. Ela focou em desenvolver um modelo de linguagem com muito mais poder computacional. Apostamos nisso e agora todo mundo quer ser amigo da Nvidia.

Tele.Síntese: Como é a relação da Nvidia com o setor de telecomunicações?

Aguiar: Temos uma aproximação muito forte com todas as operadoras no Brasil e, obviamente, em todo o mundo. Imagina a infraestrutura das operadoras até 2012, quando não havia IA, era voltada para voz. Agora, imagina o tráfego de dados, fotos, vídeos e voz hoje. As operadoras tiveram que se modernizar, assim como o ecossistema que atende às teles. Ou seja, várias empresas de software que já estavam presentes começaram a trazer novos conceitos de compressão e descompressão de dados, melhoria no tráfego de imagens. Mudou tudo.

Temos tido esse privilégio de estar contribuindo para essa evolução. A Nvidia entrou muito forte, há mais ou menos quatro anos, quando o 5G foi apresentado para toda a sociedade e, na chegada do 6G, a maioria dos softwares compatíveis com a tecnologia estará acelerada pelas nossas plataformas de GPU. Até o momento, não existe nenhum outro tipo de tecnologia acelerada que usamos hoje que não seja por GPU.

Tele.Síntese: Neste caso, as soluções da Nvidia são mais voltadas às redes móveis?

Aguiar: Não. Em geral, [atendemos] toda a operação da telco. Para redes móveis, há a questão da computação de borda. É todo um conjunto. As operadoras, hoje, têm desafios de cobertura adequada em áreas remotas ou ribeirinhas. Não existe uma cobertura tão adequada porque custa muito também, mas a tendência é que isso diminua através dessas técnicas de distribuição de processamento para que não seja tão dependente de uma central que só esteja nas capitais do País.

Tele.Síntese: No Brasil, a Nvidia atende as três operadoras nacionais: Claro, TIM e Vivo?

Aguiar: Temos interações fortes com elas e com o ecossistema que as atende.

Tele.Síntese: A Nvidia lidera, com folga, o mercado de chips de IA, mas a competição está correndo atrás. Como estão se preparando para lidar com o aquecimento da concorrência?

Aguiar: É mais do que normal. Hoje, estamos com 90% do mercado de data center. Observando o ecossistema, pouquíssimas empresas possuem o ecossistema que temos, porque não é só o hardware. Então, vai demorar um pouco para outras empresas criarem esse ecossistema tão vasto e sólido como criamos. É possível? Sim. Mas somos pioneiros, não brigamos por market share, pelo contrário. Empresas como Google, Microsoft, Amazon também estão desenhando seus próprios chips para atender às suas demandas computacionais, mas também estão comprando milhares das nossas GPUs porque elas atendem múltiplos propósitos de seus negócios.

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Eduardo Vasconcelos

Jornalista e Economista

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